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Histórias esquecidas sobre os assuntos mais quentes do dia a dia. Por Felipe van Deursen, autor do livro "3 Mil Anos de Guerra"
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Um guia histórico para você entender “Dunkirk”, o filme

Vai assistir ao filme mais comentado dos últimos tempos neste fim de semana? Então leia aqui para aproveitar melhor cada cena.

Por Felipe van Deursen Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 4 ago 2017, 13h06 - Publicado em 27 jul 2017, 18h35
Soldados na praia de Dunquerque atiram contra aviões inimigos. (Divulgação/Reprodução)

O que é Dunkirk? Aliás, Dunkirk ou Dunquerque?
Dunquerque (Dunkerque, em francês) é uma cidade portuária na França, na fronteira com a Bélgica. Ela foi palco da célebre Batalha de Dunquerque, em maio de 1940, no começo da Segunda Guerra. Dunkirk é o nome em inglês da cidade e do filme homônimo, que chegou ao Brasil nesta quinta (27/7) com o nome original. Dirigido por Christopher Nolan (trilogia Batman, Interestelar, A Origem, Amnésia, Insônia – o famoso CV de tirar onda), o filme recebeu uma avalanche de resenhas positivas da crítica. Mas, como quase sempre em longas históricos (ainda mais quando o assunto é guerra), ele também tem gerado polêmica (mais sobre isso adiante).

Evacuação das tropas Aliadas. (Reprodução/Reprodução)

 

Como estava a Segunda Guerra Mundial na época?
Não tinha lá tanto assim de “Mundial”. O Japão estava em guerra com a China. A União Soviética de Stálin estava ocupada invadindo Romênia, Finlândia, os países bálticos e a Polônia. Os Estados Unidos assistiam de longe. Mas a encrenca já estava desenhada. Nos anos anteriores, o ditador alemão, Adolf Hitler, empreendeu uma política expansionista ao mesmo tempo em que investia pesado nas Forças Armadas. Estabeleceu uma parceria com a Itália de Mussolini em 1936 e anexou a Áustria e a Tchecoslováquia em 1938. As potências europeias não queriam se meter, ainda traumatizadas pelo colossal banho de sangue da Primeira Guerra, apenas 20 anos antes. Mas, quando Hitler invadiu a Polônia em 1939, ingleses e franceses interpretaram que, se não fizessem nada, a Europa inteira poderia cair. Em setembro, declararam guerra. Mas não houve confronto direto até maio de 1940. Foi a chamada Guerra de Mentira. Mas “de mentira” do ponto de vista das potências, como sempre. Porque já tinha guerra,sim, e os nazistas invadiram mais dois países, Dinamarca e Noruega.

Até que, em maio de 1940, a blitzkrieg mudou a direção do alvo: Torre Eiffel.

 

Blitzkrieg?
É o nome do estilo de guerra que fez a fama dos nazistas. O termo, em alemão, significa “guerra relâmpago”. E como foi. Os nazistas agora avançaram rumo a oeste, em direção à França. Em cinco dias, conquistaram a Holanda. Os belgas, apesar de não terem muita chance, lutaram até o fim por 18 dias, quando também capitularam. Franceses e ingleses estavam cada vez mais acuados, nos arredores de Dunquerque. Não havia muita esperança. Mas, em um mistério ainda aberto para os historiadores, Hitler aprovou uma ordem de parada. Podia ser um desejo de preservar as tropas para a invasão de Paris, chegar a um acordo com os ingleses ou apenas mais uma presepada estratégica. Por alguns dias, as divisões Panzer não avançaram, após uma sequência de vitórias fulminantes. Hitler era imparável. Mas resolveu parar.

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Se as motivações políticas e das lideranças militares são nebulosas, as da linha de frente, de quem estava à vista da areia, da lama e do sangue, nem tanto. No dia 21 de maio, nos arredores da cidade francesa de Arras, tanques e infantaria da Força Expedicionária Britânica realizaram um contra-ataque surpresa que atordoou os nazis e confundiu ninguém menos do que aquele que se tornaria uma das lendas da Segunda Guerra, o general Erwin Rommel. Ele disse ao marechal-de-campo Gerd von Rundstedt que sua 7ª Divisão Panzer havia sido atacada por centenas de tanques inimigos. Na verdade eram 74, e a maioria velhos e frágeis perante às máquinas alemãs.

O combate abalou o psicológico deles, e o marechal ordenou uma parada para respirar, com o consentimento do Führer. No dia seguinte, outro general alertou que os tanques estavam se deslocando rápido demais, deixando a infantaria para trás e desprotegida. Mais uma vez, o marechal mandou parar. Eles só retomariam o avanço em 26 de maio, para retomar o ritmo e tomar a França de vez. Em 14 de junho, Paris caiu, apenas 18 dias após Dunquerque.

Mas aquelas 36 horas de tropas paradas foram a salvação dos Aliados. Vai ver é por isso que blitzkrieg é punk rock, e não Mocidade ou Anitta para ter “paradinha”.

Rommel (centro) no front ocidental, em 1940, cercado de oficiais e tanques Panzer (Reprodução/Reprodução)

 

Mas o filme tem um monte de aviões. Cadê eles?
Logo no dia 26, os alemães perceberam a movimentação de navios de guerra e de transporte ingleses para evacuarem as tropas. Hitler se reuniu com os comandantes-chefe do exército e aprovou uma ofensiva. Três horas e meia depois, às 19h, o almirantado em Londres ordenou o início da Operação Dínamo, que deveria evacuar o máximo de homens possível de Dunquerque. A ideia era que em dois dias, no máximo, daria para salvar 45 mil pessoas. Aí entra em cena o combate aéreo. Aviões nazistas tentam impedir o trabalho na costa, enquanto pilotos britânicos, canadenses e poloneses lutaram para manter o céu desimpedido, explica o historiador Martin Gilbert no livro A Segunda Guerra Mundial. Entre 25 de maio e 5 de junho, 394 aviões alemães caíram, contra 114. Foi a primeira vitória relevante da Força Aérea Aliada.

Houve também combates de retaguarda no solo, para proteger o perímetro da zona de evacuação. As tropas que combatiam na vizinha Calais receberam um telegrama informando que não seriam evacuadas dali, e que cada hora a mais de resistência ajudaria o plano de Dunquerque. Os alemães capturaram 40 mil soldados franceses e 40 mil ingleses. Alguns foram executados, e a outros sobraram apenas maus tratos, água contaminada e comida podre. “O sacrifício deles foi a salvação da nação britânica. Mas esses soldados foram esquecidos”, escreve Sean Longden em Dunkirk: The Men They Left Behind (sem edição no Brasil). “Enquanto aqueles que escaparam e conseguiram chegar em casa foram recebidos como heróis.”

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Os nazistas cometeram atrocidades como enfileirar e metralhar soldados que se renderam e explodir prisioneiros de guerra com granadas. Muitas delas contra os franceses, que perderam 24 divisões de infantaria entre a invasão e a evacuação.

 

Como foi a evacuação?
Como a praia era rasa, grandes navios não tinham como se aproximar. Então, às 222 embarcações de guerra envolvidas na operação juntaram-se 665 barcos civis. Centenas de navios mercantes, corvetas, navios de transporte e, mais incrível ainda, rebocadores, navios costeiros, embarcações fluviais, salva-vidas, barcos de pesca e outras embarcações pequenas entraram no esquema. Houve confrontos desiguais, como um vapor de rodas que transportava 600 soldados e só tinha uma peça de artilharia antiaérea que foi atacado por 12 bombardeiros de mergulho.

Mas, no fim, o “milagre de Dunquerque” aconteceu: 338.226 homens foram salvos, mais de sete vezes mais o que se almejava. Desses, 80 mil em barcos civis pequenos, transportados em grupos de seis a 200 pessoas.

Avião inglês de reconhecimento sobrevoa Dunquerque durante a evacuação (Royal Air Force official photographer/Divulgação)

 

Quem se salvou?
Além dos mais de 300 mil que conseguiram ser retirados, quem se salvou foi a própria Inglaterra. As Forças Armadas do país sentiram a surra que levaram no continente e começaram a se modernizar. E, especialmente, quem se safou foi o primeiro-ministro, Winston Churchill, que tomou posse apenas 12 dias antes da parada alemã. Não fosse Dunquerque, ele poderia muito bem ser deposto após o fiasco na França e substituído por alguém disposto a entrar em acordo com Hitler, sugerem alguns historiadores.

”Guerras não são vencidas com evacuações”, ele disse. Mas, malandramente, transformou aquela derrota em vitória na base do gogó. Exaltou a atitude dos civis e a bravura das tropas, lançando a base do chamado “espírito de Dunquerque”. Em seguida, substituiu os equipamentos perdidos e se aproximou do presidente americano, Franklin D. Roosevelt. Em julho, quando os nazistas iniciaram os bombardeios na Inglaterra, Churchill ajudou o país a se preparar psicologicamente para resistir aos três meses de cerco.

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O filme é fiel à história?
Sim, mas até certo ponto. Todos os personagens são fictícios – o que é uma escolha dos roteiristas, beleza. Mas navios e aviões de verdade, da época, foram usados, o que já chama atenção em tempos de tanta computação gráfica nos filmes. Há alguns erros técnicos, que podem irritar os nerds de guerra mais radicais, e o próprio Nolan, em coletivas de imprensa, já alertou. Por exemplo, os Messerschmitt Bf 109 alemães que enfrentam os Spitfire ingleses têm narizes amarelos, mas essa pintura só surgiria depois de Dunquerque. O diretor explicou que isso serve para o público distinguir mais facilmente quem é quem nas batalhas frenéticas no ar. Além disso, o destróier britânico usado no filme é, na verdade, francês, maior e mais longo. Nolan preferiu filmar com um navio de verdade em água de verdade em vez de criar um modelo “perfeito” em computador. Aí vai da sua preferência. Se prefere ver algo mais fiel e não liga de ser digital, talvez seja melhor ficar em casa e jogar videogame (como será a volta de Call of Duty à Segunda Guerra, aliás?).

Mas o que pesa mais é o mesmo que Churchill e os ingleses fizeram em 1940: menosprezar a luta dos outros países. O filme dividiu opiniões na França por não dar, supostamente, crédito suficiente ao exército do país , que lutou lado a lado e se sacrificou para salvar aqueles que foram evacuados – dos 330 mil, cerca de 120 mil eram franceses, e esses são, segundo os críticos, pouco representados no filme. Além disso, muitos barcos civis da Bélgica e da Holanda, países já rendidos aos nazistas, se arriscaram e salvaram milhares de soldados na travessia. Fora os pilotos de outras nacionalidades, já mencionados. O “espírito Dunquerque” virou o “espírito Brexit”, espinafraram.

No Reino Unido, historiadores e jornalistas de guerra relativizaram. Disseram que é um ponto de vista histórico e que, “se Steven Spielberg pode fazer filmes de guerra ridiculamente americanos”, Christopher Nolan, tão inglês que nasceu na cidade de Westminster, pode fazer os seus “ridiculamente britânicos. Se os franceses quiserem, que façam seus próprios filmes”. 

Enquanto isso, os russos fizeram pouco caso. Um crítico da revista de cultura Mirf escreveu: “Apesar das belas palavras sobre ‘eventos que mudaram o mundo’, Dunquerque não é uma página gloriosa da história”. E o perfil oficial da embaixada russa em Londres entrou em uma discussão no Twitter após fazer pouco da batalha: “Dunquerque foi causada pelo apaziguamento. A Guerra de Mentira estava em seu último estágio”.

Só por essas reações – e esta aqui abaixo – já vale a pena ver.

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Soldados comemoram a sobrevivência. Cena do filme “Divide and Conquer (Why We Fight #3)”, de Frank Capra (Frank Capra/Reprodução)
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