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A curiosa vida de um caçador de crocodilos

A SUPER conheceu Troy Landry, dos Estados Unidos, e conta como é a perigosa rotina de procurar esse réptil no pântano

Por Thaís Zimmer Martins Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 7 mar 2024, 15h54 - Publicado em 20 Maio 2015, 20h45

As botas de couro de crocodilo podem dar uma pista da profissão de Troy Landry, mas são os braços fortes, o sotaque caipira e duas cicatrizes no corpo que realmente entregam o trabalho curioso que esse cara escolheu. Se você já assistiu à série Mergulhados no Pântano, do canal A&E, sem dúvida sabe de quem estamos falando. Troy aparece no meio do nada, em um barco de metal cheio de crocodilos. Isso mesmo. Crocodilos. E é claro que ele não é brasileiro. Aqui a caça é proibida, mas em Louisiana, Estados Unidos, essa prática é permitida.

Aliás, a coisa lá é muito mais séria do que pode parecer. Na década de 1960, esse bicho foi colocado na lista de espécies ameaçadas de extinção e ninguém podia matá-lo. Mas hoje isso se inverteu: existe crocodilo demais e é necessário controlar a população. É tanto crocodilo que os moradores de vários lugares dos Estados Unidos podem correr risco de vida, caso pessoas como Troy não saiam pelo pântano para caçar. Embora a legislação permita, não é todo dia que ele pode ir em busca do bicho. A temporada de caça, como é chamada por lá, está restrita ao mês de setembro. Ou seja, somente 30 dias por ano.

Conheça cinco curiosidades sobre ele:

 

 

Troy não se lembra exatamente quando foi que viu um crocodilo pela primeira vez. Acha que foi lá pelos 5 anos, quando saiu em um barco com o pai e com o avô, que exerciam a mesma profissão. Aos 12 anos, ele ganhou o próprio barco e começou a ir sozinho. Ele não revela a idade de jeito nenhum, mas os fios brancos com certeza confirmam que faz um bom tempo que ele é caçador de crocodilos. As costas doloridas e o cansaço, que aumentou nos últimos anos, já o fazem pensar em aposentadoria. Mas Troy prefere não falar sobre isso por enquanto. Mesmo assim, ele já deixa (e leva pra caça) seus sucessores: três filhos e um netinho de apenas 3 anos. Pode parecer horrível pra gente imaginar uma criança em um barco com crocodilos, mas é natural (e motivo de orgulho) para ele.

COMO CAÇAR UM CROCODILO

Todo mês de setembro, Troy diminui drasticamente as horas de sono. Das 4h às 23h, fica acordado em função dos bichos. “Eu chamo isso de 30 dias vivendo no inferno. Parece uma coisa divertida, mas é trabalho duro”, define ele sobre o período. Às vezes Troy enfrenta esse inferno sozinho, mas, na maioria das vezes, leva um ajudante ou os filhos Jacob e Chase. Ah, esses dois também são personagens da série de TV. O terceiro filho costuma ajudar na limpeza da carne e remoção do couro.

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Se essa profissão parece coisa de outro mundo por aqui, nosa EUA, é comum. O governo dá essa licença de caça para 2 mil pessoas do estado de Louisiana. Por ano, em média, 30 mil crocodilos são caçados. Também existem regras para isso. Uma delas é não sair à noite, porque é nesse horário que os animais saem das águas, o que facilitaria demais a vida dos caçadores. Vale lembrar que estamos falando de caça. Então, a ideia é que não seja mesmo uma tarefa fácil. Outra regra estabelecida tem a ver com a quantidade de crocodilos que cada pessoa pode pegar. Existe um limite por pessoa, claro. Afinal, a ideia é controlar a população da espécie — e não exterminá-la.

No ano passado, Troy chegou ao número máximo de crocodilos que poderia pegar: foram 560. Quanto mais se aproximar da meta, maior a chance de aumentar a quantidade no ano seguinte. Mas é importante seguir as normas. Se ele ou qualquer outro caçador for pego descumprindo, pode perder a licença. E essa é a principal (às vezes única) fonte de renda para muitas famílias de Louisiana. Para Troy, significa aproximadamente 40% do lucro que ele tem anualmente, algo como 30 mil dólares. Isso porque, fora da temporada dos crocodilos, a família pesca lagostim.

O sotaque caipira e os olhos azuis negam que ele já sentiu medo do animal. Troy define o trabalho como “algo natural”. Não pra gente. Consegue imaginar um bicho de quase 4 metros de comprimento abrindo a boca em sua direção? O maior crocodilo que Troy já pegou tinha exatamente esse comprimento. O jeito de caçar varia de pessoa pra pessoa. Ele, por exemplo, prefere levar umas iscas feitas com animais mortos. A ideia é cansar o bicho e só depois atirar. “Faço coisas diferentes dos outros, por isso pego crocodilos maiores do que os deles. Tenho alguns segredos”, explica. E Troy revelou um deles. Ele diz que pouca gente sabe, mas os grandes crocodilos precisam de águas profundas, então nem adianta ir em um lago com águas rasas.

O QUE ACONTECE DEPOIS DA CAÇA

Quando o barco fica cheio, os caçadores vão até um lugar onde Troy mantém um refrigerador bem grande, com uma máquina de gelo. É onde os crocodilos ficam até serem levados a uma usina de processamento, onde a pele é tirada e a carne é comercializada pra restaurantes. Troy vende a carne a 10 dólares por pound, o que representa quase meio quilo. Se você nunca comeu carne de crocodilo, pode ficar surpreso: o rabo tem gosto de peixe enquanto o resto lembra carne de frango. Toda a carne é branca, com exceção da que fica nas patas, que é vermelha. Nos EUA, comer carne de crocodilo é tão comum quanto comer frango aqui.

Já o preço do couro varia muito. No último ano, 30 centímetros custavam em média 35 dólares. As empresas preferem as peles dos crocodilos mais novos. E não existe desperdício. Tudo precisa ser aproveitado, inclusive as cabeças, que vão para lojas de souvenirs . Com os dentes, por exemplo, são feitos colares.

Uma coisa curiosa é que se o caçador encontrar um ninho, é obrigado a entregar 50% pro estado, que deixa os crocodilinhos crescerem mais ou menos um metro e então devolvem para a natureza. Esse processo existe pois, sem a mãe, os ovos ficam à mercê dos predadores e suas chances de sobrevivência diminuem para entre 4% e 5%. Uma outra coisa curiosa é que existem, sim, crocodilos albinos. Eles são raros e normalmente vão para um zoológico porque não conseguem se esconder na natureza por isso acabam morrendo mais facilmente.

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Ah, e Troy é uma espécie de protetor também. Cerca de 3 pessoas são mordidas todo ano por crocodilos em Louisiana. Quando algo semelhante acontece, ou quando a polícia se depara com um dos bichos, pode chamar Troy. Ele toma conta de três condados por lá. Apesar de caçar e proteger os lugares há tanto tempo, apenas duas cicatrizes marcam o seu corpo uma no braço e outra no pé. Esta última poderia ter sido bem maior, caso o barco em que ele estava na ocasião não fosse de metal e parasse a mordida. Ele se considera um cara de sorte porque vários amigos sofreram acidentes bem feios. Alguns até perderam a vida nessa aventura.

ENQUANTO ISSO, NO BRASIL

É proibido caçar qualquer animal silvestre por aqui há 50 anos. Mas o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama) dá autorização para alguns lugares criarem jacarés  e não crocodilos, como em Louisiana. Aliás, aqui nem existe crocodilo. E se você acha que os dois são iguais, não é bem assim. Apesar da semelhança física, eles pertencem a famílias diferentes: o jacaré é da Alligatoridae e o crocodilo é da Crocodilidae. Estão nos dentes e no formato da cabeça as principais diferenças entre um e outro. Enquanto o jacaré tem focinho largo e arredondado, a cabeça do crocodilo é mais afilada. Diferenças à parte, os dois são bem agressivos.

Em Louisiana vive apenas uma raça de crocodilo. Já aqui são cinco espécies de jacaré, sendo que duas podem ser comercializadas, a de papo-amarelo e pantanal. O jacaré-açu, o jacaré-tinga e o jacaré-coroa-vermelha não podem ser vendidos (e nem abatidos). Dia desses, Troy veio pela primeira vez para o Brasil e aproveitou a visita para conhecer os jacarés brasileiros. Ele foi até o projeto Arurá, em Artur Nogueira SP, um dos cinco locais do país autorizado a criar os bichos.

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Veja como foi a visita:

 

No Arurá, vivem 22 casais de jacarés-do-papo-amarelo. Eles são separados em duplas pra não haver brigas, já que a espécie é muito agressiva, o que a faz ser a mais parecida com os crocodilos. Um dos jacarés, inclusive, já perdeu a pata em uma briga:

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O projeto começou em 1997 com 60 animais, e 50% da fazenda foi transformada em uma Reserva Particular de Patrimônio Natural, registrada no Ibama. O veterinário responsável pelo local, Glenn Collard, explica que todos os animais têm microchips para facilitar o monitoramento. Ele precisa saber quem é a mãe, o pai e os filhos pra não correr o risco de cruzar animais da mesma família. Caso aconteça alguma irregularidade em um dos cinco locais do Brasil autorizados, o Ibama pune o lugar e retira a licença de comercialização.

Apesar de existir a autorização do Ibama e a licença do Meio Ambiente, o Brasil ainda dá os primeiros passos na criação de jacarés para a venda. Por enquanto, não existe uma lei sobre o abate desses animais. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) está tentando legalizar essa questão, procurando um abatedouro que esteja dentro das exigências. Mas esse processo já dura alguns anos, o que impede Glenn de comercializar a carne e o couro dos jacarés.

Enquanto isso, os jacarezinhos continuam nascendo e crescendo. Estamos perto do período em que as duplas são formadas para reprodução. Isso acontece entre junho e julho, porque é nessa época que os animais estão mais calmos. Então entre outubro e março a fêmea coloca de 20 a 80 ovos, que são recolhidos e levados a uma incubadora. Se bobear, outros predadores roubam os bebês. Depois de 70 dias os filhotes vão pro berçário.

O peso de um animal adulto pode chegar a 100 quilos e o tamanho, de 2 a 3 metros de comprimento. Na natureza, ele vive cerca de 35 anos, enquanto que em cativeiro a vida pode se prolongar até os 50 anos. Porém, se o animal é criado para a comercialização, ele vive até os 2 anos, pois a idade ideal para o abate é entre 18 e 24 meses. E se um dia você quiser ver esses jacarés em Artur Nogueira e conhecer todo esse processo: pode. O Arurá recebe visitas (que são guiadas, claro). E dá pra chegar bem perto dos bichos. Bem perto mesmo. 

 
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