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Big Bang com plumas e paetês: um samba-enredo sobre a origem do cosmos

A Viradouro ganhou o carnaval de 1997 com uma boa explicação sobre a origem do cosmos. Mas havia uma pedra no meio do caminho: a matéria escura.

Por João Steiner
Atualizado em 10 set 2020, 18h12 - Publicado em 30 abr 1997, 22h00

O astrônomo João Evangelista Steiner, lenda da astronomia nacional, morreu nesta quinta (10) aos 70 anos vítima de um infarto. Um de seus últimos projetos foi coordenar a participação brasileira na construção do Giant Magellan Telescope, no Chile – que será o maior observatório do mundo quando for terminado, em 2024. O Brasil destinou US$ 40 milhões à empreitada, da qual nossos astrônomos poderão usufruir após a conclusão das obras. 

Ao longo de sua vida, Steiner conciliou a pesquisa e a divulgação científica com um esforço constante em evitar o sucateamento de nossa infraestrutura científica e garantir o envolvimento do Brasil em colaborações internacionais de vanguarda. Mesmo assim, conseguia uma brecha na agenda para escrever textos para nós! Para homenagear Steiner, resgatamos um de seus melhores textos da época em que ele foi colunista da SUPER, nos anos 1990: sua avaliação de um samba-enredo de Joãozinho Trinta sobre o Universo – que rendeu à escola Viradouro o título do carnaval de 1997. Volte no tempo:

“Para levar a escola de samba Viradouro à vitória, este ano, o carnavalesco Joãzinho Trinta deixou a imaginação voar alto. E bem longe. A julgar pelas cores e formas de suas alegorias, ele foi à origem do Universo buscar inspiração para a maior festa brasileira. E a sua representação está essencialmente de acordo com o que a ciência pensa sobre o assunto: no princípio eram as trevas, depois fez-se a luz, surgindo mais tarde os elementos. Na metáfora carnavalesca, eles seriam apenas quatro: terra, fogo, água e ar.

A ciência moderna vai além ao mostrar que os elementos químicos, de fato, são 92. Também é preciso acrescentar que os átomos desses elementos são feitos de elétrons, prótons e nêutrons, e que estes dois últimos, por sua vez, são feitos de quarks. Tudo o que podemos enxergar no Universo é construído com esses componentes básicos, desde as galáxias até as plumas e os paetês. Mas Joãozinho acertou na concepção, inclusive por que nos primeiros momentos do Universo a matéria e a luz estavam, por assim dizer, misturadas. E um dos acontecimentos decisivos no começo dos tempos foi a separação entre a luz e as trevas.

O que o mestre da Viradouro não disse é que tudo o que podemos enxergar representa apenas 10% da matéria total do Universo. Os outros 90% não sabemos o que são e chamamos de “matéria escura” – uma alegoria de nossa ignorância. Quem primeiro mostrou a existência da matéria escura foi o suíço Fritz Zwicky, que foi um destaque no desfile da ciência neste século.

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Ao estudar o aglomerado de 2 000 galáxias existente na Constelação de Coma Berenices, ele concluiu nos anos 1930 que a massa do conjunto é três vezes maior do que a soma de todas as galáxias do aglomerado. Ou seja, dois terços da massa é matéria escura, aquilo que não sabemos o que é. Com o passar das décadas, verificou-se que essa componente misteriosa predomina em todos os sistemas astronômicos bem estudados.

À primeira vista parece o samba do crioulo doido. Mas não é. As evidências são cada vez mais sólidas e a própria teoria do Big Bang confirma isso. A explosão do Universo só funciona como uma boa teoria se realmente aquilo que podemos ver representar apenas 10% de toda a matéria existente. Caso contrário, esse belo enredo que é a teoria do Big Bang fica comprometido.

Pode parecer frustrante que, nesse final de milênio, apesar de todo o poderio que a ciência conquistou, nossa ignorância sobre coisas tão básicas ainda seja tão grande – não sabemos identificar 90% da matéria do Cosmo! Mas esse é o lado pessimista de ver a questão. O lado otimista é que os estudos em curso vão dar pano para mangas ao longo de muitos carnavais.”

A seguir, a assinatura de Steiner conforme usada na época. Seu cargo, evidentemente, mudou com o passar dos anos.

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João Steiner é vice-diretor do Instituto Astronômico e Geofísico da USP e vice-presidente do Projeto Gemini.

Para completar, os curiosos podem assistir abaixo a um vídeo desse samba-enredo cósmico em ação.

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