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Enquanto pesquisadores desistem do Brasil, bispo prepara-se para ser Ministro da Ciência

Neurocientista Suzana Herculano-Houzel, a brasileira que descobriu de quantos neurônios se faz um cérebro, é mais uma cientista brasileira a desisitir de fazer pesquisa no país. A situação da política científica brasileira é terrível, mas nada é tão ruim que não possa piorar: Temer quer um bispo da Universal como ministro da Ciência e Tecnologia.

Por Denis Russo Burgierman
Atualizado em 11 mar 2024, 10h42 - Publicado em 4 Maio 2016, 14h45

Num texto de partir o coração, publicado ontem na revista piauí (aberto apenas para assinantes), a neurocientista brasileira Suzana Herculano-Houzel deu adeus ao país e explicou porque ela resolveu aceitar o convite para se mudar para o Tennessee. Autora de bons livros sobre o funcionamento do cérebro, palestrante do TED e autora principal de uma das raríssimas pesquisas assinadas só por brasileiros a ir parar nas páginas da respeitada revista Science, Suzana diz que se cansou do ambiente que incentiva a mediocridade e de uma penúria tão grande que ela às vezes precisa tirar dinheiro do bolso para fazer pesquisa. “A ciência brasileira está agonizante”, escreveu. 

E olha que o melancólico texto foi escrito antes de Suzana ficar sabendo da informação que apareceu ontem no noticiário político, que dava conta de que o vice-presidente Michel Temer está considerando dar o ministério da Ciência e Tecnologia do governo que ele pretende montar ao bispo Marcos Pereira, presidente do partido de aluguel PRB e bispo da Igreja Universal. A notícia não está confirmada – é mais um entre os tantos balões de ensaio que Temer está vazando na mídia para ver se são ou não abatidos. Se este não for, o cargo governamental mais alto da administração da Ciência no Brasil ficará com um técnico em contabilidade, líder espiritual e business man envolvido em dois negócios bem lucrativos: igreja e partido.

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O ministério da Ciência e Tecnologia seria uma recompensa de Temer ao nanico PRB, em troca do apoio do partideco ao impeachment – um exemplo extremo da lógica tosca que tem regido a política científica do país – e a política em geral. Investir em ciência é mesmo complicado em tempos de crise econômica, mas o mundo inteiro sabe que dinheiro aplicado nessa área volta multiplicado no médio e principalmente no longo prazo, na forma de patentes lucrativas, de ganhos na qualidade da educação e na qualidade dos processos tanto na esfera privada quanto na pública.

No Brasil, o ministério da ciência é moeda de troca nas negociatas partidárias – um entre tantos orçamentos milionários para serem disputados pelos partidos que se alimentam de chupinhar dinheiro público. Em outros países, é um espaço para formulação de estratégias de longo prazo, que vão muito além das próximas eleições. É também uma área que apoia o resto do governo, levando o conhecimento científico de ponta para a formulação das políticas públicas.

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Engana-se quem pensa que os maus tratos à ciência no Brasil sejam exclusividade das gestões petistas. No governo tucano paulista, por exemplo, toda a discussão sobre a crise hídrica praticamente ignorou os conselhos dos cientistas do clima. Chegou a dar dó ver o governador Alckmin declarar que havia crise na época de seca, para depois falar que a crise tinha passado quando chegou a estação das chuvas e voltar a ficar preocupado quando parou de chover de novo – demonstrando que ele nem sabia que as vissiscitudes do clima estavam previstas há mais de uma década por complexos modelos climáticos produzidos por cientistas. O desprezo ao conhecimento do governo paulista ficou patente também quando, em meio a uma imensa crise na educação pública, o governador trocou o secretário da educação – e, em vez de nomear um grande líder pedagogo, como recomendam os especialistas no tema, ele deu o cargo a um desembargador de justiça que não entende patavinas de aprendizagem e que ficou famoso ao defender o privilégio dos juízes de terem uma verbinha pública para comprar ternos chiques.

O problema da tosqueira da política científica brasileiro não é partidário, é cultural: manifesta-se em todos os partidos e também fora deles, nas universidades, como o sincero texto de Suzana deixa bem claro. Todo o establishment científico do Brasil está dominado por uma visão anacrônica, que desestimula inovação, desperdiça recursos e não dá esperança a uma geração talentosa de pesquisadores que está deixando o país em massa, em busca de oportunidades melhores. Mudanças profundas são urgentes, até porque sem ciência de ponta não haverá saída para a crise – passa pelo investimento científico a concretização do estupendo potencial do Brasil, país mais rico do mundo em recursos naturais. Mas, ao que parece, o sistema político brasileiro não tem a menor capacidade de promover essas mudanças.

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