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O dia em que a Terra enferrujou. Todinha.

3,5 bilhões de anos atrás, a invenção da fotossíntese pelas cianobactérias começou a injetar oxigênio na atmosfera. E essa foi uma péssima notícia para os demais seres vivos.

Por Bruno Vaiano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 22 jan 2021, 13h00 - Publicado em 28 nov 2018, 19h51

Há 2,5 bilhões de anos, a Terra enferrujou. No sentido mais literal possível: boa parte do ferro que estava diluído nos oceanos do planeta oxidou em uma tacada só. As rochas que se formaram nessa era geológica – chamada “neo-arqueano” –, contém faixas marrom-alaranjadas até hoje. Dá uma olhada.

Para o ferro oxidar, é claro, foi preciso fornecer oxigênio a ele (é daí que vem o nome). E acontece que o gás, hoje tão abundante, antes era raro. Quando a Terra se formou, havia pouquíssimo dele na atmosfera. Os seres vivos mais primitivos – nossos avós mais antigos – eram bactérias minimalistas, com metabolismo adaptado para lidar com moléculas nada simpáticas, como metano, amônia ou ácido sulfúrico.

A situação só mudou quando microorganismos azul-esverdeados chamados cianobactérias, graças à seleção natural, desenvolveram um método de produção de energia inédito – chamado fotossíntese. Elas eram capazes extrair energia do Sol, a fonte mais abundante que há nas redondezas. Como resto desse truque químico engenhoso, elas liberavam oxigênio.

Dava tão certo que as cianobactérias se multiplicaram feito coelhos, e o oxigênio tomou conta do mar e da atmosfera. Ele não só atingiu em cheio o ferro do neo-arqueano como também foi um veneno para os demais micróbios da época. O ramo da árvore da vida que levou à espécie humana só chegou até aqui porque aprendeu a usar o oxigênio a seu favor, respirando o dito cujo. Mas ele ainda danifica nossas células sem dó, e nós tentamos combater seus efeitos indo ao nutricionista – é por isso que “antioxidante”, hoje em dia, virou sinônimo de “saudável”.

Os cientistas chamam esse momento épico da história da Terra de “grande evento de oxigenação”. Ele aconteceu há muito, muito tempo: 2,5 bilhões de anos. É dez vezes mais do que 250 milhões anos atrás – que foi quando os dinossauros dominaram a Terra. E é dez mil vezes mais do que 250 mil anos atrás – que foi quando o ser humano surgiu. Em resumo: é mais antigo que Dumbledore e Gandalf juntos. É um passado ridiculamente longínquo.

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Agora, um grupo de pesquisadores do Imperial College de Londres quer reescrever essa história: eles argumentam que o grande evento de oxigenação não foi essa novidade toda – e que já há indícios da produção do gás na Terra há 3,5 bilhões de anos, 1 bilhão de anos antes do que supõe a hipótese narrada acima.

3,5 bilhões pode parecer pouco diferente de 2,5 bilhões quando estamos em uma escala de magnitude tão absurda. Só que, se esta nova teoria estiver certa, a produção de oxigênio teria começado menos de 1 bilhão de anos depois da origem da própria vida na Terra. O que significaria que o processo de geração de energia por fotossíntese, apesar da sofisticação, não exigiu tanto tempo para evoluir.

É difícil encontrar rochas de 3,5 bilhões de anos que contenham qualquer coisa parecida com resquícios de vida microscópica. Muito menos com resquícios de que tipo de coisa essa vida respirava e excretava. Por isso, para estudar a atmosfera terrestre dessa época, é preciso buscar evidências em outro lugar: nas proteínas que auxiliam na fotossíntese nas plantas de hoje em dia. Sim, as plantas que você conhece.

As proteínas escolhidas para a análise participam da fotossíntese tanto em plantas multicelulares – como pinheiros – quanto em cianobactérias contemporâneas. Isso significa que elas são uma relíquia evolutiva. Foram inventadas há muito tempo, e são compartilhadas por muitos seres vivos. Justamente por existirem há muito tempo, elas sofreram muitas modificações em suas sequências de aminoácidos (os tijolos constituintes das proteínas).  

Por exemplo: duas dessas proteínas, chamadas D1 e D2, têm a mesma origem. Hoje, porém, 30% de seus aminoácidos são diferentes. Como as instruções para construir uma proteína ficam armazenadas no DNA, isso significa que 30% do gene responsável por produzir D2 é diferente do gene responsável por D1.

Cada uma das diferenças que perfazem esses 30% corresponde a uma mutação genética, e mutações genéticas se acumulam em um ritmo previsível, a intervalos regulares. Quando você sabe o ritmo em que as mutações se acumulam em um gene, você tem em mãos algo chamado relógio molecular: a capacidade de estimar a época em que um determinado evento evolutivo ocorreu com base no número de mutações que se acumularam desde então.

A conclusão foi que o relógio molecular dessas proteínas é lento. Muito lento. O que significa – após muita matemática e experimentos, que fique bem claro – que a fotossíntese já estava por aí 1 bilhão de anos antes do previsto. Antes mesmo das cianobactérias, que costumam ser creditadas como suas inventoras.

Tanai Cardona, biólogo do Imperial College de Londres e líder do estudo, explicou: “Normalmente, a aparição da fotossíntese e a aparição das primeiras cianobactérias são consideradas a mesma coisa. Então, para os pesquisadores, descobrir quando o oxigênio foi produzido pela primeira vez e quando as primeiras cianobactérias evoluíram dá essencialmente na mesma.”

“Nosso estudo vai no sentido oposto, e mostra que a fotossíntese e a produção de oxigênio começaram muito antes do ancestral mais antigo das cianobactérias. Isso está de acordo com informações geológicas, que sugerem que já havia acúmulos pontuais de oxigênio há 3 bilhões de anos.”

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