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Robô Curiosity encontra matéria orgânica e “metano misterioso” em Marte. E daí?

Não acharam aliens. Mas acharam a melhor evidência da história de que Marte já foi capaz de abrigar vida.

Por Ana Carolina Leonardi Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
7 jun 2018, 19h55

O robô Curiosity, possivelmente a sonda mais adorável a ter cruzado o espaço, voltou a dar o ar de sua graça após cinco anos de silêncio.

Da última vez que apareceu, o carrinho de 900 quilos tinha encontrado evidências de um grande lago em Marte, onde há 3 bilhões de anos teria existido água líquida – a primeira condição essencial para a existência da vida como a conhecemos.

Agora, o retorno do robozinho vem acompanhado de duas notícias impressionantes sobre o Planeta Vermelho: encontraram matéria orgânica de 3 bilhões de anos no fundo do antigo lago. E descobriram metano que varia com as estações.

Você já está impressionadíssimo? Não? Calma lá. Vamos destrinchar essas descobertas.

Um modelo de como teria sido o lago na Cratera Gale de Marte, há 3 bilhões de anos. ()

Tijolos da vida

Se a água líquida é a condição essencial para a existência de vida na Terra, logo atrás dela vêm as moléculas de carbono, que são a base de todos os seres vivos – uma espécie de pedra angular da vida terrestre. E, por isso, quando buscamos vida em outros planetas, costumamos buscar por essas mesmas moléculas, chamadas de matéria orgânica.

Não apenas a matéria orgânica é associada como os seres vivos em si, mas com a dieta deles. Seres vivos não apenas são feitos de matéria orgânica, mas também se alimentam dela. Qualquer forma primordial de vida precisaria dessas moléculas, no mínimo, para não morrer de fome.

A nova matéria orgânica marciana foi encontrada impregnada em rochas do solo do planeta, que foram perfuradas pelo Curiosity. Esse tipo de rocha, chamada de lamito (ou mudstone, em inglês, pedra de lama na tradução direta) se forma a partir do acúmulo de anos e anos de matéria (nesse caso, argila), que vai se empilhando por ali.

Quando o robozinho perfurou a pedra, até alcançar uma camada que tinha 3 bilhões de idade, a poeira resultante foi analisada por um instrumento do Curiosity chamado SAM ­ (Análise de Amostras em Marte, na sigla em Inglês). O SAM aqueceu o pózinho a 500ºC e começou a estudar cada uma das moléculas de gás que surgiu (ou melhor, se volatilizou) graças ao calor, como você vê na animação abaixo.

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Entre elas, ele encontrou uma série de moléculas orgânicas razoavelmente complexas ­– que, no passado aguado de Marte, podem ter servido como tijolinhos para a vida (ou como almoço dela).

“Ah, então é por isso que a notícia é impressionante?” Bom, não é a primeira vez que encontramos matéria orgânica em Marte. O próprio Curiosity já tinha feito descobertas desse tipo. Mas os resultados atuais contém 100 vezes mais concentração de carbono orgânico do que as amostras de solo que ficam na superfície do planeta.

O interessante é que, quanto mais moléculas diferentes são encontradas em Marte, maior o “repertório” de matéria orgânica ­– e mais esperançosos os cientistas ficam de que, num passado distante a vida em Marte foi, ao menos, concebível. Ou, em termos técnicos: a descoberta é “consistente com uma presença de biologia no passado, segundo disse o cientista Ken Williford em um comunicado da Nasa.

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Tudo isso se enquadra na seguinte “fanfic”: há 3 bilhões de anos, quando em Marte existia água líquida e seus lagos eram cheios de matéria orgânica, a vida tinha todas as condições para surgir. Especialmente porque Marte tinha um campo magnético, que protegia sua atmosfera, permitindo a existência de gás carbônico e outros gases estufa, que mantinham a temperatura amena e concentrações suficientes de gases necessários à vida. Tempestades solares foram, aos poucos, destruindo esse campo magnético (saiba mais sobre isso aqui). Quando ele ruiu, os gases foram “vazando” de Marte, tornando o Planeta Vermelho um grande deserto, seco e morto.

Caso isso seja verdade, qual seria o melhor lugar para encontrar as evidências de vida de Marte? Em rochas sedimentares muito antigas, no subsolo. Sacou a importância da primeira descoberta agora? É o primeiro degrau de uma longa escada de comprovações científicas necessárias para confirmar nossa “fanfic”.

Pausa para um pequeno balde de água fria: moléculas orgânicas não são necessariamente produzidas por organismos vivos. Elas podem ter chegado à Marte vindas de meteoritos ou processos químicos entre rochas, nenhum dos dois envolvendo vida. Mas as análises atuais não são suficientes para descartar nenhuma das possibilidades ­– nem a de que elas teriam se originado, sim, de um ecossistema que incluía seres vivos. “Nós detectamos exatamente o tipo de amostra que você poderia esperar de um lago muito antigo na Terra”, disse Jennifer Eigenbrode, principal autora dos estudos, ao Washington Post.

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Puns de vaca marcianos

Vamos então ao segundo anúncio importante do Curiosity. O robozinho também encontrou amostras de gás metano (CH4) na atmosfera marciana. De novo, isso não é novidade. De vez em quando, alguns puffs de CH4 eram detectados por lá. Mas o novo estudo foi o primeiro a encontrar um padrão nessa presença misteriosa. O metano de Marte é como as flores: muda conforme a estação.

Pela primeira vez, ficou comprovado que o metano na atmosfera de Marte tem padrões cíclicas e consistentes. Sua presença aumenta durante o verão ­(que atinge uns 20 e poucos graus Celsius), vai caindo durante o outono e atinge seu ponto baixo no inverno, com os doloridos 140ºC negativos.

O Curiosity passou três anos analisando a composição da atmosfera marciana para chegar a essa conclusão. A possível explicação é gelo: o metano viria do subsolo, onde ficaria armazenado em cristais congelados. Ele só seria liberado, por meio de fissuras na superfície, quando a temperatura aumentasse graças ao verão.

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Metano é a molécula orgânica mais simples que existe. Ele pode surgir de reações químicas totalmente inorgânicas ­– mas, na Terra, 95% do metano existente tem seres vivos como fonte (um culpado em especial, acredite se quiser, são as flatulências das vacas). Por aqui, inclusive, uma forte teoria é que um dos mais antigos seres vivos terrestres teriam sido as bactérias metanogênicas, que se alimentam de matéria orgânica e produzem CH4.

Mas de volta a Marte: por lá, a radiação é fortíssima, destrói facilmente as moléculas de metano. Por isso, encontrar nível razoavelmente estáveis de metano ao longo do ano implica fortemente que há um reservatório, alguma fonte “renovável” de CH4 escondida, possivelmente no subsolo. Pode ser simplesmente a história do metano cristalizado… Mas dá para manter uma esperança débil de que seja alguma forma simples e metanogênica de vida.

Curva mostra a variação do metano ao longo das estações marcianas. (Nasa Goddard/NASA)

Com esse ciclo sazonal do metano descoberto, os cientistas da Nasa afirmam que o futuro das pesquisas em Marte acaba de ficar muito mais claro. As próximas missões (incluindo a sonda que deve ir para lá em 2020), além de procurar ainda mais moléculas orgânicas, precisam investigar as origens do metano misterioso.

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“Com essas novas descobertas, Marte está nos dizendo para manter o curso à frente e seguir buscando por evidências de vida”, concluir Thomas Zurbuchen, do quartel general da Nasa em Washington.

Uma coisa é certa: quanto mais de perto olhamos o passado químico de Marte, mais criativas (e esperançosas) as fanfics sobre o seu passado vão ficando.

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