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Super-homens

Pessoas comuns usando fantasias e nomes falsos para fazer o bem e combater o crime. Conheça o fenômeno dos super-heróis da vida real

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h49 - Publicado em 27 jun 2010, 22h00

Alexandre Rodrigues

Todo super-herói tem uma tragédia em sua origem. O Batman assistiu ao assassinato dos pais ainda menino. O Super-Homem sofre por ser o único sobrevivente de um planeta que explodiu. O Homem-Aranha se balança em teias para compensar um erro – deixou fugir o bandido que depois matou seu tio. Mas Sarah só precisou levar um pé na bunda para se tornar Terrífica, que luta para impedir que outros tirem vantagem de mulheres indefesas.

Mas alguns mantêm uma aura de mistério e dizem viver nas sombras espreitando malfeitores. “É como eu posso ajudar os outros”, diz O Olho, herói de Mountain View, Califórnia. Na internet, se apresenta como um ex-detetive particular que passou 25 anos em empresas do Vale do Silício e hoje vigia sorrateiramente o crime, reunindo provas para a polícia. Aos 51 anos, percorre a cidade de carro usando equipamentos que ele mesmo inventa – como uma bengala-câmera, um rádio-periscópio e uma lanterna laser – para vigiar criminosos. Ao seu lado, leva a mulher, ela também uma super-heroína, que adota o codinome de Lady Mistério. “O parque Mercy Bush tem sido a cena de alguns avistamentos estranhos em várias patrulhas. Eu vi vandalismo, duas pessoas fazendo sexo sendo filmadas por uma terceira e, em geral, todo tipo de esquisitos que são atraídos para esse lugar quando cai a noite”, registrou em seu blog sobre uma patrulha noturna.

O fenômeno é mais forte nos EUA, mas já atravessou o Atlântico. “Sou detetive e combatente do crime”, se apresenta Entomo (latim para “inseto”), italiano de 32 anos. Com a identidade mais ou menos secreta – diz que 13 pessoas próximas sabem quem ele é -, dedica-se a evitar o vandalismo nas ruas de Nápoles desde 2007, quando se inspirou com a história de Terrífica. Ele conta que passou por treinamento antes de assumir a vida dupla, mas sua grande vantagem, assegura, são as habilidades paranormais. “Eu injeto justiça”, diz, sem dar mais detalhes. “Hoje é meu terceiro aniversário como herói. Obrigado a todos pelo apoio. Eu irei celebrar patrulhando as ruas toda a noite”, comemorou Entomo dia 2 de março na sua página no MySpace – que, a propósito, também informa que está interessado em conhecer mulheres.

Sala (virtual) da Justiça
Não haveria os super-heróis de verdade sem a internet. O fenômeno é efeito da web 2.0, que impulsionou uma profusão de blogs e páginas de redes sociais, para heróis e grupos dos quais fazem parte. “Os interessados no assunto juntaram forças, viram que não estavam sozinhos”, diz Goldman/Cameraman. Em fóruns na rede, veteranos e novatos trocam experiências e dicas. Onde encontrar spandex, o tecido dos uniformes dos super-heróis, mais discretos? Camadas de Kevlar, como nos quadrinhos, realmente protegem contra uma bala? (A resposta é não.)

Às vezes, esses fóruns servem para mostrar que a realidade não é tão exigente quanto a ficção. Em seu livro Becoming Batman (“Virando Batman”, sem versão em português), o neurocientista canadense E. Paul Zehr estimou entre 15 e 18 anos o tempo que Bruce Wayne levou treinando para ser o Cavaleiro das Trevas. Para o autor, Wayne é um atleta capaz de ser campeão olímpico no decatlo. “Quero virar um super-herói, mas tenho vergonha da minha barriga”, explica o novato em um tópico de discussão. “Calma. Você deve ter notado que há muito super-herói fora de forma”, responde, tranquilizador, um veterano.

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Se você acha que está faltando conflito, não falta mais: protegidos pelo anonimato virtual, já começam a surgir os primeiros supervilões. “Suas ações não significam nada para mim. Vocês heróis são como um brinquedo de plástico. Um inseto pedindo para ser esmagado”, desafiou Horizonte Negro em seu vídeo de apresentação no YouTube. Como a maioria dos heróis da real, ele também não perde a chance de dar entrevistas. “Não pode haver um super-herói sem um super-vilão”, defende. “E, como os super-heróis estão se espalhando por aí, aqui estou.” E no que ser um vilão pode ser enriquecedor? “Eu gosto de ver adultos e crianças sofrer.” Como os heróis se reúnem em grupos, os “supervilões” também formaram o seu: o Círculo Negro – por enquanto, suas maldades ficaram só na promessa. E sinta-se perdoado quem começar a rir sabendo que um dos artífices das forças do mal é o Masturbador Negro.

Mas a internet ainda não foi capaz de proporcionar a qualquer dos novos heróis o tipo de fama do veterano Superbarrio Gómez, na ativa desde os anos 80. Quando jovem, nos anos 70, foi guerrilheiro e afirma ter participado de 3 assaltos a bancos. Mais tarde, nos anos 80, o militante passou a se apresentar como um bizarro personagem que, com uma máscara de luta livre e um uniforme que lembra o do Chapolin Colorado, começou a aparecer em protestos populares e greves de trabalhadores na Cidade do México. Embora nunca tenha concorrido em seu país, em 1996 se tornou uma celebridade internacional ao se proclamar candidato alternativo à Presidência dos EUA.

Desde então, foi tema de dois livros, apareceu na série inglesa de quadrinhos 2000 AD Presents e também foi tema de um curta-metragem animado, La Vuelta de Superbarrio (“O Retorno de Superbarrio”). Com quase 60 anos – sua idade correta é desconhecida -, aposentou-se no início da década e revelou a identidade secreta: Marco Rascón Córdova. Mas, assim como o personagem Fantasma, a honra de ser Superbarrio parece passar adiante: desde 2005 outro sujeito veste o uniforme. Sua página no Facebook informa: ainda está na ativa.

Vida realA Califórnia é um dos estados americanos onde o Olho pode agir. Na Carolina do Norte, por exemplo, cidadãos comuns são proibidos de prender alguém. Se algum deles fizer isso, pode ser detido por sequestro. Apesar de até achar positivo um grupo de cidadãos dispostos a ajudar, a polícia de San Diego, também na Califórnia, que vive uma epidemia de heróis, deu o recado: o combate ao crime só pode ser feito sem violência. E sugere aos heróis apenas denunciarem crimes e depois servirem de testemunhas. A resposta do público – como era de esperar – fica entre o apoio e o deboche. Em Nova York, um encapuzado chamado Vida reclama de moradores que atiram objetos das janelas – o paladino da justiça foi atingido por um pedaço de carne crua.

Mas os super-heróis da vida real têm um motivo para não desanimar: conseguiram empolgar ninguém menos do que Stan Lee, o criador de Hulk, Homem-Aranha, Homem de Ferro e outros heróis. “Se alguém está cometendo um crime, se alguém está machucando outra pessoa, é quando um super-herói entra em cena. É bom que haja pessoas ansiosas para ajudar as próprias comunidades”, declarou ele em entrevista à rede CNN. E até Hollywood já embarca na onda: está prevista para 11 de junho a estreia no Brasil de Quebrando Tudo (Kick-Ass), filme que liderou as bilheterias americanas com a história de um jovem que resolve combater o crime fantasiado – e encontra outros como ele. É, claro, uma comédia.

Super-Herói viu o filme e não gostou muito, por achar que ridiculariza algo que ele leva muito a sério. Mas não se incomoda diante de uma pergunta bastante repetida: os super-heróis da vida real não passam de adultos que não querem enfrentar a própria vida? “Eu acho que as pessoas são conformistas”, ele responde. “Eles acham que nós devemos viver apenas vidas normais. Vidas normais são um saco.”

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Para saber mais

Watchmen
Alan Moore & Dave Gibbons, Panini Livros, 2009.

Fredric Wertham and the Critique of Mass Culture
Bart Beaty, University Press of Mississippi, 2005.

worldsuperheroregistry.com

reallifesuperheroes.org

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