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Tudo o que você queria saber sobre pré-sal

A SUPER explica tudo sobre um dos assuntos mais comentados da atualidade

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h52 - Publicado em 20 fev 2011, 22h00

Willian Vieira e Maurício Horta

De onde vem o pré-sal?

Há 130 milhões de anos a América do Sul e a África começavam a se separar fisicamente. E, na rachadura entre os dois continentes, um caldo de matéria orgânica foi se acumulando. Enterrado então por uma imensa camada de sal e por sedimentos, esse cemitério de plâncton cretáceo se tornaria o novo passe para o “país do futuro”.

Esse óleo é bom?

O petróleo do pré-sal não é dos melhores, mas ainda assim é bem superior ao do pós-sal. Hoje, 70% dele é do tipo “pesado”. Ou seja, tem enormes cadeias de carbono em sua composição. Para virar produtos de alto valor, como diesel, gasolina e lubrificantes, essas moléculas precisam ser quebradas em outras menores. Mas, como isso encarece muito o refino, ele acaba valendo bem menos. Já o pré-sal tem petróleo de densidade média – mais fácil de refinar, e mais valioso. Essa diferença de qualidade acontece por causa das temperaturas nas profundezas do pré-sal. O calor de 150 ºC não permitiu proliferar as bactérias que no pós-sal comeram as frações mais leves do óleo.

1. RACHA TECTÔNICO

Há 600 milhões de ano, o mundo era dividido em dois supercontinentes: a Laurásia e Gondwana. Mas os movimentos de placas tectônicas começaram a separá-los. Gondwana perdeu a Austrália, a Índia, a Arábia… e, há 130 milhões de anos, foi a vez de uma fenda separar a África da América do Sul.

2. LAGO DANTESCO
As regiões onde se formariam as bacias de Campos e de Santos foram varridas por terremotos, cheias de rios, desmoronamentos e tempestades. A cada catástrofe, enormes fluxos de sedimentos se depositaram no fundo da fenda. Assim se criou um lago estreito de água salobra de 800 km de comprimento.

3. ENPADO ORGÂNICO
Esse lago virou um enorme pântano rico em plâncton – organismos como bactérias e crustáceos microscópicos. Conforme essa matéria orgânica se depositava, ela se misturava a finas partículas de argila, areia, calcário e conchas. Formou-se então a rocha porosa em que o petróleo está armazenado.

4. O SAL DO PRÉ
Mas a atividade tectônica não parou por aí. Com o afastamento dos continentes, as águas do oceano passaram a invadir o lago, formando um mar longo e estreito. Assim que a água salgada evaporava, acumulava uma camada de sal no leito do mar. Com o tempo, o sal atingiu 2 mil m de profundidade.

5. HABEMUS OLEUM!

O mar continuou se alargando e formou o Atlântico Sul. Com o calor e sob a pressão da água, do leito oceânico, do sal e de rochas, a matéria orgânica virou petróleo nos últimos 20 milhões de anos.

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Quais os desafios para extraí-lo?

ILHAS FLUTUANTES

As plataformas serão como navios ancorados a 3 km do leito do mar. Cada uma terá até 200 funcionários, que virão em super-helicópteros capazes de vencer distâncias para aviões: 300 km em 80 minutos.

FURA, FURA, FURA
Ainda não se sabe como as sondas vão vencer 2 km de sedimentos e 2 km de sal, que se comporta como uma massa plástica e impermeável teimosa.

DUTOS PODEROS

Para escoar o óleo, será necessário desenvolver dutos que aguentem pressões de 400 atmosferas, gases corrosivos, altas temperaturas e grandes trações (a plataforma fica balançando). E a um custo baixo.

ANTICHOQUE TÉRMICO

O óleo sai de 150 ºC lá de baixo do sal e chega a 4 ºC na lâmina d’água – e nesse resfriamento ele pode coagular e entupir os dutos. Falta ainda achar uma solução química para impedir essa formação de cristais.

GÁS, O PRESENTE MALDITO
Junto com o petróleo vem de brinde o gás natural. Maravilha? Não. Para transportar o gás, é necessário um caro gasoduto oceânico de 300 km ou liquefazê-lo na plataforma – processo que desperdiça energia.

Qual o tamanho da coisa?
Ninguém sabe. Mas as estimativas da Agência Nacional do Petróleo é de que, com o pré-sal, o Brasil tenha 50 bilhões de barris de petróleo, só nas áreas prospectadas. E, se depender de anúncios mirabolantes do Ministério de Minas e Energia, esse número pode atingir 150 bilhões de barris. Se for verdade, o Brasil ultrapassará o Irã como a 3ª maior reserva do mundo.

Na fileira da frente

Empresas com maior valor de mercado do mundo, em US$ bilhões.

Reservas brasileiras estimadas
Quanto mais explora, mais encontra (em bilhões de barris de petróleo).

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QUEM VAI PAGAR A CONTA?

Os acionistas da Petrobras – incluindo o maior deles, o governo brasileiro. A Petrobras vinha emprestando grana para fazer seus imensos investimentos. Só que a dívida bateu em 34% de todo seu patrimônio. Com a corda no pescoço, não podia mais emprestar – o que ameaçou seus planos de investir mais US$ 224 bilhões até 2014. Só sobrava uma opção: criar novas ações e ver se investidores se interessariam. Deu certo. No dia 30 de setembro, a Petrobras ficou um Iraque inteiro mais rica e pulou de 21ª para 4ª maior empresa do mundo. Foi a capitalização da Petrobras – a maior da história.

Mas aí há um probleminha. Quando uma empresa emite ações, os papéis que os acionistas possuíam passam a representar uma porcentagem menor do novo total. E tudo o que o governo não queria é perder espaço na mais estratégica empresa do país. Ele foi então às compras. Sem poder tirar dinheiro da cartola, ele usou outra moeda: petróleo do pré-sal. Cedeu à Petrobras 5 bilhões de barris ainda debaixo da terra, e, em troca, aumentou sua participação de 40 para 48% das ações. Por seu lado, a Petrobras pagou US$ 8,51 por barril. Quando a empresa extraí-lo, vai valer mais – hoje, passa de US$ 80. Mesmo assim, isso custou à estatal R$ 74,88 bilhões, grana em parte emprestada do BNDES, por sua vez vinda da emissão de títulos do Tesouro. Ou seja, o governo pagou parte da conta.

E os tais royalties?

Se você encontrou petróleo ao fazer um buraco no quintal, não, não ficou rico. O que jorrar é da União. Para ter direito de explorá-lo, vale a mesma regra de gravar a música de outra pessoa: tem que pagar royalties. Hoje, 30% dos royalties vão para a União, 26,25% para estados produtores, 26,25% para municípios produtores, 8,75% para municípios atingidos pelo transporte do petróleo e 8,75% para demais estados e municípios. O argumento para essa divisão é que os royalties servem para compensar estados e municípios produtores com o que gastarem em infraestrutura, e compensar possíveis danos ambientais. Mas quem não mama chora: deputados de estados não produtores propuseram distribuir os royalties para todos – o que tiraria R$ 8 bilhões do Rio. Isso, claro, engatilhou uma guerra entre estados. O Congresso já aprovou a mudança, mas até o fechamento desta edição o então presidente Lula disse que a vetaria.

Como vão partilhar o tesouro?

DO VALE-TUDO…
Nos campos do pós-sal, a empresa que achar petróleo decide o que fazer com ele.

1. Em 1997, FHC acabou com o monopólio da Petrobras; pode explorar óleo a empresa que comprar uma concessão.

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2. Esse sistema parece uma mamata, mas não é bem assim: no pós-sal, o risco de investir horrores em prospecção e não achar nada de petróleo é alto.

3. Quem assumir esse risco faz o que bem entender com o óleo que achar, desde que pague royalties ao governo.

…À MÃO DO ESTADO
Já no pré-sal o governo faz pesar o punho: controla a venda do óleo e favorece a Petrobras.

1. Como o risco de não ver óleo no pré-sal é baixo, o governo mudou a regra: licita um campo, que vai para quem oferecer mais lucro à União.

2. O contrato pode ser exclusivamente com a Petrobras. Se houver a participação de outras petroleiras, a estatal fica com a operação e uma participação de pelo menos 30% do consórcio.

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3. Mesmo depois de extraído, o petróleo ainda pertence à União.

4. Depois de vender o óleo, a estatal Pré-Sal Petróleo divide a grana entre União e petroleiras.

O que vão fazer com a grana?
Soa estranho, mas o melhor é tirar o dinheiro do Brasil. A exportação de petróleo inundaria o país de dólares, o que explodiria o valor do real. Ficaria então mais barato comprar produtos importados que os daqui. Isso levaria a indústria nacional para a cucuia e aumentaria o desemprego. O pré-sal seria então gasto para remediar problemas sociais que ele mesmo criou. É a doença holandesa – maldição batizada assim quando a exportação de gás na Holanda minou sua economia nos anos 70. Para se livrar dessa, o Brasil vai criar o “Fundo Social”. Veja como será.

Vacina antidoença holandesa
Um fundão vai evitar a invasão de moeda estrangeira.

1. A parte da receita do pré-sal que cabe à União vai para o Fundo Social – uma poupança pública de longo prazo. A ideia é que esse fundo deposite grana fora do Brasil, o que compensaria a entrada de dólar vindo do petróleo.

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2. O Fundo Social vai investir em títulos de governos estrangeiros, que têm baixo risco, e em ações de empresas fora do setor petrolífero. Assim, o fundo servirá de “colchão” quando o petróleo estiver em baixa.

3. Enquanto essa “poupança” deve continuar guardadinha, o governo deve sacar apenas seus rendimentos. Com essa grana, promete investir em tecnologia, educação, saúde, ambiente e combate à pobreza.

Pode dar tudo errado?
Sim, mas é pouco provável. Para a maioria dos países, o petróleo foi uma maldição. Felizmente a balança no Brasil pende para o lado bom

O pré-sal te dá asas
Sempre que o Brasil cresce, vira voo de galinha: o baixo investimento cria “gargalos” na economia. Mas o pré-sal aumentará esse investimento, o que pode sustentar o crescimento. Compare a porcentagem de investimentos no PIB de outros Brics.

Somos de fato autossuficientes?

Ainda não. Embora o Brasil extraia mais petróleo do que consome, o cálculo engana. Como parte das refinarias brasileiras foi construída nos anos 70 para o petróleo leve importado do Oriente Médio, não conseguimos refinar todo o nosso óleo pesado. E aí o que fazemos é como exportar laranja e importar suco. Mas 5 novas refinarias vão dar conta do mercado interno – e externo.

Na Arábia Saudita, o petróleo financia uma monarquia autoritária. Na Nigéria, alimenta conflitos étnico-religiosos. Na Venezuela, domina a economia ao ponto de a PDVSA, a “Petrobras” deles, virar um Estado dentro do Estado, e outro setores econômicos acabarem aniquilados. Mas é pouco provável que isso aconteça no Brasil. O país já era uma democracia estabelecida quando achou as megarreservas; sua economia é sólida e diversificada: apenas 8% do PIB vem do petróleo, contra 80% na Venezuela. E o Fundo Social deve evitar a doença holandesa.

Mas há margem para receio. O peso do setor do petróleo na economia aumenta sem parar – de 2,8% em 1996 foi para 8,1% em 2004, e a Petrobras mais que dobrou de tamanho. Isso antes de o pré-sal ser encontrado. Com o Estado controlando grande parte do setor, “o maior risco é o país não ter instituições fortes que impeçam a apropriação errônea desses recursos por grupos de poder”, diz Maurício Canêdo , da FGV.

Brasilzão

• Fundo Social (FS) evita que o real se valorize demais ao aplicar receita do petróleo no exterior.

• Investimento do FS em educação e tecnologia torna o Brasil polo de inovação e criatividade.

• Indústrias naval, petroquímica, siderúrgica e petroleira de nível global, pois não foram protegidas da competição estrangeira.

• Brasil vira a 5ª maior economia do mundo em 2025.

Brasilistão

• 11,52% do PIB se concentram nas mãos da Petrobras.

• Esses recursos são apropriados por grupos de poder.

• Política protecionista alimenta uma indústria ineficiente e sem competitividade.

• Terminados os investimentos da exploração do pré-sal, essa indústria desaparece.

• Brasil continua esperando ser o país do futuro.

O que o petróleo trouxe em outros países?

Bem-estar social – Noruega

Exportação de petróleo – 1°

IDH – 4°

Índice de democracia – 5°

Recebeu de fato um bilhete premiado ao descobrir petróleo nos anos 60. Ainda que o setor petrolífero represente um quarto do PIB, um fundo soberano imunizou o país contra a doença holandesa – ele serve de colchão em crises e só rendimentos são gastos. A indústria não foi protegida por reservas de mercado, e se manteve competitiva.


RIQUEZA – Emirados Árabes Unidos

Exportação de petróleo – 3°

IDH – 32°

Índice de democracia – 150°

A descoberta de jazidas em 1958 transformou esses emirados atrasados em um dos maiores centros financeiros mundiais. Um dos ingredientes é o fundo soberano de Abu Dabi: US$ 627 bilhões acumulados desde 1976. Com seus rendimentos, o governo diversifica a economia local para quando o óleo acabar.

POPULISMO – Venezuela

Exportação de petróleo – 10°

IDH – 75°

Índice de democracia – 93°

Antes de Hugo Chávez, o petróleo concentrava renda. Depois, dele, concentrou poder no Estado. Com os lucros da estatal PDVSA, que detém 80% do PIB, Chávez financia o “socialismo do século 21”: projetos sociais populistas, nacionalização da economia, expropriação de negócios e mudança na Constituição para se reeleger eternamente.

DITADURA – Arábia Saudita

Exportação de petróleo – 1°

IDH – 55°

Índice de democracia – 159°

A dona de um quarto do petróleo do mundo é uma monarquia conservadora que proíbe partidos políticos, torra 10% do PIB em gastos militares e financia extremistas islâmicos. O petróleo é responsável por 75% da economia, e a mistura de religião e dinheiro da estatal Saudi Aramco impossibilita qualquer mudança rumo à democracia.


TEOCRACIA – Irã

Exportação de petróleo – 8°

IDH – 70°

Índice de democracia – 139°

É governado por presidentes eleitos de forma desacreditada e por um conselho religioso conservador. O petróleo traz 80% do orçamento do governo, que subsidia desde o pão até a gasolina, alimenta um programa nuclear e financia grupos paramilitares no Oriente Médio. A indústria local é ineficiente e o desemprego, altíssimo.


CAOS – NigériA

Exportação de petróleo – 7°

IDH – 142°

Índice de democracia – 124°

O petróleo alimenta sangrentas disputas religiosas e étnicas e beneficia grupos ligados ao governo, mergulhado em corrupção. Aliados têm apoio para explorar jazidas sem investir em estrutura. O resultado é que, nos últimos 50 anos, já vazaram mais de 546 milhões de litros de petróleo por falta de estrutura ou por sabotagem política.


Onde vão surgir empregos?


INDÚSTRIA QUÍMICA (Nordeste e RJ)

O setor negocia ficar com 4% de todo o petróleo do pré-sal. Com matéria-prima barata e US$ 167 bilhões previstos em investimentos, a indústria química ficaria bem mais competitiva internacionalmente. E a presença de refinarias no Nordeste podem tornar a região um novo polo industrial.

ESTALEIROS (PE, CE, AL, BA, RJ, RS)
Em 2010 a indústria naval brasileira lançou ao mar o primeiro navio nacional em 13 anos. E a coisa vai estourar: por enquanto a Petrobras já encomendou 146 embarcações, com exigência de pelo menos 80% de conteúdo nacional – a US$ 5 bilhões. Isso sem contar plataformas – não se sabe quantas a Petrobras encomendará.

OUTRAS INDÚSTRIAS
A exploração do pré-sal tem trazido encomendas de equipamentos como helicópteros, submarinos, robôs, tudo mais ou menos made in Brazil, na marra. Isso pode trazer para cá centros de pesquisas tecnológicas de empresas estrangeiras – como a GE, que deve fazer no Rio seu 5º centro de pesquisas mundial, por US$ 150 milhões. Ele deve ter 300 funcionários, a maioria doutores.

EDUCAÇÃO, A VENCEDORA
Até 2012 a Petrobras quer contratar 207 mil profissionais. Para dar conta desse tsunami petroleiro, cerca de 100 novos cursos superiores voltados ao petróleo já pipocaram nos últimos dois anos, a maioria para tecnólogos. Mas o que mais falta é engenheiro: o déficit em 2012 será de 150 mil profissionais. Ainda assim, apenas 1 em cada 800 vestibulandos escolheram engenharia. E você? Vai perder essa?

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