Eduardo Szklarz
Erro – Interpretar textos sagrados ao pé da letra.
Quem – Fanáticos de todas as religiões.
Quando – Últimos 3 mil anos.
Consequências – Discriminação, intolerância e violência que, muitas vezes, assumem a forma de atentado terrorista.
Todos os dias, ao despertar, muitos judeus agradecem a Deus por terem nascido homens: “Bendito sejas Tu, Eterno nosso Deus, Rei do Universo, que não me fizeste mulher” (Bênçãos Matinais). Alguns cristãos, por sua vez, rezam um trecho do Novo Testamento que acusa os judeus de serem filhos de Satanás: “Vós tendes por pai ao Diabo, e quereis satisfazer os desejos de vosso pai” (João 8:44). Já os muçulmanos encontram no Alcorão um convite à guerra feito por Alá: “Eu instilarei terror nos corações dos infiéis; golpeai-os acima do pescoço e arrancai as pontas de seus dedos” (Alcorão 8:12). Tudo bem quando a leitura desses trechos é feita do jeito certo – levando-se em consideração, ao interpretá-los, o contexto histórico em que foram escritos. O problema é que muitos fiéis fazem uma interpretação ao pé da letra. E transformam-se, assim, em fanáticos fundamentalistas – semeadores da discriminação, da intolerância e da violência.
Se levar em conta o contexto histórico, o judeu que agradece não ter nascido mulher saberá que, apesar do que diz a oração, as mulheres judias eram admiradas nos tempos bíblicos. Mas que a conquista da Judeia pelos gregos, no século 4 a.C., relegou-as a um espaço secundário. É por isso que esse trecho da bênção, escrita no auge do domínio grego, parece ser tão machista. Já o cristão bem-informado saberá que, ao classificar os judeus como “filhos do Diabo”, esse fragmento do Evangelho de João apenas reflete o clima de competição que havia entre cristianismo e judaísmo durante o domínio romano, no século 1. Por fim, o muçulmano esclarecido entenderá que, ao encontrar no Alcorão aquela incitação à violência, está diante tão somente de uma referência a uma batalha travada no século 7, quando seguidores de islã foram atacados por pagãos.
Alegorias e parábolas
Para o irlandês John Dominique Crossan, uma das maiores autoridades do mundo em estudos bíblicos, não faz sentido levar a ferro e fogo os livros sagrados porque, além de refletir contextos muito antigos, eles estão cheios de alegorias. “Os textos sobre os primeiros anos de Jesus contidos no Novo Testamento, por exemplo, são parábolas, não têm nada de história. Mesmo assim, muitos insistem em tratar cada frase como uma verdade histórica”.