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A volta da cultura do “faça você mesmo”

Um retrato dos moderninhos do século 21: para ser cool hoje em dia, é preciso viver como antigamente. Uma das grandes inspirações desse pessoal é a cultura do "do it yourself" (DIY), ou faça você mesmo, que teve origem no pós-guerra dos anos 50.

Por Ana Prado
Atualizado em 19 Maio 2017, 17h39 - Publicado em 12 out 2011, 22h00

O DIY fazia referência a projetos de reparos caseiros que as pessoas faziam sozinhas, usando os materiais que tinham à sua disposição. Nas décadas seguintes ao seu surgimento, o movimento começou a ser mais associado à cultura punk e alternativa e à produção musical e midiática independente (discos, rádios piratas e zines, por exemplo). Mas a sua força nos anos 2000 está mesmo é nos aspectos do dia a dia: as pessoas estão cada vez mais fazendo sua própria roupa, cerveja, sapatos e até móveis. A ideia continua a mesma: você pode muito bem construir, modificar ou consertar suas coisas sozinho, sem ter de recorrer à indústria ou a profissionais caros – no máximo, pode contar com a ajuda de um site como o DIY Wiki ou da revista alemã Landlust, publicação que ensina as pessoas não só a fazer seu próprio pão, mas a construir seu próprio fogão. Tudo em uma vibe saudosista que tenta escapar do stress da vida moderna e da escravidão à tecnologia. Essa nostalgia tem feito sucesso: a Landlust, lançada em 2005 por uma pequena editora de comércio agrícola, tem agora uma circulação de 800 mil exemplares. (A Veja, revista de maior circulação no Brasil, cuja população é duas vezes maior do que a alemã, tem tiragem de pouco mais de 1,2 milhão exemplares).

Leia também: O que querem os hipsters?

Para entender melhor o movimento do DIY, a SUPER conversou com um especialista no assunto: George McKay, professor de estudos culturais da Universidade de Salford (Inglaterra) e autor do livro “DIY Culture – Party & Protest in Nineties Britain” (Cultura DIY – Festa e protesto na Grã-Bretanha dos anos 90). Ele falou sobre a origem do movimento e sobre as contradições que o acompanham hoje – já que, apesar de ter surgido como uma reação ao consumismo, o DIY virou algo fortemente comercial graças ao status descolado que ganhou.

Como foi a origem do movimento DIY? Quem foram as pessoas que o começaram e qual era a sua filosofia?
Eu acho que voltar ao período de austeridade do pós-guerra na Grã-Bretanha dá uma boa noção da história recente deste país, porque então, na década de 1950, a necessidade, a criatividade, a juventude e as novas músicas estavam começando a se combinar em uma espécie de revolução da juventude. A música skiffle – uma espécie de mix de jazz popular/folk/blues fácil de tocar – foi um exemplo real dos primórdios da cultura musical do DIY, por causa dos instrumentos que as bandas de skiffle tocavam. Eram todos feitos por eles mesmos usando materiais da vida doméstica diária. A tábua de lavar e alguns dedais foram usados para percussão, uma caixa grande de madeira fina e um cabo de vassoura faziam um contrabaixo. Então você só precisava de uma guitarra barata, um par de acordes e muita atitude, e tinha um tipo de banda rock’n’roll caseira!

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Como aparece uma consciência mais reflexiva à medida que o movimento se desenvolve ao longo das décadas a partir dos anos 1950, as gerações posteriores muitas vezes, clamaram por uma filosofia mais política, que normalmente se associa a algumas vertentes do pensamento anarquista, com o anti-mercantilismo, a ajuda mútua, o esforço coletivo e práticas sociais alternativas.

Esse movimento está se popularizando em muitos lugares, inclusive no Brasil. Por que as pessoas estão se interessando mais por isso agora?
Isso tem a ver, em parte, com uma reação contra a cultura de massa, a mídia do espetáculo e das celebridades e a disseminação do consumo tecnológico – mesmo que tenhamos de admitir que os defensores do DIY também usam esses mesmos meios para se comunicar e organizar sua cultura.

Quais são as principais diferenças entre DIY de hoje e do passado? A filosofia continua a mesma?
Alguns aspectos da antiga contracultura podem ser vistos no contexto do DIY, como as ocupações de espaços abandonados e festivais abertos. Havia um esforço impressionante para a construção de formas alternativas de viver em um prazo mais longo. Mas é possível que nem todos estes tipos de espaços estejam disponíveis hoje.

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Você vê algum tipo de nostalgia nessa tendência atual?
Bem, sim, mas também gosto de idéia de que isso possa ser uma “nostalgia crítica”, o que nos permite considerar a retrospecção da nostalgia não (apenas) como algo indulgente, mas também como algo potencialmente historicizante. Dessa forma, novas gerações podem ser capazes de aproveitar as experiências dos mais velhos, e as gerações mais velhas podem se inspirar com a energia e justiça da juventude de hoje. O ideal é que estejamos abertos e dispostos a sair de nossa zona de conforto.

Existe alguma relação entre a cultura do DIY atual e um retorno da cultura hippie ou naturalismo?
Isso depende. Se hoje o DIY é uma espécie de versão consumista da visão que se tem sobre os anos 1960 ou 1970, então ela não deve ser de muita utilidade. Se as gerações mais novas são capazes de recorrer a aspectos mais radicais dessas décadas, abordando ao mesmo tempo as suas próprias questões urgentes com criatividade e energia, bem, isso seria bom para eles e para nós.

Podemos ver que os chamados “hipsters” de hoje têm uma queda por fazer suas próprias coisas ou por ter objetos que parecem terem sido feitos em casa. Por que você acha que isso está acontecendo?
Você não tem que ser um situacionista para reconhecer que a mercantilização da rebeldia e atitude vende (mas ajuda?). É o que a banda punk inglesa The Clash cantou, em 1977: “Huh, you think it’s funny / turning rebellion into Money” (“Huh, você acha que é engraçado / transformar rebeldia em dinheiro”). A estética DIY é atraente e reconhecidamente ‘cool’ e isso pode fazer com que seja também rentável, mesmo que seja uma contradição porque o DIY tinha a ver com a cooperação e não a exploração ou a cultura de lucro. Eu estou trabalhando na política de jardins e jardinagem no momento, que pelo menos tem a vantagem de não ser ‘cool’.

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