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Os céus estrelados de Van Gogh

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h54 - Publicado em 31 jul 1988, 22h00

Ronaldo Rogério de Freitas Mourão

Nenhum pintor sentiu melhor a força da música cromática da noite que o atormentado holandês Vincent van Gogh. Após exprimir a vida miserável dos camponeses e da gente humilde, em sua alucinação expressionista Van Gogh descobriu, no período de Arles (fevereiro de 1888 – maio de 1889), sob a influência dos dias iluminados pelo sol do Midi francês, o impacto das cores vivas da primavera que o conduziram a um novo cromatismo, bem como a uma nova visão fulgurante de um Universo profundo, ilimitado e infinito. Com estas descobertas, uma notável irradiação surgiu em suas telas, o que lhe permitiria ultrapassar o Impressionismo para atingir uma arte exaltada e violentamente expressionista.

E nesse momento que o seu interesse, ou melhor, a sua sensibilidade de gênio o conduz ao Cosmo, ao Sol, às estrelas e aos planetas. Seduzido pela luz artificial, em Café noturno (setembro de 1888 – Arles), e pela miragem das noites, em Café de calçada à noite (outono de 1888 – Arles), ou pelas cintilações e reflexos das estrelas nas águas, em Noite estrelada (1889 – St. Rémy), Van Gogh procurou exprimir as noites cheias de estrelas em uma nova realidade luminosa e cromática até então desconhecida dos artistas.

Van Gogh confessaria a seu irmão, Theo, que experimentava uma terrível necessidade de sair à noite para pintar as estrelas. Movido por este impulso, Van Gogh instalou-se às margens do Ródano, de início colando velas nas abas do seu chapéu, depois sob um lampião de gás, para alumiar a palheta e a tela. Deste modo, Van Gogh pintou as estrelas em telas que, finalmente em setembro, seriam enviadas a Theo, com a observação de que a Noite estrelada era uma de suas obras mais calmas. Do ponto de vista artístico, Van Gogh encontrou em Arles, na Provença, uma nova harmonia na expressão da noite que não só seria o símbolo da vida, mas também o símbolo da morte. Depois de uma crise nervosa, na véspera do Natal, após violenta discussão com Gauguin, Van Gogh cortou a própria orelha. Logo em seguida, o pintor das estrelas solicitou ao irmão ser internado no asilo de Saint-Rémy. No período de Saint-Rémy (maio de 1889 – março de 1890), as estrelas continuariam dominando as suas telas, agora associadas aos ciprestes, que parecem ascender ao céu como flamas verdes imensas. É desse período uma série de novos estudos do céu estrelado: Noite estrelada (junho de 1889 – Museu de Arte Moderna de Nova York); Os ciprestes (também de junho de 1889 – Metropolitan Museum de Nova York); Passeio ao crepúsculo ou Casal ao luar (outubro de 1889 – Museu de Arte de São Paulo).

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Dos seus quadros sobre o céu noturno, o mais notável é O caminho dos ciprestes (maio de 1890 – Museu Krõller – MüIler, Otterlo, Holanda), pintado em Auverssur-Oise, que Van Gogh descreveu em carta a Gauguin, de 17 de junho de 1890: “Um céu noturno com uma lua sem brilho, só o delgado crescente emergindo da sombra opaca projetada da Terra, uma estrela com um brilho exagerado, se você quiser, brilho suave de rosa e verde no céu ultramar onde passam as nuvens(…) Muito romântico, se lhe parece, mas também acho provençal…”

Nessa tela, a “estrela com brilho exagerado” é Vênus, que esteve em conjunção com a Lua em 19 de junho de 1890. Convém lembrar que, na época, Vênus Estrela da Tarde apresentava-se como um astro de visibilidade vespertina, na constelação de Câncer, quando também atingiu a maior latitude heliocêntrica norte. Por outro lado, o fenômeno que Van Gogh descreveu como “sombra opaca projetada da Terra” da qual emerge o fino crescente lunar é o conhecido fenômeno da luz cinzenta, tão comum logo que tem início a Lua nova. De fato, o crescente muito delgado – pouco luminoso – permite que se observe melhor a tênue luz cinzenta, ou seja, a luminosidade proveniente da Terra que a superfície lunar reflete. Assim, apesar da exaltação de cores, Van Gogh era um artista que não desprezava os modelos nem a realidade dos fenômenos. Ele soube, como ninguém, ouvir a sinfonia cromática do céu.

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