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O filósofo americano Daniel Dennett diz que a crença em Deus já não tem funções positivas. Hoje, ela é só um obstáculo ao desenvolvimento

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h36 - Publicado em 18 fev 2011, 22h00

Reportagem Rui Dantas

Para o filósofo americano Daniel Dennett, ateu e evolucionista radical, acreditar em um ser superior é mais do que simples perda de tempo: pode ser uma tremenda irresponsabilidade. Em nome deste ou daquele deus, argumenta o filósofo, muita coisa errada acontece no mundo todos os dias – da proibição do uso de preservativos à violação dos direitos humanos. Por que, então, tantas pessoas acreditam? Segundo Dennett, por ignorância. E porque, pela falta de informação científica, elas encontram na fé o caminho mais curto (ou mais fácil) para driblar o sofrimento pessoal.

Formado em Harvard e doutorado em Oxford, o filósofo hoje é codiretor do Centro de Estudos Cognitivos da Universidade Tufts, nos EUA. Escreveu, entre outros, os livros A Perigosa Ideia de Darwin (Editora Rocco) e Quebrando o Encanto (Editora Globo), em que discute o choque entre ciência e religião. Dennett acredita que, diferentemente de outros tempos, quando foi fundamental para que os homens atingissem coesão social e pudessem dar sentido à própria existência, a crença em Deus perdeu suas funções positivas. Hoje, ela representaria apenas uma barreira para o desenvolvimento humano. Por e-mail, ele respondeu às seguintes perguntas:

Deus existe? Qual é a prova mais contundente de que Ele existe ou não?
Deus significa tantas coisas que essa pergunta é impossível de ser respondida. Para alguns, Ele é apenas um nome para a beleza do Universo, e não tem nada a ver com forças sobrenaturais. Esse Deus, obviamente, existe. O que não existe é um agente sobrenatural que responde às nossas preces ou supervisiona e guia a evolução das coisas. A humanidade acredita em Deus há milhares de anos. Só que, agora, já sabemos por quê. Até aqui, foi natural para o homem acreditar em algo divino, uma espécie de infância da evolução humana. Mas nós nos tornamos maiores do que Deus.

A Teoria da Evolução é uma prova da inexistência de Deus?
Antes da Teoria da Evolução, era compreensível atribuir a Deus a existência de um design inteligente na natureza. Depois dela, tudo mudou. Hoje, podemos provar como surgiram formas de vida tão variadas e complexas. A teoria de Darwin é uma explicação muito melhor para isso do que Deus. Não precisamos mais nos render à tentação de acreditar em um ser superior que criou tudo. Agora essa ideia parece incoerente.

Apesar da ciência, ainda é possível acreditar no sopro divino – o momento em que o Criador deu vida até ao mais insignificante dos micro-organismos?
É claro que é possível, assim como se pode acreditar que um super-homem veio para a Terra há cerca de 530 milhões de anos e ajustou o DNA da fauna cambriana, provocando a famosa explosão de vida daquele período. Mas não há razão para crer em fantasias desse tipo.

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Deus é a explicação mais fácil para o que o homem não consegue compreender?
É a explicação mais fácil até que se conheçam as respostas da ciência. Depois que você se informa, a hipótese de Deus torna-se incrivelmente improvável.

Acreditar em Deus é bom ou ruim para a humanidade? Por que tanta gente acredita? E qual é o futuro da crença?
Se tivermos sorte, a crença em Deus vai desaparecer aos poucos, mas provavelmente nunca vai acabar. Muitas pessoas que dizem acreditar não têm qualquer compromisso com este ou aquele Deus, elas apenas acham que acreditar é bom. Trata-se daquilo que chamo de “crença na crença”. Mas acreditar é ruim, porque atravanca a evolução humana. Quando a maioria entender isso, a ideia de Deus tenderá a se extinguir.

Como seria a humanidade se a crença em Deus simplesmente não existisse?
Mais feliz, menos torturada pela culpa.

O senhor admite a hipótese de estar errado em suas convicções?
Já admiti essa possibilidade, é claro, como todo mundo. Passei anos e anos analisando cuidadosamente essa questão da fé. Mas acabava chegando sempre à mesma conclusão: Deus não existe.

As religiões mudaram bastante nos últimos 100 ou 200 anos. Por quê?
Como a humanidade aprendeu muito sobre tudo, e superou a xenofobia em certo grau, nos tornamos capazes de refletir sobre nossas tradições e de identificar nelas os “defeitos” que precisam ser reparados. Assim, universalmente, a humanidade foi mudando seus conceitos. O Velho Testamento, por exemplo, aceita o trabalho escravo, o infanticídio, o marido que bate na esposa, a punição com a pena de morte. Hoje, sabemos mais sobre o mundo e sobre nós mesmos.

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Por que as pessoas recorrem a Deus nos momentos de dificuldade, mesmo aquelas que não demonstram qualquer religiosidade no dia-a-dia?
Por que elas simplesmente perdem a razão. Quando sofrem, as pessoas acabam se apegando a fantasias. Não defendo perturbar a paz de quem acredita ou roubar desse indivíduo o alívio que a crença em Deus possa representar para seus sofrimentos. A não ser que essa crença conduza a algum tipo de ação imoral. Levar pessoas de bem a fazer coisas ruins é uma especialidade das religiões.

Daniel Dennett

• Tem 67 anos. Nasceu em Boston, nos EUA, mas passou boa parte da infância em Beirute, no Líbano – onde o pai trabalhou como espião, durante a 2ª Guerra Mundial.

• É especialista em dois ramos complicados do conhecimento filosófico: a filosofia da mente (relacionada às ciências cognitivas) e a biofilosofia (ligada à biologia evolutiva).

• Membro da Academia Americana de Artes e Ciências desde 1987, encabeça o “ranking” dos críticos ferozes à crença em Deus – ao lado de Richard Dawkins e Steven Pinker.

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