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Cesare Mansuetto Giulio Lattes: o gênio brasileiro

Há exatamente 50 anos, em maio de 1947, o anúncio de uma nova partícula achada no núcleo do átomo, o méson-pi, projetou no mundo o nome do pesquisador. Virou um mito. Hoje, com 72 anos e já aposentado, ainda é referência obrigatória para a Física Nuclear.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h15 - Publicado em 30 abr 1997, 22h00

Cássio Leite Vieira, de Londres, e Antônio Augusto Passos Videira

A edição de 24 maio de 1947 da revista inglesa Nature trouxe um artigo que transformaria um brasileiro num dos mais notáveis físicos do mundo. A mais importante revista de ciência do mundo anunciava para os seus leitores que acabava de ser encontrada uma partícula decisiva na história do átomo. E, por trás dessa descoberta, estava ele, César Lattes. Trabalhando na Inglaterra, sob a orientação do inglês Cecil Frank Powell (1903-1969), Lattes ajudou a achar, no interior do núcleo atômico, a partícula que depois seria chamada de méson-pi (pi é a letra grega š). Ela já estava prevista em teoria mas, sem encontrá-la de fato, seria impossível comprovar as equações que calculavam a energia do coração dos átomos. Por ter criado essa equação, o japonês Hideki Yukawa (1907-1981) ganhou o prêmio Nobel em 1949. Em 1950, foi a vez de Powell receber a homenagem máxima da ciência.

Lattes, então um jovem de 21 anos, bem que merecia estar entre os premiados, pois teve participação decisiva no achado. Mas, se não conquistou a láurea, certamente conquistou seu lugar na história. Hoje, é o único físico brasileiro a aparecer na Enciclopédia Britânica. Entre nós, divide com o pernambucano Mário Schenberg (1916-1990) o posto de gênio maior desse ramo da ciência. Ele não é elogiado apenas pelas descobertas, mas também pelo esforço que sempre dedicou à formação de novos pesquisadores. São mais do que justas, portanto, as homenagens que tem recebido em toda parte.

Talvez o mais impressionante do trabalho de Lattes seja o fato de que suas experiências, apesar de realizadas há tantos anos, ainda não perderam sua influência na Física contemporânea. Como você vai ler nesta reportagem, elas continuam sendo fontes importantes de dados por meio dos quais os cientistas de hoje esperam desvendar os enigmas que o núcleo atômico ainda esconde.

* Professor do Departamento de Filosofia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e Departamento de Astrofísica do Observatório Nacional / CNPq

No porão, só uma tábua para deitar

Apenas seis meses após o fim da Segunda Guerra, o mundo em escombros, o cientista enfrentou 40 dias de viagem a bordo de um cargueiro para ir pesquisar na Inglaterra. Logo em seguida iria mudar os destinos da Física.

Porto do Rio de Janeiro, fevereiro de 1946. O Santo Rosário, que foi o primeiro cargueiro a transportar passageiros para a Europa depois da II Guerra Mundial, apita e inicia a viagem. A bordo, no porão, vai o jovem físico brasileiro Cesar Lattes, com 21 anos. Seu destino: a Universidade de Bristol, na região oeste da Inglaterra.

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Foram 40 dias cruzando o Atlântico. Lattes dormia numa tábua em lugar de cama, e para seu desgosto a cerveja acabou na primeira semana. Como se não bastasse o desconforto, ele chegou ao porto inglês de Liverpool, com pouco dinheiro no bolso. Em valores de hoje, menos de 2 reais. Uma miséria, mesmo naquele tempo. Já em Bristol, Lattes se juntou à equipe chefiada pelo físico Cecil Frank Powell (1903-1969). Lá também o esperava o italiano Giuseppe Occhialini (1907-1993), que era seu ex-professor no Brasil e havia tomado a iniciativa de levá-lo a Bristol.

Até a chegada de Lattes, Powell e Occhialini faziam experiências de Física nuclear do tipo convencional. Utilizavam os chamados aceleradores de partículas, nos quais os prótons e os elétrons eram forçados a colidir em alta velocidade. Com isso, os projéteis se desintegravam e podiam se transformar em novas partículas, até então nunca vistas. O objetivo dos físicos era registrar as imagens da trombada numa chapa fotográfica, na esperança de encontrar um estilhaço desconhecido.

Poeira do espaço

Mas Lattes acreditava que, em vez de aceleradores, era possível aproveitar os raios cósmicos, que são poeira subatômica natural, vinda do espaço. A vantagem era que os raios, voando com velocidade próxima à da luz, continham muito mais energia do que os projéteis acelerados artificialmente. E isso era uma grande vantagem porque quanto maior a energia, maior a possibilidade de se achar um fragmento ainda ignorado entre os escombros nucleares.

Assim, o brasileiro convenceu a equipe inglesa a experimentar essa nova linha de pesquisa. Melhor ainda: ele inventou um meio de aumentar a sensibilidade das chapas fotográficas, cobrindo-as com uma substância chamada bórax. Os livros de história geralmente não mencionam que essa sugestão partiu de Lattes. Mas foi ele quem fez a encomenda de bórax à empresa inglesa Ilford e foi ele quem deu as novas chapas a Giuseppe Occhialini.

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Este último, aproveitando uma viagem que faria para esquiar nos Pirineus suíços, no final de 1946, levou o equipamento para tentar capturar os microgrãos espaciais que chovem sobre a terra (veja no infográfico ao lado). Um mês e meio depois, Occhialini já havia conseguido expor as chapas aos raios cósmicos. De volta a Bristol, ele e Lattes logo perceberam que o bórax realmente produzia imagens mais nítidas. Achar sinais do méson demorou um pouco mais, pois era preciso procurá-las com microscópio. Mas afinal apareceram duas marcas históricas, que representavam a primeira prova experimental de que o méson-pi realmente existia.

Caçada nuclear no topo dos Andes

As experiências mais frutíferas com raios cósmicos iriam acontecer no topo gelado do Monte Chacaltaya, a 5 500 metros de altura, na Bolívia. O gênio brasileiro mais parecia um Indiana Jones da Física.

Logo depois de identificar sinais do méson-pi nas chapas trazidas das montanhas suíças, Lattes começou a voar mais alto. Queria obter mais detalhes sobre o novo fragmento subatômico, e para alcançar esse objetivo precisava subir. Sugeriu, então, instalar chapas fotográficas na ponta do Monte Chacaltaya, na Bolívia, a 5 500 metros de altitude. Era uma altura duas vezes maior que a do Pic du Midi suíço. Mais altitude, menos ar, mais raios cósmicos. Powell concordou.

Com uma condição: Lattes deveria voar pela British Airways, já que o dinheiro era de Sua Majestade, o rei Gustavo Adolfo, da Inglaterra. Lattes preferiu, na última hora, tomar um avião da companhia brasileira Panair. O que foi sua grande sorte: numa escala em Dacar, o avião da British caiu sem deixar sobreviventes. Uma vez na Bolívia, Lattes mergulhou numa aventura digna de um Indiana Jones da Física para subir o Chacaltaya e expor suas chapas numa estação meteorológica improvisada lá no alto. Nada muito refinado: o equipamento básico se limitava a dois cavaletes e uma tábua onde ficavam as chapas. Tudo pronto, bem pintadinho de branco. Restava esperar os resultados.

Como isso demorava, o cientista voou para o Brasil e um mês depois foi buscar seu material. Tentou revelar uma das chapas na Bolívia, mas a água da região não era adequada. Já em Bristol foi tudo perfeito. Após a revelação, a equipe descobriu mais umas 30 imagens consagradoras do méson-pi. Não podia mais haver dúvida.

Quem mais ganhou com isso foi o japonês Hideki Yukawa (1907-1981), que doze anos antes, em 1935, havia esboçado uma espécie de retrato teórico do méson-pi. O que o levou a prever a partícula foi uma dúvida que estava na cabeça de muita gente: por que o núcleo dos átomos não se desmancha? Isso era um problema, na época, pois já era certo que o núcleo atômico está cheio de prótons. E que os prótons, por terem todos a mesma carga elétrica, positiva, tendem a se afastar uns dos outros. Por isso, era estranho que o núcleo não explodisse. Mas o fato é que os prótons ficam bem grudados entre si, e a conclusão de Yukawa não podia ser outra: devia haver alguma força desconhecida, mais intensa que a elétrica, prendendo os prótons uns aos outros.

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A quarta força

Estava claro que essa força, ou interação fundamental, como dizem os físicos, não se confundia com nenhuma das outras três conhecidas. Só para refrescar a memória, são elas: a gravitacional, estudada desde o século XV, que atua sobre os planetas e as estrelas; a eletromagnética, definida no século XIX, que age sobre a carga elétrica de partículas como o próton e o elétron, e, por fim, a força nuclear fraca, descoberta nos anos 30, que obriga essas mesmas partículas a se desintegrar em certas circunstâncias.

Yukawa, então, inventou um meio curioso de provar que a nova interação existia mesmo. Seu raciocínio equivale a fazer a seguinte pergunta: se uma força deve “colar” dois prótons, do que é feita a cola? Para ele, a cola era uma partícula também. Segundo seus cálculos, a hipotética personagem teria um peso 200 vezes maior que o do elétron e dez vezes menor que o do próton.

Em resumo, quem quisesse demonstrar que a nova força existia, bastava procurar a partícula imaginada pelo teórico. Os dados estavam bem à mão, já que, além do peso, Yukawa também havia estimado o tempo de duração do seu méson. Fora do núcleo, ele sobreviveria apenas um milionésimo de segundo; depois se desintegraria. Durante anos, a partir de 1935, diversos pesquisadores acharam fragmentos atômicos que não tinham as características previstas pela teoria. Em vão. Até que em 1947, doze anos depois das investigações de Yukawa, ficou provado que o méson-pi se encaixava com perfeição no figurino teórico. Comprovou-se, assim, a existência da interação que hoje se conhece como força nuclear forte, a quarta força.

Na América, tirou a prova dos nove

Para confirmar no laboratório a existência de sua partícula, Lattes foi para os Estados Unidos. Lá, trabalhando com os instrumentos mais potentes daquele tempo, consolidou a façanha. Nascia uma celebridade.

O brilho de Lattes na caça ao méson-pi teve repercussão imediata nos centros mundiais de pesquisa. Tanto que o dinamarquês Niels Bohr (1885-1962), então o teórico mais festejado do mundo depois de Albert Einstein, convidou o curitibano a fazer palestras na Sociedade de Física da Dinamarca e no Instituto de Física Teórica de Copenhagem. Também o levou para um bate-papo particular em sua casa onde, entre outras coisas, sugeriu que ele fosse para os Estados Unidos.

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Sábio conselho. Na terra de Tio Sam estavam os aceleradores de partículas mais modernos construídos até então. Talvez com eles desse para confirmar mais uma vez a existência do méson-pi, agora dentro de um laboratório e não ao ar livre, com ajuda dos raios cósmicos. Lattes aceitou a sugestão e, lá, junto com o americano Eugene Gardner, começou a calcular a aceleração que as máquinas disponíveis poderiam impor às partículas subatômicas. Resultado: apenas uma semana depois de chegar, os dois se tornariam os primeiros a detectar mésons-pi em aceleradores. O trabalho, publicado na revista americana Science, em março de 1948, repercutiu em seguida em jornais e revistas de vários países. Nos Estados Unidos, saiu na famosa Time-Life.

De volta ao Brasil, Lattes canalizou sua energia para o esforço de dar uma estrutura sólida à ciência nacional. Um de seus primeiros movimentos, aqui, foi juntar-se a José Leite Lopes e a outros físicos para, em 1948, fundar o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, o CBPF, no Rio de Janeiro. Hoje, é um dos mais importantes da América do Sul. Sem prejuízo de suas próprias pesquisas, o gênio brasileiro foi diretor e professor titular no CBPF e catedrático de Física Nuclear na Faculdade Nacional de Filosofia, da Universidade do Brasil, no Rio de Janeiro.

Também participou da criação do Conselho Nacional de Pesquisas, que atualmente é a instituição central da investigação científica brasileira, com o nome de Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, o CNPq. Fora do país, Lattes atuou na Bolívia, onde ajudou a implantar o Laboratório de Física Cósmica da Universidade de San Andres e nas universidades americanas de Chicago, em 1955 e 1956, e de Minnesota, em 1957.

Fagulhas no ar

Em 1962, ao se tornar mentor do Projeto de Colaboração Brasil-Japão, deu mais um passo decisivo. Graças a isso, voltou a pesquisar na Bolívia, onde acabou descobrindo novidades curiosas sobre os raios cósmicos. Como as “bolas-de-fogo”, fagulhas microscópicas com uma temperatura absurda, de até 10 trilhões de graus Celsius, produzidas quando os raios cósmicos dão trombadas em núcleos atômicos da atmosfera. Vinte anos mais tarde, os físicos ainda analisam essas estranhas esferas detectadas pela equipe de Lattes. Elas são estudadas no acelerador Fermilab, na Universidade de Chicago.

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Essa imensa riqueza de dados é o grande legado que a Física deste século deve a Lattes. Um cientista bem humorado que já confessou coisas pitorescas. Conta ele que, em sua adolescência, via dois motivos para escolher a carreira que escolheu. O primeiro é que, como professor, teria “três meses de férias por ano”. O segundo motivo é eliminatório: todas as disciplinas, com exceção de Física e Matemática, eram pura “decoreba”. Seja como for, seu pai Giuseppe o levou a sério.

Giuseppe era gerente do Banco Francês-Italiano em São Paulo, e tinha como cliente um físico importante, o ítalo-russo Gleb Wataghin, desde alguns anos trabalhando na Universidade de São Paulo. O cientista, assim que pôde avaliar as aptidões do candidato, aceitou-o imediatamente como aluno. Com 19 anos, Lattes estava formado. Wataghin o convenceu de que, além de dar aulas, era essencial fazer pesquisa. Estava prestando um grande serviço à Física. Seu pupilo prestaria depois outros serviços, ainda maiores. Em poucos anos, alcançaria o brilho de uma estrela de primeira grandeza.

“Eu fui empurrado pela História”

Numa entrevista exclusiva à SUPER, Lattes fala sobre a Física de ontem e de hoje, revela seus gostos pessoais e conta que continua trabalhando. Modesto, acha que apenas aproveitou as chances: “Fiz o que foi possível”.

Às vésperas de completar 73 anos, Lattes passa os dias com a tranqüilidade que tanto estima, saindo pouco de sua casa em Barão Geraldo, um bairro próximo da Universidade Estadual de Campinas, pela qual se aposentou há dez anos. Pai de quatro filhas, que lhe deram nove netos, aprecia mesmo o sossego de sua casa. Não gosta de dar entrevistas. Excepcionalmente, conversou com a SUPER. Nela, o cientista conta que ainda está na ativa, usando seu amplo conhecimento sobre os átomos para calcular a idade de minerais. Diz também que, apesar de quase não freqüentar a universidade não deixa de prestar atenção às novidades de sua área, aparecendo vez por outra em palestras e debates que mais o interessam. Com certa dose de ironia, acha que hoje já não têm aparecido físicos como os da década de 50. “Não sei o que acontece. Talvez seja o ambiente.” No final, revela um espírito cuidadoso na orientação do seu trabalho, explicando que a diferença entre sabedoria e ciência, na sua opinião, é que a primeira “não entra na alma malvada”, mas a segunda, sim.

Como o senhor acha que a Física mudou nestes 50 anos?

Hoje, a pesquisa é feita com máquinas gigantescas, que custam bilhões de dólares. Com grupos formados por centenas de pesquisadores. Em geral, se está correndo atrás do que a teoria diz. Os modelos teóricos de hoje prevêem uma imensidão de partículas, algumas que nunca são observadas diretamente. Então é preciso sempre estar ajustando os dados experimentais à teoria. Certo estava o James Maxwell (físico inglês, 1831-1879), diretor do Laboratório Cavendish. Ele dizia que o cientista deve se guiar pelos dados empíricos.

A Física de cinqüenta anos atrás era mais romântica?

Era. Não havia tanta competição. Não era necessário tanto dinheiro e, o mais importante, as pessoas se ajudavam mais.

Se o senhor não fosse físico, o que gostaria de ser?

Se eu tivesse que escolher, hoje optaria por ser veterinário. Eu gosto de animais. Ao entrar para o curso de física, eu queria ser professor de Matemática e Física, matérias que eu não precisava estudar. Mas o Wataghin (ex-professor de Lattes) me convenceu a ser pesquisador.

Como o senhor vê a Física brasileira hoje?

Eu me aposentei há dez anos e não vou muito à universidade. Só assisto, de vez em quando, algumas palestras que me interessam. Não tenho ido aos encontros da Sociedade Brasileira de Física. Mas físicos como os da década de 50, como o José Leite Lopes, o Marcelo Damy, o Abraão de Morais, o José Tyomno, entre outros, não têm mais aparecido. Não sei o que acontece. Talvez seja o ambiente.

Qual foi o momento mais emocionante da sua carreira? Foi em Bristol, na Inglaterra, ao achar o méson-pi nos riscos deixados pelos raios cósmicos em chapas fotográficas?

A descoberta do méson-pi foi vagorosa, trabalhosa. Primeiro encontramos poucos indícios, depois a quantidade foi crescendo. E eu tive que contar todos aqueles garrotilhos das chapas para fazer os cálculos… O momento mais emocionante foi a detecção artificial dos mésons em Berkeley, Estados Unidos. Uma semana depois da minha chegada, conseguimos detectá-los. Foi um grande evento. Foi capa da revista Science News e saiu também nas páginas internas da Time-Life, pelo que me lembro.

Se o senhor tivesse a chance de mudar alguma coisa em sua carreira, o que o senhor mudaria?

Não mudaria nada. Fui empurrado pela história e fiz o possível.

Como é o seu dia-a-dia?

Gosto de escutar música, andar e viajar para o Rio de Janeiro. Gosto também de ler. Gosto de música folclórica, clássica, erudita, mas não gostei da bossa-nova. Gosto muito do Gilberto Gil e do Roberto Carlos. Meu compositor clássico favorito é Vivaldi. Gosto de ler livros de História, a história real, de geografia e de romances. Gosto especialmente do João Ubaldo Ribeiro. Viva o Povo Brasileiro é muito bom.

Quais os cientistas que o senhor mais gosta?

Gosto de Niels Bohr. Ele foi o último filósofo natural. Não colocava as coisas do tipo preto no branco. Ele era mais amplo, escreveu sobre coisas como livre arbítrio, por exemplo. E, por suas contribuições teóricas, também admiro Dirac (Paul Adrien Dirac, físico inglês, 1902-1984).

Que conselhos o senhor daria para um jovem físico começando a carreira?

Cuidado com o que está na moda. Ele deve lembrar que a parte empírica e o que fica na ciência. E gostaria de dar um conselho que não é meu, mas de Wataghin: qualquer dúvida vá a biblioteca e consulte os artigos originais. Se não for suficiente, procure os colegas mais experientes. Se nada disso resolver, meta as caras.

O senhor tem alguma filosofia pessoal que o teria orientado ao longo da existência?

Sou um otimista. E aprecio a natureza. Gosto de uma frase que diz: “ciência sem consciência é a ruína da alma”. Tem um outra, que é de Salomão: “não busque ser sábio demais nem justo demais. Você quer se arruinar?”

Mais alguma frase que o senhor gostaria de citar?

Outra do Salomão: “A sabedoria não entra de modo algum na alma malvada”. E aí está a diferença entre sabedoria e ciência. A sabedoria não entra, mas a ciência, sim.

Para saber mais

Dos Raios X aos Quarks, Emílio Segrè, Editora Universidade de Brasília, Brasília, 1980

Sonhos de uma Teoria Final, Steven Weinberg, Editora Rocco, Rio de Janeiro, 1996

Chuveiro de raios da Galáxia

Raios cósmicos são grãos subatômicas que bombardeiam a Terra a alta velocidade.

1 – … e têm chance de colidir com um átomo presente nas chapas fotográficas.

2 – Aí, o raio pode atingir um dos prótons no núcleo do átomo.

3 – O núcleo se estilhaça e o próton se desintegra. Vira outra partícula.

4 – Uma sobra da desintegração pode ser um méson-mi, que em fração de segundo se transforma n o méson-pi

Aos 20 anos já tinha pesquisas publicadas

Terra natal

Nasce em 11 de julho de 1924, em Curitiba. Começa os estudos no Instituto Menegati, de Porto Alegre, e termina no Colégio Dante Alighieri, de São Paulo

Precocidade

Aos 19 anos, obtém a graduação pelo recém-criado Departamento de Física da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo

Mãos à obra

Inicia pesquisas com os físicos Gleb Wataghin (1899-1986) e Mário Schenberg (1916-1990). Antes de ir para Bristol, publica três trabalhos no Brasil.

Foi aqui que tudo aconteceu

Prédio Royal Fort, em Bristol, onde a partícula méson-pi foi identificada. As pesquisas eram realizadas no quarto andar, no Laboratório

H. H. Wills

Equipes de microscopistas que em Bristol procuravam nas chapas fotográficas os traços deixados por raios cósmicos.

Um dia, encontraram o que queriam.

Preocupação de formar novos cientistas

Tempo de amar

Assim que sai de Bristol e volta ao Brasil, no final de 1947, Lattes casa com a matemática Martha Siqueira Neto, sua ex-aluna na Universidade de São Paulo.

Pico da fama

Junto com o físico Eugene Gardner identifica o primeiro méson no laboratório, nos chamados aceleradores de partículas. É 1948.

A celebridade chega ao auge.

Força ao ensino

Ainda em 1948 participa do esforço para fundar o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, no Rio de Janeiro, hoje um dos mais importantes da América do Sul.

Um bar e seus clientes mais ilustres

Neste bar, o Robin Hood, os físicos bebiam o último copo de cerveja antes de retomar o trabalho à noite. Aí, eram bem recebidos mesmo faltando 5 minutos para fechar.

Cecil Powell (no círculo), era o chefe desses clientes ilustres. Nesta foto, da época, está com 44 anos, feliz com sua maior descoberta. Comemorou-a com cerveja.

O gênio atravessa as décadas

Nasce o CNPQ

No final dos anos 40, ajuda a criar o Conselho Nacional de Pesquisas, hoje Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico, o CNPq.

América

Entre 1955 e 1957, o curitibano ensinou e pesquisou nas universidades americanas de Chicago e Minnesota. Nos EUA, é estudado até hoje.

Fogo no céu

Nos anos 60, descobre na Bolívia as “bolas-de-fogo”, chamas microscópicas nos raios cósmicos que atingem trilhões de graus Celsius.

Surpresa no arquivo da Inglaterra

Este caderno é um documento histórico. Pertenceu a Lattes e suas páginas estão cobertas de anotações sobre o méson-pi, feitas em 1947. O caderno estava esquecido nos arquivos do antigo Laboratório H. H. Willis, em Bristol, Inglaterra. Encontrá-lo este ano foi uma surpresa. Um brinde inesperado ao cuidadoso trabalho de investigação feito pelo colaborador Cássio Leite Vieira, a quem a SUPER encomendou esta reportagem.

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