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Animais:gente como a gente

A ciência está descobrindo que os animais têm capacidades mentais espantosas. Eles são muito mais parecidos conosco do que gostaríamos de admitir.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h36 - Publicado em 30 jun 2006, 22h00

Tiago Cordeiro

“Por fim, Deus disse: ‘Façamos o homem à nossa imagem e semelhança. Domine ele os peixes do mar, as aves do céu, os animais domésticos, todos os animais selvagens e os répteis que rastejam sobre a terra’.” Está na Bíblia e faz parte da cultura ocidental. Há séculos estamos acostumados a pensar em nós mesmos como seres superiores, criados de acordo com um padrão divino. Animais eram os outros, nós nunca. No século 19, Charles Darwin e a genética nos ensinaram que não é bem assim. O naturalista britânico causa polêmica até hoje com a idéia de que somos apenas o resultado da evolução de outros bichos. Ele é amparado pelas análises de DNA. O código genético humano é tão parecido com o do chimpanzé, que uma equipe de cientistas americanos defende que esses macacos deveriam ser incluídos no gênero homo. Agora a ciência está derrubando, com uma velocidade espantosa, o último refúgio onde ainda nos sentíamos seguros: a mente. Estamos descobrindo que, em termos de inteligência, cognição e psicologia, não somos tão especiais.

Os bichos não são assim tão diferentes de nós. Sabemos agora que os peixes, as aves, os animais domésticos, todos os animais selvagens e os répteis que rastejam sobre a terra têm memória, personalidade e linguagem. As formas de comunicação dos golfinhos são tão desenvolvidas, que se suspeita que eles tenham nome próprio – e, por definição, um ser capaz de dar nome a si e a seus semelhantes tem noção de identidade. Os golfinhos também mantêm tradições culturais, desenvolvidas em sociedade e transmitidas através das gerações. Os polvos desenvolvem a atividade repetitiva, e aparentemente inútil, usada por animais de grande inteligência para explorar o mundo e refinar suas habilidades motoras, que nós chamamos de brincar. Os primatas dominam um senso rústico de justiça e sentem ciúmes quando acham que não foram recompensados como deveriam. Também percebem quando outro bicho precisa de ajuda. Mais: um macaco tem consciência de existir. Diante de um espelho, ele percebe que aquela imagem que ele vê não é um outro bicho, mas seu próprio rosto. Um bicho que se reconhece como ser individual e entende que o outro precisa de ajuda não só tem psicologia própria, como está a um passo de entender a psicologia dos outros. O que significa que é provável que os macacos tenham empatia, a capacidade de se colocar no lugar do outro indivíduo e imaginar o que ele está pensando. Para isso, é preciso elaborar a chamada teoria da mente, algo que nós sempre consideramos uma capacidade exclusiva nossa.

Memória das galinhas

Aristóteles define cognição como o processo responsável por armazenar conhecimento, transformá-lo e resgatá-lo sempre que preciso. Nesses termos, galinhas e ovelhas têm cognição, porque memorizam e reconhecem até 100 faces diferentes. Muitos pássaros se lembram de uma foto por anos. Na hora de identificar e diferenciar dois objetos, pombas e humanos usam a mesma estratégia: localizam os componentes principais de cada um e fazem um mapeamento de sua organização espacial. Com a diferença de que os pombos prestam atenção a mais informações ao mesmo tempo, o que permite que eles façam vôos rasantes em busca de um grão minúsculo sem acertar nenhum poste no caminho. Os esquilos associam um cheiro a um animal ou a um alimento. Cada indivíduo emite vários cheiros diferentes, mas o esquilo é capaz de identificar o outro animal a partir de apenas um deles. Mesmo tendo um cérebro do tamanho de uma noz, o papagaio Alex, de 28 anos, que vive em um laboratório em Massachusetts, nos EUA, entende o número zero, um conceito abstrato que as crianças só começam a compreender a partir dos 3 anos. Submetido a testes com cubos coloridos, Alex é capaz de usar a palavra inglesa “none” para indicar que não há na mesa nenhum objeto com determinada cor.

Mas a capacidade cognitiva recém-descoberta nos animais não é tão impressionante, nem tão polêmica, quanto as notícias que nos chegam, quase todos os dias, dos laboratórios de psicologia comparada. Nos últimos anos, pesquisadores de todos os cantos do planeta localizaram traços de personalidade em chimpanzés, ovelhas, porcos-espinhos, cobras-corais, peixinhos de aquário, rinocerontes, lobos, zebras e porcos. Entre as moscas drosófilas, há os machos agressivos e os tímidos. Peixes acostumados a nadar próximos de predadores são menos ariscos ao contato com humanos do que aqueles que nunca se expuseram ao perigo. Ratos riem quando rolam no chão juntos – as risadas são vocalizações ultra-sônicas que evitam que o companheiro interprete mal a brincadeira. Camundongos fazem serenatas para conquistar as fêmeas. Neurologistas da Universidade Washington perceberam que aqueles guinchos que eles soltam são seqüências sonoras complexas, com melodia e refrão.

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Timidez em hipopótamos

A aplicação da palavra personalidade para animais não humanos é recente e provoca resistência. Alguns pesquisadores preferem falar em temperamento. Mas eles estão se tornando uma minoria. “Personalidade é o caráter de um indivíduo, definido a partir da forma como ele é visto pelos outros. Nesse sentido, animais têm personalidade, sim. Eles também oscilam entre dois extremos, a atitude proativa e a reativa”, diz o americano Roland Anderson, biólogo do aquário de Seattle e autor de algumas das mais interessantes pesquisas sobre cetáceos dos últimos anos. Independentemente da terminologia, o fato é que um hipopótamo tímido não se torna agressivo de um dia para outro. “A diferença entre os animais e os homens é apenas de grau, não de gênero. Para nós como para eles, é a personalidade que nos torna previsíveis e, por isso, socialmente confiáveis. A personalidade humana é apenas um pouco mais variada”, argumenta o psicólogo inglês Sam Gosling, professor da Universidade do Texas e fundador do Instituto de Personalidade Animal. Gosling aplicou a 34 hienas um teste muito parecido com o que é usado em humanos. O modelo descritivo mais usado em psicologia define que nós temos diferentes níveis de extroversão, altruísmo, criatividade, abertura a novas experiências e estabilidade emocional. As hienas apresentam 4 desses 5 traços. Os 3 primeiros deles são encontrados nos mamíferos, nos polvos e em alguns peixes. O único fator ausente na grande maioria das espécies é a estabilidade emocional, que no jargão de Freud é mais conhecida como superego, ou a capacidade de seguir normas sociais e controlar impulsos. Mas nem mesmo o superego é exclusivo nosso. Nós compartilhamos essa característica com os outros primatas. “Toda droga usada no tratamento de desordens emocionais e psiquiátricas em humanos foi primeiro desenvolvida e testada em animais. Se os animais não tivessem padrões psicológicos parecidos com os nossos, todas as nossas pesquisas não fariam o menor sentido”, afirma Jaak Panksepp, o neurocientista nascido na Estônia que descobriu que ratos riem.

A depressão também é facilmente encontrável no restante do mundo animal. “A inadequação entre a nossa personalidade e o mundo que nos cerca é que gera frustração. O conflito entre as tendências inatas e o ambiente provoca ansiedade e depressão. Isso acontece entre os animais o tempo todo”, defende o psicobiólogo Vanner Boere Souza, professor da Universidade de Brasília. Elefantes órfãos, que perderam os pais em caçadas, estão atacando vilas na África e na Índia com uma agressividade incomum que um pesquisador credita ao estresse pós-traumático (veja na página 29). Ratinhos de laboratório são vítimas constantes de depressão. Depois de permanecerem trancados por vários dias, eles costumam ficar encolhidos, com os pêlos arrepiados e sem reação a estímulos alimentares e sexuais. Agora pense em um homem com depressão. Ele também fica encolhido, com os cabelos desgrenhados e sem vontade de comer.

Poucos animais são tão estudados quanto os cães. Sabemos agora que eles detêm 5 traços bem marcados de personalidade, sendo que apenas um deles, a tendência à caça, é bem diferente do dos humanos. Os cientistas perceberam ainda que os cães têm uma capacidade extraordinária de acompanhar movimentos rápidos com os olhos. Eles aprendem tanto através do olhar que se tornam capazes de antecipar os movimentos dos seus donos. Se o dono vai na direção de um cão para abraçá-lo ou para brigar, ele percebe antes e antecipa a reação. Provavelmente por causa dos 10 mil anos de convívio, os cachorros são os animais que melhor nos conhecem. Durante os testes em que um homem desconhecido tenta mostrar com os olhos onde está a comida, eles parecem interpretar as situações propostas como formas de comunicação, e não como desafios reais, coisa que só macacos com muito tempo de convívio com humanos fazem. “Se a nossa relação com os cães é tão bem-sucedida, é porque eles nos ‘escolheram’: fizeram as adaptações físicas e emocionais necessárias para conviver pacificamente conosco”, diz o professor Vanner.

Animais pensam?

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Os animais exercem um grande fascínio sobre nós, e os cientistas que se dedicam a eles parecem vibrar com os resultados favoráveis aos bichos. Mas alguns pesquisadores questionam esses trabalhos. Dizem que, na hora de dar aos animais novas características, os colegas procuram as definições mais abrangentes possíveis para termos sempre difíceis de explicar, como personalidade, consciência e cultura. Também alegam que é muito difícil interpretar as reações dos animais sem correr o risco do antropomorfismo – que é o nome dado, nesse caso pejorativamente, à tendência de aplicar características humanas a outros seres. “É certo que os animais são muito mais complexos do que imaginávamos, mas é preciso tomar cuidado quando tentamos compará-los a nós. Jamais saberemos ao certo o que se passa na cabeça de um elefante, simplesmente porque não fazemos idéia de como é ser um”, alega o psicólogo americano Clive Wynne, professor da Universidade da Flórida. A reação desconfiada de parte dos pequisadores tem raiz em René Descartes (1596-1650). Ao definir os seres humanos a partir da fórmula do “penso, logo existo”, o matemático francês relegou o resto dos animais a um segundo plano intelectual. Descartes dizia que a mente dos animais funciona como uma máquina, e que nenhum bicho é capaz de ter sentimentos ou de desenvolver uma teoria da mente. Esse raciocínio está na raiz da psiquiatria freudiana, que desconsidera a base biológica da mente. Sustenta também as pesquisas com animais de grande parte do século 20. Enquanto o behaviorismo de Frederic Skinner (1904-1990) foi dominante, principalmente nas décadas de 1940 e 1950, o comportamento era tido como uma característica externa, provocada pela reação a estímulos. O curioso é que os behavioristas criaram os métodos de avaliar aspectos cognitivos dos animais que são usados até hoje. Tudo o que a nova geração de pesquisadores pró-animais precisou fazer foi aplicar essa metodologia e mudar a filosofia. Esta eles foram buscar em conceitos populares já no fim do século 19, e que tinham sido soterrados pelo próprio behaviorismo.

Na mesma época em que percebíamos, assustados, que não somos nada mais do que macacos que deram certo, uma ciência emergente, dedicada à psicologia humana, falava abertamente em emoções e personalidades distintas em animais. O próprio Darwin publicou, em 1872, o livro A Expressão de Emoções no Homem e nos Animais, em que ele aplicava os conceitos evolucionistas à psicologia. “Qualquer um que já tenha se ocupado de crianças”, ele escreveu, “deve ter percebido com que facilidade elas apelam para as mordidas quando exaltadas. Parece tão instintivo nelas quanto em filhotes de crocodilo, que mal saídos dos ovos já dão dentadas com suas pequenas mandíbulas”. Nessa obra, ele defende sem constrangimento a idéia de que os insetos sentem ciúmes e que o riso e o medo são bem mais antigos, em termos de evolução, do que as lágrimas, e por isso tão poucas espécies choram. “A psicologia só faz sentido no contexto da evolução. As espécies aprimoraram seu comportamento de forma a resistir melhor à seleção natural. Não deveríamos nos surpreender com o fato de que vários traços de personalidade não são exclusivos de seres humanos”, diz Sam Gosling. E, por alguns anos, até que Freud e Skinner dominassem a academia e transformassem o conceito de psicologia animal em algo um tanto ridículo e marginalizado, as pessoas realmente não se surpreenderam com a idéia. Era uma época em que europeus abastados voltavam de viagens à África com chimpanzés na bagagem, para serem criados como bebês crescidos. Em 1908, as livrarias vendiam obras como On the Senses, Instincts, and Intelligenge of Animals With Special Reference to the Insects (“Sobre os Sentidos, os Instintos e a Inteligência dos Animais, com Referência Especial aos Insetos”), de John Lobbocks. Um dos manuais de psicologia mais conhecidos nos EUA, A Handbook of Social Psychology (“Guia de Bolso da Psicologia Social”), dedica um quarto de sua edição de 1935 a descrever o comportamento de animais.

Com seu livro sobre as expressões das emoções nos animais, Darwin fundou a etologia, a ciência que estuda o comportamento animal. Até 1970, os etólogos se dedicaram a estabelecer parâmetros de comparação entre espécies. Nesse ano, o inglês John Crook defendeu que os animais tinham que ser estudados dentro de seu contexto social, uma linha de pensamento que hoje domina a etologia. Foi nessa época também que os estudos com primatas se tornaram importantes e populares. A antropóloga britânica Jane Goodall, hoje com 72 anos, mostrou que os chimpanzés e os bonobos africanos são capazes de usar ferramentas e identificou neles cultura, raciocínio e capacidade de aprendizado – nada mais distante do conceito cartesiano de que eles não passam de máquinas. Foi ela quem criou o hábito, controverso na época e muito comum hoje, de dar nomes, e não números, aos animais pesquisados.

E agora?

Certo, somos todos animais, e muito parecidos. Mas isso significa que nada diferencia você de um rato? Calma, por enquanto ainda sobraram algumas barreiras. Duas, na verdade. Até onde se sabe, só os seres humanos têm a capacidade de pensar no futuro a longo prazo. A outra característica é a mais importante: a linguagem. Os outros animais se comunicam, mas nenhum deles foi capaz de criar sociedades tão complexas como a nossa. “Somos especiais, não há dúvida”, defende César Ades, professor da Universidade de São Paulo e precursor da etologia no Brasil. “Uma simples caderneta de telefone guarda uma complexidade intelectual e social única. Mas a questão é outra. Temos que sair do isolamento cartesiano em que nos colocamos e reconhecer que cada espécie animal tem suas próprias capacidades. Não somos superiores.”

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Se não somos superiores, temos que repensar o jeito de lidar com os outros animais. Já começamos, quando passamos a tomar cuidado na hora de usá-los como cobaias. César Ades se lembra de quando, nos anos 60, seu professor de veterinária abriu um cachorro vivo na sala de aula. Quando o coitado se debateu, mexendo as patas como quem acena, o professor fez piada: “Já vai? É cedo, fique um pouco mais”. Em termos de pesquisas cognitivas, por outro lado, os animais são cada dia mais importantes. “Agora que sabemos o quanto somos parecidos, as outras espécies podem nos ajudar a entender a importância da genética na definição da personalidade e saber até que ponto é possível mudar de comportamento”, defende Sam Gosling. Para chegar a esse ponto, vamos ter que olhar com mais humildade para os nossos colegas do reino animal.

Vôlei aquático

Os polvos são os animais invertebrados mais inteligentes que conhecemos. Eles são hábeis no uso de ferramentas e criativos na solução de problemas. Também têm personalidades bem definidas. “No aquário onde eu trabalho, temos a Emily Dickinson, que fica encolhida no tanque, e a Lucretia McEvil, que puxa para a água quem se aproxima”, diz o biólogo Roland Anderson. Há indícios de que eles também brincam. Ao analisar a reação dos animais diante de uma garrafinha de plástico vazia, Anderson percebeu que eles gostam de usar jatos de água para jogar o objeto para cima continuamente, como se estivessem praticando vôlei. Essas capacidades desafiam a tese de que a inteligência é desenvolvida em sociedade. Afinal, polvos são solitários e só vivem dois anos em média, pouco tempo para acumular experiências.A resposta para a grande inteligência dos polvos pode estar no lugar onde eles se desenvolveram: grandes bancos de corais, cheios de predadores e com várias opções de alimentos. “Os humanos também surgiram em um ambiente perigoso e cheio de possibilidades”, diz Anderson. “Por causa dessa similaridade, a inteligência dos polvos pode nos ajudar a entender a nossa.”

Diferenças sutis

AS 6 BARREIRAS QUE JÁ CAÍRAM…

Memória

Ovelhas e várias espécies de pássaros têm uma ótima memória visual. Entre os esquilos, ela é rapidamente ativada por cheiros. Ratos de laboratório que sentiram náusea por causa de uma mistura de limão e cloreto de lítio passam o resto da vida evitando qualquer coisa que tenha cheiro de limão.

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Personalidade

Parte dos cientistas prefere falar em temperamento. Mas a nomenclatura é o que menos importa. O fato é que indivíduos de dezenas de espécies seguem, cada um, um padrão de comportamento. Um animal agressivo se comporta sempre com agressividade. Portanto, é possível que ele tenha identidade.

Mundo Interior

Assim como os humanos, vários animais nascem com uma tendência de comportamento, que se firma ou muda com o passar do tempo. Quando o ambiente entra em conflito com a personalidade, surge a frustração, que pode provocar ansiedade e depressão. Isso acontece conosco, mas também com várias espécies.

Consciência

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Alguns testes apontam que golfinhos e grandes primatas têm consciência de si mesmos. Baseados nessas pesquisas, pesquisadores defendem que os primatas podem controlar seus impulsos. Há quem vá ainda mais longe e defenda que eles têm capacidade de imaginar o que outro animal está pensando.

Linguagem funcional

Tudo indica que, ao contrário de nós, os animais usam a linguagem de forma apenas funcional, para ajudar na busca por alimento, na reprodução ou na fuga de predadores. Mas as pesquisas mais recentes indicam que esses sistemas de comunicação pode ser bem mais desenvolvidos do que se pensava.

Cultura

Humanos, orangotangos e chimpanzés sustentam tradições culturais, desenvolvidas de acordo com o local e repassadas de geração em geração. Pesquisadores brasileiros desconfiam que esse seja o caso dos macacos-prego. Entre os golfinhos-nariz-de-garrafa, as mães ensinam os filhotes a caçar.

… E DUAS QUE CONTINUAM FIRMES.

Linguagem artística

Até onde sabemos, até hoje nenhum cachorro escreveu uma sinfonia, os orangotangos não conseguem programar um computador e as abelhas são incapazes de fofocar. Além de muito mais rica, a linguagem humana nos ajudou a criar a organização social mais complexa de que se tem notícia.

Visão do futuro

Orangotangos e macacos bonobos – e, desconfia-se, algumas espécies de aves – armazenam alimentos para garantir que eles não faltem no futuro. Mas, até onde as pesquisas alcançam, nem mesmo os grandes primatas pensam no futuro a longo prazo. Só nós temos a capacidade de pensar na nossa própria morte.

Trauma de infância

O vilarejo de Bunyaruguru, em Uganda, sempre conviveu bem com os elefantes. Mas, nos últimos anos, o lugar começou a ser atacado por manadas enfurecidas. Casos parecidos são reportados em toda a África e em algumas regiões da Índia. Ao avaliar o fenômeno, dois grupos independentes de pesquisadores chegaram a conclusões parecidas. Não se trata de busca por alimento. As agressões são uma reação à morte de elefantes adultos. Nos últimos 30 anos, a caçada a elefantes aumentou demais, e os elefantes órfãos cresceram muito mais agressivos do que seus pais. “Esses animais que perderam as mães em caçadas são muito sensíveis e sofrem estresse pós-traumático. Eles formaram gangues de adolescentes delinqüentes”, explica o biólogo norueguês Joyce Poole, que coordenou o estudo na África.

“Somos animais”

Com o livro Libertação Animal, de 1975, o filósofo australiano Peter Singer virou guru dos movimentos mais radicais de defesa dos direitos dos animais. Singer, que está com 59 anos e é professor de bioética em Princeton, falou a SAPIENS:

O que nos diferencia dos animais?

Todos nós somos animais. Podemos usar a linguagem de uma forma que nenhuma outra espécie faz, mas as similaridades entre nós e o resto do mundo animal são muito maiores do que as diferenças. Os grandes primatas são tão parecidos conosco, em termos biológicos e psicológicos, que deveriam ter direito à vida e a não serem agredidos sob nenhum pretexto. Na Espanha, um projeto de lei nesses termos já está tramitando no Congresso.

Nós valemos o mesmo que um rato?

Podemos dominar o planeta, mas nunca deixamos de ser apenas uma espécie coexistindo com outras milhares. Mas isso não significa que a vida de um rato vale tanto quanto a de um homem. O indivíduo mais importante é aquele com maior capacidade de sentir dor e com mais condições de pensar no futuro. Quem pensa na própria morte tem mais a perder.

Não podemos matar os animais?

Podemos, dependendo da situação. Mais importante do que matá-los ou não é garantir que seus direitos sejam respeitados em vida. Eles não podem sofrer, de forma alguma, enquanto estão vivos. Mas, em sociedades em que os animais são a única alternativa a morrer de fome, matá-los pode ser aceitável.

Nomes próprios

Para manter a comunidade reunida no fundo do mar, os golfinhos usam assovios que incluem informações repetidas. Já se sabia que cada indivíduo tem uma vocalização única, e que eles são capazes de copiar os assovios dos outros, mas ninguém tinha certeza da utilidade disso. Até que uma pesquisa com golfinhos-nariz-de-garrafa da Flórida chegou à conclusão de que, quando assoviam, os golfinhos estão chamando uns aos outros pelo nome. Para saber se os animais se orientavam pela voz do parente ou se aquele conjunto de sons formava uma palavra, os pesquisadores reproduziram os assovios mecanicamente. Quando o código correspondia a um parente, os golfinhos se voltavam na direção dos alto-falantes. É a primeira vez que o uso de nomes próprios é identificado em animais não humanos. Os golfinhos dessa espécie também parecem ser capazes de usar ferramentas e transmitir conhecimento.

Vale a pena ler

• A Vida dos Animais, J.M. Coetzee, Companhia das Letras, São Paulo, 2003

• Do Animals Think?, Clive Wynne, Princeton University Press, EUA, 2004

• A Expressão das Emoções nos Homens e nos Animais, Charles Darwin, Companhia das Letras, São Paulo, 2000

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