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Editorial: quatro sinais de alerta para a democracia

A vitória iminente de Bolsonaro será legítima, pois terá acontecido sob a bênção da democracia. Que ele jogue sob essas mesmas regras caso eleito.

Por Alexandre Versignassi Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
26 out 2018, 13h33

“Se surge um outsider carismátIco, ganhando popularidade ao desafiar a velha ordem, é tentador para os políticos do establishment, buscar cooptá-lo”, escreve Steven Levitsky, cientista político de Harvard, em seu livro Como as Democracias Morrem. Ele descreve a ascensão por vias democráticas de Mussolini e Hitler. Ambos contaram com o apoio dos donos da grana, pois afastavam o fantasma do comunismo, e acabaram abraçados por políticos tradicionais, temerosos de se verem longe do poder.

Qualquer semelhança com o gaúcho Pedro Simon, com mais de 30 anos de Senado nas costas, e partes do MDB declarando apoio a Bolsonaro não é coincidência. Na ponta da grana, o mesmo vale para o suporte que ele recebe da Confederação Nacional da Indústria e dos cabeças do agronegócio.

Levitsky segue: “Se um insider se rebelar para seguir o insurgente antes que os rivais o façam, ele pode usar a energia e a base do outsider para sobrepujar seus pares”. A semelhança disso com o paulista João Doria dando uma rasteira no PSDB e se jogando no colo de Jair também não é coincidência.

É história. Um capítulo perigoso da história da humanidade se repetindo por aqui linha por linha. Palavra por palavra.

Com base em décadas de estudo, Levitsky e colegas seus de outras universidades americanas bolaram um conjunto de “sinais de alerta” para reconhecer políticos com pretensões ditatoriais. De acordo com eles, deveríamos nos preocupar quando o político:

1) Rejeita, em palavras ou ações, as regras democráticas do jogo. Bolsonaro afirmou em 1999 que “daria um golpe se assumisse a Presidência”. Hoje, prega contra a lisura do sistema eleitoral, criando pânico infundado sobre a segurança das urnas eletrônicas.    

2) Nega a legitimidade de oponentes. Bolsonaro defende que as ações do MST e do MTST devam ser tratadas como atos de terrorismo.

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3) Tolera e encoraja a violência. Em 2003, Bolsonaro teceu loas a grupos de extermínio durante um discurso no Congresso. Em 1999, disse que, se estivesse no poder, “mataria uns 30 mil, começando por FHC [o presidente da época]”. Também afirmou que “o País só vai mudar quando partirmos para uma guerra civil”. E defende a tortura.  

4) Dá indicações de restringir liberdades civis de oponentes. Bolsonaro já disse que pretende “acabar com o ativismo”. A única realidade em que o ativismo não existe, vale ressaltar, é aquela sem liberdades civis.

Mais importante, e que diz respeito lá ao critério 1: Bolsonaro disse em julho que pretende aumentar o número de membros do Supremo de 11 para 21, com ele próprio indicando os dez juízes extras.

É basicamente o que o autoritário Viktor Orbán fez na Hungria, o que Jaroslaw Kaczyński fez na Polônia, o que Chávez fez na Venezuela. Controlar a corte suprema de seu país é o primeiro passo de qualquer ditadura contemporânea.

Não se trata de uma ilação deste autor. O próprio cientista político de Harvard enquadrou Bolsonaro nos quatro critérios, em uma palestra na Fundação Fernando Henrique Cardoso, em agosto.

Tampouco se trata de um ponto de vista ideológico de Levitsky. O sociólogo entende Cuba e Venezuela como o que eles realmente são: tiranias abjetas. O autoritarismo socialista não é melhor que o autoritarismo liberal. E vice-versa.

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Nada disso significa que os mais de 50 milhões de eleitores de Bolsonaro sejam a favor de uma ditadura, ou que tenham pendores fascistas. De forma alguma. Seu eleitor típico quer segurança pública mais eficiente, quer escolas que prestem, quer punir a corrupção, quer menos impostos, menos burocracia. E está cansado dos discursos vazios que povoam toda a política tradicional.

Isso é bem diferente de querer um governo totalitarista. E as pesquisas provam isso. 69% dos brasileiros acham que a democracia é sempre a melhor forma de governo, independentemente da situação do País – em 1989, eram só 43%. O grosso dos eleitores de Bolsonaro faz parte dessa maioria.   

Regimes autoritários, porém, não começam do dia para a noite. Eles vão comendo as instituições democráticas por dentro. E não há país livre dessa ameaça. Antes da eleição de Hugo Chávez, a Venezuela celebrava 40 anos de democracia ininterrupta, a mais longeva da América do Sul. E 60% da população rejeitava autoritarismo. A boa vontade dos eleitores, então, não torna um líder com traços autoritários menos perigoso. Isso valia para Chávez lá atrás. E vale hoje para Bolsonaro.

Sua eventual vitória será legítima, pois terá acontecido sob as regras da democracia. Que Bolsonaro, então, jogue sob essas regras caso eleito. Que nossas instituições, a começar pelo STF, sigam intactas. Que a oposição tenha voz no Congresso. Que ativistas não sejam intimidados. Que a violência contra minorias seja punida exemplarmente. Que Bolsonaro, enfim, surpreenda seus críticos e, uma vez no poder, mantenha os pilares da democracia em pé. Porque, se não mantiver, irá trair a maior parte de seus eleitores. E manchar a história do país ao qual pleiteia servir.


Esta é a Carta ao Leitor da SUPER de novembro.

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