As fornalhas ocultas da Terra
Se você acha que o Vesúvio ou o Mauna Kea são perigosos, imagine vulcões que tenham uma caldeira com dezenas de quilômetros de diâmetro. Pois é, eles existem - e podem entrar em erupção a qualquer momento
Grosso modo, o risco muito real para a biosfera da Terra representado por supervulcões se assemelha bastante ao risco associado à queda de meteoritos: sabemos que o troço é perigoso porque já aconteceu antes, e nada impede que aconteça de novo.
E, pode acreditar, não foi nada agradável quando aconteceu, pelo que se sabe. O vulcanismo descontrolado é o principal candidato a vilão da chamada Grande Morte (Great Dying, em inglês), a pior extinção em massa da história da Terra. A hecatombe se deu na fronteira entre os períodos geológicos Permiano e Triássico, há 252 milhões de anos, quando os dinossauros ainda não tinham surgido. Contagem de corpos: em torno de 90% das espécies de animais e plantas que existiam então. E a má notícia: é de esperar que, quando um desastre desse tipo se repetir, ele siga mais ou menos o figurino do que ocorreu na Great Dying.
Debaixo da terra
Há várias hipóteses para explicar como a hiperatividade vulcânica surge. Nem sempre ela acontece nas áreas de encontro entre placas tectônicas, as “balsas” rochosas que navegam em cima do material derretido do interior da Terra e abrigam os continentes. Também há os chamados “hotspots”, lugares que, por motivos ainda controversos, têm uma concentração anormalmente alta de material quente subindo das profundezas rumo à superfície.
Nesse segundo caso, se o material derretido, ou magma, acaba se acumulando por muito tempo sem conseguir sair, a pressão começa a crescer cada vez mais. O resultado é que, quando a coisa finalmente escapa, o fenômeno ocorre com uma violência avassaladora, formando um supervulcão.
Ninguém sabe se foi exatamente isso o que aconteceu nas chamadas “traps” siberianas, na atual Rússia, durante o fim do Permiano. O que se calcula, no entanto, é que ao longo de 1 milhão de anos o vulcanismo nessa região cuspiu lava suficiente para cobrir de basalto (uma rocha vulcânica) cerca de 7 milhões de quilômetros quadrados, ou seja, quase todo o território do Brasil.
Tamanha hiperatividade vulcânica teria dado duas pancadas na biosfera da Terra, uma de duração mais breve e outra de efeitos mais duradouros. O fenômeno inicial é o de resfriamento: partículas de enxofre e outros tipos de dejetos lançados no ar pelas erupções são capazes de tapar boa parte da luz do Sol e criar uma noite/inverno de proporções globais. Muitas plantas, incapazes de usar a energia solar para crescer, devem ter morrido, arrastando consigo os herbívoros que se alimentavam delas e os carnívoros que comiam esses herbívoros.
O problema maior, no entanto, talvez tenha sido a pancada de longo prazo. Tamanha orgia vulcânica também deve ter despejado nos ares elevadas quantidades de gás carbônico (CO2), o principal gás causador do efeito estufa. Um forte aquecimento global pode ter seguido o frio generalizado, num ritmo e força suficientes para derreter depósitos marinhos de metano, gás-estufa ainda mais poderoso, o qual, ao reagir com o oxigênio, produz ainda mais CO2. Ou seja: calor redobrado.
A temperatura elevada, no entanto, é só um dos problemas ligados a um excesso de gás carbônico na atmosfera e no oceano. No mar, a sobra da substância impede que organismos marinhos como moluscos produzam suas conchas. E o ar com proporções muito elevadas de CO2 se torna simplesmente irrespirável. No limite, muitas formas de vida sumiriam por pura falta de ar.
O dia em que a lava soterrou o Brasil
Hoje a vida no país tropical é uma beleza, sem vulcões, grandes terremotos, furacões e outros castigos naturais. Mas o Brasil, em tempos remotos, também já sofreu com supervulcanismo. Aconteceu no período Cretáceo, o mesmo que marcou o fim dos dinossauros e terminou 65 milhões de anos atrás. Uma sondagem realizada no município de Presidente Epitácio (SP) atravessou mais de 1.500 metros de rochas vulcânicas, para que se tenha a medida de quanta lava foi expelida.