Com base no livro A origem das espécies do naturalista inglês Charles Darwin (1809-1882), posso dizer que é aqui, na Terra, o único lugar onde se podem encontrar seres humanos. Recordo-me, então, do astrônomo americano Carl Sagan quando afirma em seu livro Cosmos: “Se um ser humano discordar de você, deixe-o viver. Em 100 bilhões de galáxias não encontrará nenhum outro”. Essa abertura, no entanto, não é uma resposta negativa à carta de um leitor que indaga da possibilidade matemática de existência de vida em outros rincões do Universo. É claro que a resposta não é simples nem unânime. Porém, temos alguns parâmetros já assentados para que tal especulação não seja apenas mais uma fantasia.
Cada substância diferente absorve freqüências ou cores diferentes de luz. Assim, pode-se dizer que cada substância apresenta um espectro particular, como se nela houvesse uma “impressão digital”. O uso da espectroscopia Astronômica permite identificar os gases de Vênus, conhecer a composição do Sol ou analisar a luz coletiva de milhões de estrelas. As observações feitas, pelo menos as divulgadas, não indicam um comportamento físico-químico muito diferente do conhecido por nossos cientistas. Se considerarmos que somente em nossa galáxia existe uma centena de bilhão de estrelas, muitas acompanhadas de vários planetas, é pouco provável que apenas uma delas, o Sol, tenha formas mais complexas de vida em um dos seus planetas, a Terra.
É compreensível a dificuldade que muitas pessoas terão em aceitar isso. Não é muito diferente do susto que tomaram os habitantes do Novo Mundo ao perceber que não estavam sós em suas terras e o espanto dos primeiros exploradores ao descobrir novas terras habitadas. Foi necessário que homens como o astrônomo grego Eratóstenes (276 a.C.-194 a.C.) com o uso de instrumentos elementares e acurada observação mudassem a visão dos homens sobre a Terra, nosso lar. De uma grande casa para um planeta foi um salto aterrador. E, mesmo centenas de anos depois de saber que vivem num planeta, ainda há quem continue na grande casa. Mesmo morando em cidades grandes e tendo acesso a jornais e televisão muitos ainda não acreditam que astronautas chegaram à Lua.
As respostas não param de vir do céu. Sondas e naves espaciais dão conta da pequena probabilidade de existência de vida inteligente nos planetas e satélites do nosso sistema solar, e isso tem reforçado os argumentos dos céticos e arrefecido o entusiasmo dos que crêem. A verdade, porém, é que o homem despregou-se do planeta Terra, mas continua preso ao Sol e a chance de vida em planetas distantes, presos a outros sóis, continua grande, principalmente se considerarmos uma química da vida diferente da que ocorre aqui.
O Eratóstenes moderno foi uma comunidade de cientistas que despregou o homem do planeta. Porém, não podemos nos deixar levar pelo entusiasmo; devemos tentar responder racionalmente a algumas questões. Toda a vida conhecida é constituída de moléculas orgânicas, mas nem sempre foi assim; se a sonda de um planeta distante passou por aqui há 4 bilhões de anos, deve ter registrado ausência de vida na Terra. Sei que é difícil nos acostumarmos a imensos números como esse da contagem dos anos. Mas o brilhante Carl Sagan parece ter resolvido o problema em seu livro Dragões do Éden. Ele imagina a ocorrência de 15 bilhões de anos do Universo condensada em um único, o ano cósmico.
Sagan fixou datas precisas para esse ano, ou seja: enquanto a Via Láctea surgia num dia 1º de maio, o nosso sistema solar aparecia em 9 de setembro; a Terra no dia 14 e a vida, em 25 de setembro daquele mesmo ano cósmico. Por volta das 22h30 de 31 de dezembro, nasceram os primeiros humanos que até a meia-noite cósmica caminharam da Idade da Pedra até a geração da Tecnologia, capaz de buscar a existência de inteligências extraterrestres ou de se autodestruir. Em SUPERINTERESSANTE ano 2, número 2, falei da probabilidade de sermos muito mais aparentados uns com os outros do que pensamos e, tentando mostrar como são tolos os preconceitos, dizíamos: se você não se considera galho de uma mesma árvore, perceba ao menos que é parte da mesma floresta.
Luiz Barco é professor da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo