Entenda de uma vez: geoengenharia
É possível usar a tecnologia para mudar o clima do planeta e frear o aquecimento global? Até é; mas os resultados são imprevisíveis.
A tecnologia resolve muita coisa, claro – o smartphone no qual você consegue carregar uma biblioteca inteira é prova disso. É natural, portanto, que ao menos algumas pessoas achem que a crise climática atual também seja resolvida um dia pela tecnologia, e não por chatíssimas e complicadas negociações internacionais e transformações econômicas.
Sonhar não custa nada, mas na prática a teoria é outra, como dizem os sábios. Existem por aí muitos planos mirabolantes de geoengenharia, como o pessoal costuma chamar essas técnicas de alteração climática deliberada por vias tecnológicas; no entanto, ninguém ainda sabe direito se eles são viáveis e/ou seguros.
Os planos costumam ser divididos em dois grandes grupos: os que envolvem o gerenciamento da radiação solar e os ligados à remoção de gases-estufa, como o nosso malvado favorito, o CO2 (dióxido de carbono ou gás carbônico). Recorde a história do aquecimento global: a radiação solar é a responsável por trazer calor à Terra, enquanto os gases-estufa são os cobertores que retêm parte desse calor perto da superfície do planeta. Dois lados da mesma moeda, portanto.
No que diz respeito ao controle da ação dos raios solares sobre nosso mundinho, existem várias soluções possíveis. Podemos tentar aumentar o albedo – ou seja, a capacidade do solo e do oceano de refletir os raios do Sol, em vez de absorvê-los. É simples: coisas claras refletem muito a luz, coisas escuras a absorvem. O que significa que pintar a Terra inteira de branco, em tese, teria um efeito considerável sobre o clima. Não dá para fazer isso, óbvio, mas que tal pintar apenas os tetos de todos os prédios e casas das cidades de branco? Um estudo realizado pelo Instituto Federal de Tecnologia da Suíça mostra que daria para reduzir em até 2 graus Celsius os extremos de calor nas grandes cidades com essa estratégia. Não salva o planeta, mas já dá uma (de)mãozinha.
Outra opção, dentro dessa linha, é mexer com a maneira como a luz solar se propaga pela atmosfera – colocando “óculos de Sol” na Terra. Às vezes esse tipo de coisa acontece naturalmente quando ocorrem poderosas erupções vulcânicas* por aí. As cinzas que os vulcões lançam no ar permanecem por um tempo em suspensão e impedem parte da radiação solar de chegar ao chão, esfriando o planeta. Poderíamos lançar partículas desse tipo pelos ares e ver que bicho dá. É uma solução barata, mas perigosa. Há uma chance não desprezável de esses aerossóis ocasionarem desequilíbrios climáticos locais consideráveis. Você quer mesmo submeter seu continente ao risco de, sei lá, uma onda de perda de colheitas para tentar evitar que a Terra aqueça demais?
Outra ideia seria colocar no espaço satélites capazes de projetar sombra sobre a Terra. Mas a viabilidade técnica ainda está longe de demonstrada.
Quanto à segunda parte da equação da geoengenharia, já existem projetos-piloto de armazenar em rochas profundas e porosas os gases-estufa produzidos por termelétricas, por exemplo. É basicamente força bruta: encanamento e bombas entregam o gás a alguns quilômetros de profundidade. Mas há ideias bem mais ambiciosas do que isso. A principal envolve fertilizar os oceanos com ferro, um nutriente cuja relativa escassez normalmente impede o crescimento dos micróbios marinhos que fazem fotossíntese**, tal como as plantas da terra firme. É um método maravilhoso para remover CO2 da atmosfera: o gás é basicamente absorvido pelos micróbios, eles morrem, afundam, o carbono fica preso no leito oceânico e todo mundo fica feliz.
Na prática, não rolou. Os experimentos de pequena escala feitos até hoje sugerem que a fertilização com ferro estaria longe de produzir efeito significativo sobre o clima – além do risco de bagunçar uma parte fundamental das comunidades ecológicas oceânicas.
Nada disso significa que tais soluções não devam ser estudadas. E, se nossa situação climática ficar realmente desesperadora, é provável que algumas sejam postas em prática. Mas, por enquanto, o melhor mesmo é agir para que elas nunca sejam necessárias.
*Erupções vulcânicas: emitem grandes quantidades de dióxido de enxofre, molécula que age na alta atmosfera resfriando o planeta.
**Fotossíntese: reação usada por formas de vida para converter dióxido de carbono, água e luz solar em açúcar e oxigênio. É graças a ela que temos uma atmosfera respirável.