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Mais rápido que a luz

Físicos ainda alimentam o sonho de superar a velocidade da luz sem violar a Teoria da Relatividade. Detalhe: isso possibilitaria viagens para o passado.

Por Paul Davies
Atualizado em 20 Maio 2019, 13h08 - Publicado em 9 fev 2015, 22h00

Muitos achavam que nunca seria possível viajar mais rápido que o som. Até que em 1947 o piloto americano Chuck Yeager quebrou essa barreira a bordo do avião-foguete Bell XS-1. Lindo, mas isso passa uma ideia absolutamente errada sobre os limites à velocidade: a de que, com tecnologia o bastante, qualquer tipo de barreira cairia. Mas existe uma barreira final: 1,07999 bilhão de km/h, a velocidade da luz. 1,08 bihão de km/h, para arredondar – ou 300 mil km por segundo, como preferem ensinar nas sala de aula, já que professores e cientistas, por alguma implicação estética, abominam notações em km/h.

A velocidade da luz, enfim, constitui um limite físico inexpugnável. Não pode ser superada. E não importa qual tecnologia inventem.

A descoberta de que existe uma barreira ao deslocamento dos corpos é fruto da Teoria da Relatividade. Sua ideia central pode ser compreendida a partir de uma experiência que analisa pulsos de rádio (tanto o rádio quanto a luz são formas de ondas eletromagnéticas e se deslocam com a mesma velocidade). Imagine alguns desses pulsos sendo emitidos a partir da constelação Monoceros, a 16 mil anos-luz da Terra. Monoceros é um pulsar binário, formado por duas estrelas altamente compactas, ou estrelas de nêutrons, que giram uma em torno da outra. A gravidade que liga as duas é tão forte que elas percorrem suas órbitas a 720 mil km/h (300 mil km/s), ou 0,1% da velocidade da luz.

A velocidade da luz é um limite físico inexpugnável. Não importa a tecnologia: é impossível superar os 1,08 bilhão de km/h

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Com extraordinária regularidade, a cada 59 milésimos de segundo, uma das estrelas emite um sinal – como o tique-taque de um relógio – que pode ser monitorado da Terra. Ao girar em torno de seu companheiro, um pulsar às vezes se aproxima um pouco do nosso planeta e às vezes se afasta. Assim, podemos ficar tentados a pensar que a velocidade dos pulsos é maior durante a aproximação do que durante o afastamento. Mas, se fosse assim, os pulsos mais rápidos alcançariam os mais lentos, ao longo dos 16 mil anos-luz de viagem. E bastaria uma minúscula diferença de velocidade para misturar os sinais de maneira complicada.

Como nada disso acontece, essas observações confirmam o princípio relativístico de que a velocidade da luz é independente do movimento da fonte, ou do observador. Essa constatação produz uma consequência imediata para a possibilidade de uma viagem mais rápida que esse limite: obviamente, se a rapidez com que a luz passa não é afetada pelo movimento de uma pessoa, esta nunca poderá alcançar aquela.

Imagine o que aconteceria se um foguete partisse da Terra em perseguição a um raio luminoso. Quando o motor é ligado, a nave acelera e sua velocidade começa a aumentar. À primeira vista, nada impede que o motor continue a acelerar o foguete até a velocidade se tornar maior que a da luz. Mas há um impedimento. Um observador na Terra veria a nave acelerar, mas depois de certo tempo perceberia que a aceleração não corresponderia ao esforço do motor. À medida que se aproximasse da velocidade da luz, a nave precisaria gastar mais e mais combustível para conseguir um aumento cada vez menor de velocidade. O observador enxerga esse fato como um contínuo aumento da massa da nave, que cresce sem limite ao se aproximar da velocidade máxima do Universo. A massa extra torna o foguete mais resistente à aceleração, e nenhum acréscimo no impulso o faria atingir a velocidade da luz.

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É possível acelerar partículas subatômicas a uma velocidade quase igual à da luz, mas as regras da física não mudam: continuam determinando que não é possível acelerar algo além desse limite.

Mesmo assim, existe uma saída teórica para a ideia de ultrapassar a velocidade da luz. Para alguns físicos, pode haver partículas que simplesmente existem a uma velocidade superior ao limite de rapidez do Universo. O nome dessa partícula hipotética é táquion. E a ideia funciona porque a Teoria da Relatividade não faz restrição a objetos que sejam sempre mais velozes que a luz. Ou seja, os táquions também obedecem às regras da física, mas de um jeito diferente.

Se os táquions existem, devem ter propriedades estranhas. As partículas comuns, por exemplo, têm mais energia quando se deslocam mais velozmente; os táquions teriam menos energia. Dessa forma, se um deles perder energia, será acelerado. E, se tiver energia zero, sua velocidade será infinita, capaz de cruzar o Universo instantaneamente. Isso porque o conceito comum de massa não se aplicaria a essas partículas, que têm o que se chama de massa imaginária. Enquanto é preciso gastar energia, ou realizar trabalho, para acelerar massas comuns, deve-se realizar trabalho para desacelerar um táquion.

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Quanto mais energia um táquion perde, mais ele acelera – o contrário do que acontece com as partículas que conhecemos

O simples fato de a natureza permitir a existência dos táquions, no entanto, não significa que eles existam. Mas vale imaginar onde eles poderiam ser encontrados. Uma possibilidade é o Big Bang. Afinal, foi durante a grande explosão que deu origem ao Universo que toda a matéria foi produzida. Talvez a tórrida fase primordial do cosmos tenha deixado resíduos taquiônicos que depois se espalharam pelo espaço. Os astrônomos sabem que o Universo contém muita matéria sob forma desconhecida; é intrigante a sugestão de que parte dela esteja em forma taquiônica.

Para testar essa possibilidade, é preciso saber como os táquions se comportam em um Universo em expansão. Um gás comum, por exemplo, fica mais frio quando se expande. Isso significa que suas moléculas, em agitação caótica quando quentes, aos poucos se aquietam. De forma semelhante, um gás de táquions também perderia energia, mas, como ele respeita as regras da física do avesso, ficaria ainda mais acelerado. Assim, conforme se aquece ao longo da expansão, quando chega à energia zero, a velocidade dos táquions se torna infinita. E as partículas deixam de existir. Esse desaparecimento súbito pode ser entendido com a ajuda do diagrama aqui embaixo. Nesse gráfico, o limite é a velocidade da luz, que aparece inclinada em 45 graus, correndo a distâncias iguais tanto do eixo do espaço quanto do eixo do tempo.

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(Superintessante/Superinteressante)

Uma eventual partícula mais rápida que a luz (nosso amigo táquion) apareceria aqui com um ângulo mais acentuado que 45 graus. E isso cria um paradoxo à luz da Teoria da Relatividade. O gráfico ajuda a entender o motivo. Do ponto de vista de um observador imóvel (o sujeito que aparece parado no desenho), a linha fica inclinada para cima. Ou seja: o táquion está mais rápido que a luz, e tudo certo. Quando o observador está em movimento, a história é outra.

De acordo com a Relatividade, o tempo passa mais devagar para quem está em movimento (o efeito é infinitesimal a velocidades cotidianas, mas existe). Se esse movimento for uma velocidade estonteante, próxima de 1 bilhão de km/h, o diagrama revela algo assustado. Um observador a essa velocidade veria a linha do táquion inclinada para baixo. O problema: o tempo corre para cima no gráfico.

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Essa possibilidade cai como uma bomba sobre a ideia de causa e efeito. Se o táquion fosse uma bala de canhão disparada na direção de um alvo, o alvo explodiria antes de o canhão ser disparado. Também é possível interpretar essa situação dizendo que a explosão do alvo é a causa do disparo – e não seu efeito. De uma maneira ou de outra, eventos que são aceitáveis para o observador imóvel parecem bizarros aos olhos do que se move. Tais possibilidades inspiram paradoxos divertidos ou tormentos metafísicos, dependendo da inclinação pessoal de cada um.

Para muitos físicos, esses paradoxos temporais acabam com a possibilidade de existência dos táquions. Mesmo assim, uma conclusão parece certa: embora conduza a possibilidades difíceis de compreender, a existência dos táquions não viola as leis da natureza. Então talvez seja possível invocar a seu favor uma curiosa regra informal da ciência: se algo não é estritamente proibido, a natureza tende a produzi-lo de uma forma ou de outra. Não deve causar surpresa se um dia alguém surgir com evidências desse estranho viajante do espaço-tempo.

 

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