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O grande jogo da ciência

Em 1996, a ciência avançou como num supergame, com lances emocionantes, idas e vindas, picos de otimismo e rasantes de pessimismo. Agora, você vai rever todas essas emoções, experimentando o suspense de quem brinca com a sorte.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h46 - Publicado em 31 dez 1996, 22h00

Flávio Dieguez e Thereza Venturoli

Largada

O jogo da Ciência 1996 começa aqui. Boa sorte!

Átomo ou agente duplo?

Você só entra na partida se tirar 2 no dado e chegar à casa do átomo duplo: ele fica em dois lugares ao mesmo tempo. Claro que ninguém pode ir ao escritório e ao clube num único horário, e um carro não roda em duas estradas de uma vez só. Mas isso vale para as coisas grandes, como gente e automóvel. As coisas microscópicas ficam, sim, em dois pontos simultaneamente. O problema é que “pequeno”, aqui, quer dizer do tamanho de um átomo, que é dez milhões de vezes menor que 1 milímetro. Foi o que provaram em maio os americanos David Wineland e Chris Monroe, do Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia, nos Estados Unidos. Eles mostraram que objetos do tamanho dos átomos podiam aparecer em dois pontos na mesma fração de segundo. Essa “duplicidade” já era registrada nas partículas subatômicas, que são um milhão de vezes menores que um átomo. Jogue os dados e vamos em frente.

Este mundo

Não saia ainda da casa 6, pois a 6 000 quilômetros sob seus pés fica o núcleo sólido da Terra. No início de 96 ficou confirmado que ele é um cristal de ferro perfeito. O achado é dos geólogos Ronald Cohen, do Instituto Carnegie, e Lars Stirxrude, do Instituto de Tecnologia da Georgia, nos Estados Unidos. O coração cristalino do planeta mede 3 900 quilômetros de raio. Ou seja, mais que o dobro do raio da Lua, que tem 1 738 quilômetros. Não esqueça a informação, pois você vai precisar dela depois.

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Outros mundos

São 6 os novos planetas descobertos fora do sistema solar. Foi uma verdadeira avalanche de êxitos sensacionais em apenas doze meses. Durante anos, o tremendo desafio de caçar planetas ao redor de outras estrelas fracassou. Foi assim até outubro de 1995. Então, o primeiro deles deu as caras e daí em diante os astrônomos pegaram o jeito. Em pouco tempo, apontaram mais quatro mundos novos. O mais recente foi anunciado em outubro por William Cochrane, da Universidade do Texas.

Ele está aqui… e aqui

Como escapar dos ímãs.

O cerco…

Quatro magnetos 1 fazem o átomo 2 ficar parado. Mas ele vai enganar os ímãs.

…e a fuga

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Quando tudo parece congelado, o laser 1 flagra o átomo em duas posições ao mesmo tempo.

O mal fica adiado

O governo americano testou em 1996 algumas drogas promissoras. Elas podem atrasar durante anos as falhas de raciocínio criadas pelo mal de Alzheimer. Os remédios já tinham sido anunciados um ano antes, no 25º Encontro da Sociedade Americana de Neurociências. Os resultados devem aparecer agora, em 1997.

Quantas velas?

O número é 15 bilhões, uma para cada ano do Universo. Até agosto, a astrônoma americana Wendy Freedman, do Telescópio Hubble, defendia que eram apenas 12 bilhões. Mas então, corrigindo seus dados, a própria Wendy reafirmou a idade oficial do Cosmo.

Civilização perdida da Amazônia

A arqueóloga americana Anna Roosevelt ajuda você a chegar à casa 11 . Ela descobriu que em plena floresta, há 11 200 anos, nasceu uma fantástica civilização. Anna desenterrou pontas de flechas, restos de cerâmica e de alimentos fósseis perto de Monte Alegre, Pará. Para ela, 300 000 homens e mulheres ocupavam a região naquela época. Com isso, vai ficando cada vez mais certo que é preciso mudar a data em que os primeiros índios passaram da Ásia para o Alasca. A suposição atual, de que isso aconteceu há 12 000 anos, deve ser revogada, pois não haveria tempo suficiente para formar uma civilização tão exuberante na Amazônia.

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Finalmente, está pronta a antimatéria

Em setembro, uma equipe do Cern, Centro Europeu de Pesquisa Nuclear, em Genebra, Suíça, montou o primeiro átomo de antimatéria. Era um “anti-hidrogênio”, que equivale ao hidrogênio comum, o mais simples dos elementos químicos. O núcleo do antiátomo não era um próton normal, de carga elétrica positiva, mas um antipróton, de carga negativa. À volta do núcleo havia um antielétron, positivo, em lugar de um elétron normal, negativo. Atenção: alguns disseram que a antimatéria tinha sido descoberta em 1996. Besteira pura. Ela é conhecida desde os anos 30, de 32 exatamente, mas apenas na forma de partículas subatômicas. Só no ano passado se construiu um antiátomo inteiro.

ET congelado?

Anunciados em agosto, pelo biólogo David McKay, da Nasa, os canudinhos microscópicos mais badalados do ano realmente lembram bactérias. Estavam num meteorito de 3,6 bilhões de anos que pode ter espirrado de Marte e caiu na Antártida, onde foi achado. Mas não está provado que os canudinhos são mesmo fósseis de germes. A descoberta de água na Lua no fim do ano reanimou os caçadores de microETs.

O inferno é meu lar

Centenas de metros abaixo do solo, num calor de 400 graus Celsius e uma pressão capaz de fazer aço virar mingau. Parece o próprio inferno, mas foi aí que um grande número de bactérias decidiu proliferar. Elas podem estar sob as rochas desde que a Terra era uma criança, há 3,8 bilhões de anos. As pistas dos micróbios subterrâneos não são novas. Mas em 1996 diversas pesquisas independentes confirmaram que eles representam centenas ou milhares de espécies. Com isso, os grandes habitats do planeta passam a ser quatro: ar, terra, água e crosta.

Muito, mas muito longe do berço

O Australopithecus afarensis do Chade é um ancestral problemático. É o único precursor do homem que não andou entre os arbustos, na costa leste da África. Há 4,4 milhões de anos, essa espécie “estrangeira” morava nas matas, onde hoje fica o Chade, a mais de 2 000 quilômetros dos outros australopitecos. “O afarensis do Chade abalou a principal explicação sobre a origem do gênero humano”, disse à SUPER o especialista americano William Kimbel, do Instituto de Origens Humanas. A polêmica estourou no ano passado. Até então, era aceita a teoria de que os ancestrais da humanidade passaram a andar com duas pernas – e não com quatro patas, como os macacos – porque uma seca arrasou as matas, há 5 milhões de anos. Era preciso caminhar mais para achar comida. O problema agora é encaixar o fóssil do Chade nessa teoria, já que, até onde se sabe, a pátria dele não sofreu com a seca. Então, como ele ficou de pé? Em 1997, muito cientista vai continuar coçando a cabeça para responder.

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Explosão de seres

Durante 4 bilhões de anos, os únicos habitantes do planeta eram organismos de uma célula só, como algas e bactérias. Então, sem aviso prévio, as células começaram a se juntar aos milhões para criar bichos grandes. A natureza, num delírio, criou todos os tipos de animais que ainda hoje dão as caras por aí e muitos outros que se extinguiram sem deixar parentes. Como ocorreu há 50 vezes 10 milhões de anos, essa explosão criativa está na casa 50. Mas, desde outubro, a data está em discussão. Há paleontólogos desconfiados que ela pode ter acontecido até 700 milhões de anos atrás.

A diferença está na cara

É incrível. O homem acaba de descobrir um novo músculo no próprio rosto. Ou seja, o corpo agora tem 57, e não 56 grandes músculos. Dizem os descobridores, os ortodontistas Garry Hack e Gwendolyn Dunn, da Universidade de Maryland, Estados Unidos, que o sphenomandibularis fica entre a mandíbula inferior e o osso que circunda o olho. Hack supõe que ele até agora vinha sendo confundido com o pterigóideo médio, que fica colado a ele na face. Agora, exercite ritmadamente os seus dois sphenomandibularis (você tem um de cada lado). Só depois de praticar bem é que você está autorizado a ir para a casa 64.

Multicomputador

Faça as contas você mesmo. Se um computador tem apenas seis bits, ele pode memorizar 64 informações, e você tem acesso a uma de cada vez. Mas essa regra não vale para os computadores quânticos, os engenhos malucos que a ciência quer construir daqui a alguns anos. Neles, você acessa todas as 64 informações de uma vez. Ou seja: com os mesmos seis bits a máquina trabalha como se dentro dela houvesse 64 computadores como os de hoje. A ciência não garante que um dia vai fazer processadores assim, mas em 1996 as pesquisas se multiplicaram, mostrando que os cientistas estão apostando nesse rumo. Se você voltar à casa 2 vai ver um átomo que, sem se dividir ao meio, fica em dois lugares num único instante. Pois é por ter essa capacidade que os bits do computador quântico, sem deixar de ser apenas seis, funcionam como 64 máquinas ao mesmo tempo. Fácil, não?

Navegando à toda

A Internet entrou em 1996 com o pé direito, ou melhor 50 milhões de pés direitos ou, melhor ainda, de usuários. Já em agosto, tinha alcançado o patamar de 69 milhões. Em 31 de dezembro, estimavam-se 100 milhões de usários. É isso aí: o time de internéticos continua dobrando a cada doze meses. Os pessimistas, que garantem o esvaziamento da rede todo ano, erraram de novo. Adeus ano velho pra eles. Feliz ano novo pra você.

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O novo gigante africano

O nome é Carcharodontosaurus saharicus e a profissão, comedor de carne, possivelmente maior do que o Tyranosaurus rex. Encontrado pelo paleontólogo americano Paul Sereno, o carcarodontossauro é o segundo predador que surpreende pelo gigantismo. O primeiro foi o giganotossauro, desenterrado na Patagônia em 1995 pelo argentino Rodolfo Coria. O giganotossauro acabou com o reinado do tiranossauro, que vinha desde o início do século. Em maio, Sereno apresentou as medidas da nova fera africana. Seu crânio, perfeitamente preservado, é o principal indício de tamanho excepcional. Mede 1,6 metro de comprimento contra 1,45 metro do maior tiranossauro conhecido. Embora cabeça maior não signifique necessariamente corpo maior, o bicho devia ser assustador. Mesmo assim, tamanho assustador não era documento. Grandes e pequenos, os dinos sucumbiram há 65 milhões de anos.

Festa superelétrica

Setembro de 86 foi um mês eletrizante. Marcou o aniversário de nascimento dos fios supercondutores. Uma década de existência. Eles têm esse nome porque transportam corrente elétrica com resistência zero. Quer dizer: não se perde nada no caminho. Basta um empurrão inicial e os elétrons correm eternamente dentro do fio. Com os superfios, logo, logo vai dar para construir eletroímãs de força magnética excepcional, o suficiente para fazer levitar trens ou empurrar navios. Aliás, a capa da primeira SUPER, em outubro de 1987, falava justamente dessa descoberta, uma conquista espetacular dos físicos suíços Alexander Müller e Georg Bednorz, então trabalhando na IBM, em Zurique.

O HIV mais perto do fim

O vírus da Aids parecia imbatível, um mestre na arte da guerrilha e da camuflagem. E era mesmo, só que tinha um ponto fraco: a molécula protease, que usa para se reproduzir dentro das células humanas. Aí, foi só achar um jeito de neutralizar a protease para acabar com a invencibilidade do vírus. A proeza foi anunciada em julho por David Ho, do Centro de Pesquisas sobre Aids em Nova York. Ele exibiu um novo coquetel de drogas que, testado em 21 pacientes, foi capaz de destruir 99% dos microorganismos que encontrou. Ou seja, fez uma limpeza geral. Certamente, ainda não é hora de falar em cura, até porque o efeito da limpeza depende muito da quantidade total de vírus. Apesar disso, a opinião dos especialistas é que o tratamento vai diminuir bastante a ameaça da doença. Sem dizer que é sempre bom conseguir uma vitória, ainda mais sobre um adversário tão duro na queda, como é o HIV. Isso também não quer dizer que é para baixar a guarda na prevenção. Nada disso. A Aids ainda não tem cura, e mata mesmo. Mas o avanço de David Ho é histórico. Agora comemore a conquista passando direto para a casa 100 sem precisar lançar os dados.

Um triz astronômico

O perigo passou sem grande alarde, em maio, na forma de um bólido de mais ou menos 600 metros de diâmetro. Por um triz não colidiu com a Terra. Deslizou um pouco além da Lua, a 448 000 quilômetros de distância, o que é muito perto, em escala astronômica. Esses viajantes anônimos vêm sendo catalogados com cuidado. Os astrônomos detectaram um enxame deles, agora em 96. Só uma equipe da Nasa, a Neat (sigla em inglês para Rastreamento de Asteróides Próximos da Terra), registrou cinco, cada um com 3 quilômetros de diâmetro. Mas os cometas também deram um show em 1996. E os mais sensacionais passaram bem longe daqui. Um deles, o Hyakutake, mostrou uma cauda que, no começo do ano, ocupou quase metade do céu no hemisfério norte.

Será que acabou?

O prêmio de pessimismo do ano vai para o jornalista John Horgan, editor sênior da revista americana Scientific American, que lançou em 96 o livro The End of Science, “o fim da ciência” em inglês. Horgan avalia que a eficiência da atividade científica está caindo, já que para manter o ritmo da produção científica é preciso dispender cada vez mais dinheiro e esforço. Ele também argumenta que já não resta muita coisa de importante para ser descoberta, embora ainda pairem dúvidas a ser esclarecidas na Teoria da Relatividade ou na Teoria da Evolução, entre outras. Toda a comunidade científica discutiu o livro. Quase ninguém concordou. Você concorda?

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