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O que foi o conflito que rendeu ao primeiro-ministro da Etiópia o Nobel da Paz

Entenda quem é Abiy Ahmed Ali, um dos políticos mais pops da África – e quais são as raízes do problema entre Etiópia e Eritreia, que começou há quase 50 anos.

Por A. J. Oliveira
11 out 2019, 19h42

O atual primeiro-ministro da Etiópia, Abiy Ahmed Ali, mal havia assumido seu mandato, em abril de 2018, e logo forjou um tratado de paz efetivo e há muito aguardado. Três meses depois de se tornar mandatário, selou um pacto com o presidente da vizinha Eritreia, Isaias Afwerki, para pôr fim a duas décadas de tensão militar entre os dois países.

Por esse mesmo ato, Abiy recebeu hoje o Nobel da Paz de 2019. Segundo a presidente do comitê que elege o vencedor do prêmio, Berit Reiss-Andersen, o político etíope foi contemplado por seus “esforços para alcançar a paz e a cooperação internacional, e em particular sua decisiva iniciativa de resolver o conflito de fronteira com a vizinha Eritreia”.

Mas de onde veio, afinal, o conflito que culminou no Nobel?

O entendimento entre os países oficializou o fim de uma guerra deflagrada entre 1998 e 2000 entre a Eritreia e a Etiópia. Dois anos de intenso confronto provocaram dezenas de milhares de mortes e custaram centenas de milhões de dólares, fragilizando as duas economias.

Em 2005, uma comissão internacional avaliou que foi a Eritreia quem deu início aos atritos – que começaram com a invasão de territórios da Etiópia. Como resposta, porém, as tropas etíopes devolveram na mesma moeda. E, no final das contas, foram eles quem tomaram mais terras do país vizinho.

As raízes dessa hostilidade toda vêm do século 20. A Etiópia perdeu sua independência em 1935 ao ser invadida e ocupada pela Itália fascista. Só em 1942, em uma aliança com o Reino Unido, a Etiópia voltou a ser um país soberano – sob o governo de um imperador, Haile Selassie.

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Na fase pós-Segunda Guerra, a Etiópia passou por uma campanha de modernização, que incluiu a abolição da escravidão. Dez anos mais tarde, em 1952, a Eritreia entra em cena na política etíope: os países ensaiaram uma parceria das grandes e quase viraram uma união de estados federativos (mais ou menos como os Emirados Árabes Unidos – vários países organizados em um só).

O projeto foi abandonado dez anos depois, em 1962. A Etiópia dissolveu e partiu para uma iniciativa bem menos diplomática: anexou o estado ao lado, dando início a um movimento que durou 30 anos e lutava pela independência da Eritreia.

Selassie foi derrubado em 1974 e tomou seu lugar uma ditadura comunista apoiada pelos soviéticos. O ditador Mengistu Haile Mariam, que governou o país com punho de ferro entre 1977 e 1991, foi condenado à morte por crimes de guerra e vive em exílio no Zimbábue.

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Com a queda da União Soviética, o regime parou de receber apoio militar e também caiu, tendo início em 1991 a república federativa democrática que dura até os dias de hoje. Naquele mesmo ano, a Eritreia finalmente conquistou sua independência, formalmente reconhecida dois anos mais tarde.

O problema é que o histórico dos dois países, nesse ponto, já não era tão amigável assim – o interesse de expandir fronteiras era histórico, e só complicou mais as coisas na hora de delimitar que porções do território ficariam com qual país. Foi esse o processo que, afinal, culminou na guerra do fim da década.

O vencedor do Nobel, em si

Abiy Ahmed Ali ganhou o Nobel da Paz pelo acordo com a Eritreia, mas também é famoso por outros motivos. Primeiro, por ser o mais jovem chefe de estado dos países africanos: tem 43 anos. E, segundo, por aplicar medidas democráticas para modernizar o histórico político complicado da Etiópia: Abiy concedeu anistia a dissidentes políticos, libertou jornalistas encarcerados, nomeou mulheres para 50% dos cargos de seu gabinete e encabeçou a campanha para o plantio de 350 milhões de árvores na Etiópia.

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Com carreira no exército etíope e especialista em inteligência cibernética, Abiy alcançou o posto de tenente-coronel antes de entrar para a política em 2010. Na adolescência, se envolveu na resistência contra o regime de Mengistu Haile Mariam. Além da trajetória militar, é mestre em liderança transformacional e doutor em estudos pela paz e segurança.

Foi ministro da ciência e tecnologia antes de assumir o poder e mediou conflitos entre cristãos e muçulmanos através da criação de um fórum de diálogo religioso. “Sinto-me honrado e empolgado… muito obrigado. É um prêmio concedido à África, à Etiópia, e posso imaginar como os demais líderes africanos vão receber isso positivamente para trabalhar no processo de construção da paz em nosso continente”, declarou Abiy sobre o Nobel.

Outros cotados ao Nobel da Paz deste ano foram a adolescente e ativista climática sueca Greta Thunberg, a chanceler alemã Angela Merkel e os ativistas pró-democracia de Hong Kong. Desde 1901, ao todo 99 indivíduos e organizações foram laureados com a honraria que busca promover a paz mundial. A cerimônia de entrega da medalha, do diploma e do prêmio de US$ 900 mil será realizada em Oslo, capital da Noruega, no mês de dezembro.

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