O genoma é uma versão química dos manuais do proprietário dos carros 0 km: ele traz todas as instruções necessárias para montar e fazer funcionar o seu corpo. Em maio deste ano, depois de dez anos de trabalho, a ciência identificou todas as letras desse livreto. Que não é pequeno: se fosse escrito em folhas de sulfite, teria a grossura de 200 listas telefônicas com 1 000 páginas cada uma.
Os cientistas não podem ainda ler o genoma porque, mesmo depois de achar suas letras, não dominam com fluência o idioma empregado pelas células – o quimiquês. “A tradução completa”, afirma o geneticista brasileiro Crodowaldo Pavan, da Universidade de São Paulo, “vai consumir 20 anos”.
Ele também diz que, nesse meio tempo, o vocabulário genético certamente vai crescer e revelar dados que mudarão para sempre o nosso modo de vida.
Um gene, um pedaço de DNA, é uma instrução completa sobre o funcionamento do organismo e executa uma tarefa específica, como determinar a cor do olho ou a forma do nariz
Mapear o genoma significa identificar milhares de substâncias pequenas que compõem o DNA. São designadas pelas letras A, C, G e T (siglas de adenina, citosina, guanina e timina)
O organismo humano tem cerca de 50 000 genes (ainda há dúvida sobre o total). Eles se compõem de 3,1 bilhões de pedaços pequenos de DNA, designados pelas letras A, C, D e T. Se fossem enfileirados, mediriam 1,5 m de comprimento.
Para saber mais
https://www.ornl.gov/hgmis/project
Para que serve o mapa do genoma?
Trata-se de uma espécie de guia. Como o mapeamento revelou a composição química de todos os genes, ele vai ajudar os cientistas a descobrir exatamente como os genes trabalham.
Ele pode levar à cura do câncer ou do diabete?
Já se conhecem quase 4 000 enfermidades associadas aos genes. Entre elas, o diabete e alguns tipos de câncer, como o da mama e o do cólon. Os médicos estão estudando centenas desses genes patogênicos para tentar corrigir os seus “defeitos” e, com isso, eliminar as doenças provocadas por eles.
Só as doenças hereditárias podem ser combatidas?
Não. Muitos males aparecem quando os genes são danificados por toxinas como o alcatrão do tabaco, ou por radiação, como sol em excesso. Esses danos poderão ser reparados. É possível até implantar genes que estimulem o crescimento dos ossos e soldar fraturas.
É viável ressuscitar animais extintos, como o tigre-da-Tasmânia ou a ave Dodô?
Desde que se encontre material genético bem preservado desses animais, seus genes poderão ser colocados em uma célula que se reproduzirá por meio da clonagem e se tornará um embrião. O filhote nascerá de uma mãe de aluguel. O que já se aprendeu com o mapeamento do genoma ajudará muito.
E clonar gente?
A experiência nunca foi feita, mas é possível. Em princípio, pode-se até congelar os genes de um cidadão e “ressuscitá-lo” após a morte. Não será a mesma pessoa: só o corpo é copiado na clonagem.
Dá para largar o álcool ou aumentar a inteligência?
Como tudo no corpo funciona sob o comando dos genes, nada impede que se implante nas células de alguém uma “ordem” que corte os vícios de beber e de fumar, ou que aprimore os dotes intelectuais de um indivíduo. O desafio será encontrar os genes exatos para a tarefa certa.