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Tudo por um bicho

Sean Gifford, o diretor de campanhas do PETA na Europa, diz por que é capaz de ir contra a lei para defender os direitos dos animais

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h35 - Publicado em 30 jun 2003, 22h00

Cindy Wilk e Aric Denfield

Nos últimos quatro anos, os jornais britânicos noticiaram várias histórias polêmicas ligadas a Sean Gifford, diretor de campanhas do braço europeu do PETA (Pessoas pela Ética no Tratamento de Animais), uma das maiores organizações de defesa dos direitos animais do mundo. Em maio deste ano, ele e dois colegas – um deles vestido de vaquinha – planejaram tombar um caminhão de esterco na frente de um evento de produtores de carne na Escócia. A confusão foi grande, embora a quantidade de esterco esparramado não desse para encher um copo. Acabaram levados para a delegacia. Gifford também foi responsável por uma campanha em escolas do Reino Unido que tinha como objetivo fazer as crianças pararem de tomar leite. Em um dos colégios, na Escócia, ele e outro amigo (também vestido de vaquinha) foram cercados por pelo menos 100 estudantes e atacados com sacos de leite. Dessa vez, ele foi salvo pelos policiais.

Ações como as de Gifford rendem ao PETA cada vez mais notoriedade. Em 1989, a organização conseguiu levar a julgamento o psicólogo americano Edward Taub, acusado de torturar macacos nas experiências feitas em seu laboratório. O caso chacoalhou a comunidade científica e levantou a questão de até que ponto os direitos dos animais podem interromper pesquisas científicas. Também deu ao PETA um grande número de inimigos, que acusam a organização de barrar o progresso, destituir o consumidor de seu direito de escolha e promover o que chamam de ecoterrorismo.

Por outro lado, o PETA agrega a cada dia mais gente e doações. No ano passado, a receita da instituição – que diz contar com 750 mil membros nos EUA, Inglaterra, Alemanha e Índia – foi de 13 milhões de dólares. A maior parte desse dinheiro é empregada em campanhas publicitárias extremamente agressivas e polêmicas. Em uma das últimas, eles comparam fotos de judeus em campos de concentração com animais na indústria alimentícia. A intenção era comover a comunidade judaica, mas o resultado foram protestos indignados, principalmente do Museu do Holocausto, em Washington, Estados Unidos, de onde a organização comprou as fotos dizendo que seriam usadas para fins educativos. “Estamos usando as imagens legitimamente e vários judeus dizem que apóiam a campanha”, afirma Gifford, que parece não se incomodar com a polêmica. “Não temos o menor problema em correr riscos”, disse ele à SUPER.

Em que momento você começou a se interessar pelo movimento em defesa dos animais?

Decidi trabalhar com animais pois eles não podem falar. São muito mais vulneráveis e precisam de proteção. Com 14 anos, li Libertação Animal, de Peter Singer, que trazia fotos de animais sofrendo em gaiolas. Depois disso nunca mais consegui comer carne. Mas só fui me ligar diretamente ao PETA há quatro anos. Nós acreditamos que os animais não devem servir como comida ou vestimenta. E muito menos serem usados como entretenimento ou para experiências científicas. Já em relação a animais de estimação, não temos problema nenhum.

Em que vocês se baseiam para dizer que seres humanos não são melhores que os animais?

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É claro que os animais não têm a mesma capacidade de raciocínio dos seres humanos. E eles também não têm os mesmos desejos que nós temos mas, assim como nós, eles são capazes de sentir dor. Nós matamos por prazer e diversão.

Os seres humanos não precisam de carne em suas refeições?

Nossa alimentação tem nos deixado doente. Um estudo americano mostrou, principalmente entre os homens, uma alta incidência de doenças cardíacas que não foram encontradas na mesma proporção entre os vegetarianos. A carne orgânica é um pouco melhor, uma vez que não contém todos esses produtos químicos e pesticidas, mas o problema permanece, já que não fomos desenhados para absorver tanta proteína. É isso que causa o câncer.

Mas no Japão, onde a base da alimentação é peixe, a estimativa de vida é uma das mais altas do mundo…

Outros fatores devem influenciar também. Não estou muito certo.

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Se, em um país como o Brasil, o governo distribuísse carne e leite para a população carente, você concordaria?

De forma alguma. Alimentar o povo com carne é totalmente ineficiente. Você consegue muito pouca caloria em retorno à quantidade gasta para alimentar os próprios animais. Isso é pensar de uma forma carnívora. Há outras opções.

Por que vocês fazem manifestações contra o leite voltadas às crianças?

O corpo não consegue processar os laticínios e isso causa diabetes. O leite serve para bezerros se transformarem em grandes e pesadas vacas, não para o consumo humano. As únicas pessoas que podem questionar isso são as que trabalham para a indústria de laticínios. Essas empresas gastam bilhões de dólares em propagandas endereçadas às crianças. Por que não poderíamos fazer o mesmo? Além do mais, as crianças são muito mais sensíveis ao sofrimento dos animais.

Aquelas crianças que o atacaram na escola escocesa não pareciam ter se sensibilizado…

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Por mais que elas tenham reagido, aposto que pensaram no assunto ao voltarem para casa.

O PETA, sem dúvida, alcançou uma posição de destaque entre as entidades de direitos dos animais. Como vocês chegaram lá?

Não temos medo de fazer as pessoas se sentirem desconfortáveis. O público precisa ser chocado para entender o nosso recado. Podemos dizer que temos muito pouco recurso em comparação a grandes companhias que gastam literalmente bilhões de dólares em propaganda. Nós temos de arranjar um jeito de competir com eles. Nós fazemos protestos pacíficos e nos disfarçamos para investigar empresas. Mas, de vez em quando, também desobedecemos as leis.

O PETA é acusado de usar pouco das doações em programas para cuidar de animais abandonados. Isso é verdade?

Gastamos 250 mil dólares por ano esterilizando bichos gratuitamente. O objetivo é diminuir o número de animais soltos nas ruas. Acreditamos que a prevenção é melhor que a cura.

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Em 1990, Fran Stephanie Trutt, uma ativista pelos direitos dos animais, foi acusada de tentar matar com uma bomba o presidente de uma indústria farmacêutica nos Estados Unidos. O PETA pagou as despesas legais. Por quê?

Todos têm direito a um julgamento justo.

A presidente e co-fundadora do PETA Ingrid Newkirk disse que, se a cura da aids depender de pesquisas em animais, ela não será válida. Você concorda?

Cada um tem seu ponto de vista.

Mas, se você fosse HIV positivo, tomaria o medicamento?

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Sim, eu tomaria. Meu pai, inclusive, sofreu uma operação cardíaca que foi desenvolvida a partir de testes em animais. Mas nenhum desses experimentos faz sentido. Testes com animais não são capazes de mostrar o que acontece no ser humano.

Sean Gifford

• Tem 28 anos e mora em Londres

• Trabalhava com educação infantil antes de se filiar ao PETA

• Vive de fazer manifestações pelos direitos dos animais

Frase

Não temos medo de fazer as pessoas se sentirem desconfortáveis. O público precisa ser chocado para entender o nosso recado

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