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Alexandre Versignassi

Por Alexandre Versignassi Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Blog do diretor de redação da SUPER e autor do livro "Crash - Uma Breve História da Economia", finalista do Prêmio Jabuti.

A gata de Schrödinger

“Cê não vai acreditar”, me diz a mineirinha espevitada, num café em Viena. “Fala aí, Gabi.” “Então, quando eu estava na escola, a gente fez uma daquelas provas, tipo teste para o vestibular. Depois saiu lá, na parede: `Segundo lugar: Gabriela. O primeiro colocado era aquele mais nerd. O típico, que não falava com ninguém. […]

Por Alexandre Versignassi Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 21 dez 2016, 09h49 - Publicado em 10 jun 2015, 20h06

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“Cê não vai acreditar”, me diz a mineirinha espevitada, num café em Viena.

“Fala aí, Gabi.”

“Então, quando eu estava na escola, a gente fez uma daquelas provas, tipo teste para o vestibular. Depois saiu lá, na parede: `Segundo lugar: Gabriela. O primeiro colocado era aquele mais nerd. O típico, que não falava com ninguém. Torto. Aí uma menina virou pra mim e falou: `Ei! Não sabia que você era inteligente, não!”.

Justo. Se você topasse com a Gabi em alguma balada, ou no Carnaval de rua do Rio, que ela faz de tudo para não perder, não desconfiaria que a baixinha faladeira é uma das cientistas mais promissoras do País: a Ph.D. Gabriela Barreto Lemos, 32 anos, da Universidade de Viena. Ela é uma especialista em ótica quântica, o ramo da física que estuda os fótons – as partículas de energia que formam a luz. Gabi, diga-se, é tão radiante quanto seu objeto de estudo.

Tanto que, se as outras crianças estranhavam alguma coisa nela na escola, era justamente a verborragia. “Me achavam doida, muito expansiva.” Como quem fala demais dá bom-dia para cavalo, a pecha que acabou pegando não foi a de nerd, mas a de avoada. “Pensavam que eu era uma… Lembra daquele Sai de Baixo, que tinha a Magda? Então, achavam que eu era uma Magda, meio dãã. Mas eu não ia ficar divulgando as minhas notas pela escola, né?”.

Hoje ela divulga. E para bem além de qualquer escola. Gabi ficou famosa no meio über nerd da física quântica, por conta de um experimento mágico que saiu do laboratório dela.

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Um laboratório bagunçado, mas bem equipado, que fica no subsolo de um prédio tão peculiar quanto as coisas que a Gabi estuda lá dentro. O lugar foi erguido em 1908 para abrigar pesquisas de outro ramo da física, inaugurado por outra mulher: a radiação, descoberta poucos anos antes, por Marie Curie. O prédio, que ainda tem resquícios de radiação em algumas salas, hoje é lar do Instituto de Ótica Quântica da Universidade de Viena, e fica na Boltzmanngasse, uma rua calma, que parece parada no tempo em que a cidade era capital do Império Austro-Húngaro.

Apesar de Viena ter o melhor transporte público do mundo, com folga, Gabi vai trabalhar de bicicleta. Sempre. Faça sol ou faça nevasca, como a que caiu no dia em que a gente se encontrou pela primeira vez. Desabava uma tempestade de neve daquelas de deixar jipe encalhado (e repórter brasileiro com febre). Mas para ela não era problema. “Meu namorado falou que eu ia morrer se viesse pedalando hoje. Mas eu vim, hahaha.” O bicicletário em frente ao número 3 da Boltzmanngasse é sempre lotado. Naquele dia polar, só tinha a dela.

E não é só no pedal que a moça enfrenta o que aparecer pela frente. A carreira acadêmica dela que o diga: mestrado aos 24 anos, pela UFMG. Aos 28, doutorado pela UFRJ. O pós-doutorado veio ainda aos 30, também pela Federal do Rio. Tudo isso sempre lidando com assuntos capazes de deixar até os melhores físicos com febre, tipo estudar qual é, afinal de contas, o real papel dos sistemas caóticos no processo de decoerência quântica. Hard science é isso aí.

Gabi lida com o mundo microscópico, mas gosta de pensar grande. Quanto mais complexo for o problema, melhor. Por essas, o trabalho dela não demorou para começar a chamar a atenção no exterior. E a repercussão lhe deu estofo para se candidatar a uma vaga concorrida, em 2012: uma bolsa para trabalhar na Universidade de Viena, meca da ciência, que está para a ótica quântica como o MIT está para a engenharia ou a Sorbonne para a filosofia. E o melhor: tudo isso com liberdade para fazer os experimentos que quisesse, com orçamentos generosos e colaboradores de primeira linha.

Rolou a vaga. E agora ela trabalha no Instituto de Ótica Quântica da universidade, sob a tutela de um dos maiores físicos vivos: Anton Zeilinger. Aos 69 anos, ele é a grande esperança austríaca para o tetra no Nobel de física. E a química entre os dois bateu na hora: “Você dá as ideias mais doidas para o Anton e ele fala: `Isso aí tá muito modesto… Tem que pensar mais alto¿”. Falar isso para a Gabriela é jogar gasolina no fogo. Tanto que foi numa conversa com Anton, no mesmo café vienense do começo deste texto, que veio a ideia daquele experimento revolucionário, o que fez os olhos dos físicos do mundo se virarem para ela no ano passado.

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Vamos brincar de Sherlock Holmes para entender o que ela conseguiu. Primeiro eu mostro a cena do crime – quer dizer, o resultado do experimento. Depois a gente olha as pistas e desvenda o que realmente aconteceu.

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A experiência foi toda nesta mesa de Ótica Quântica aqui em cima, onde ela trabalha todos os dias. Mas, para a gente visualizar melhor, imagine comigo outro cenário. Assim: você entra numa casa. Passa pelo corredor e vê dois quartos iguais, um de cada lado, cada um com uma cama de casal. No quarto da direita, tem um gato em cima da cama. No da esquerda, só a cama, sem gato. Então você pega e tira uma foto do quarto da esquerda, o que só tem uma cama vazia. E quando olha para a imagem vê um gato ali. Justamente o gato do outro quarto. Você simplesmente não fotografou o bicho. Mas o gato do outro quarto surgiu na sua foto, do nada. De certa maneira, foi isso que ela fez. No infográfico lááá embaixo você vê como é que tudo aconteceu de verdade, na mesa do laboratório, com os lasers e espelhos envolvidos no experimento, além do gato, que na vida real era só um molde milimétrico de cartolina. Mas não importa. Esse cenário da casa descreve a mesmíssima coisa. O que aconteceu, então?

A solução só fica elementar, meu caro leitor, se você tiver uma pista que ainda não foi dada: saber que o experimento envolveu entrelaçamento quântico. Para quem não conhece a coisa, vai aqui uma aula-relâmpago. Você pega um fóton e divide em dois. O que surge é um par de fótons menores (com menos energia que o primeiro). Mas não fica nisso.

Esses dois fótons, por algum motivo, vão passar o resto da vida ligados. Se você der um cutuco em um, o outro vai se mexer também. Instantaneamente. E não importa a distância que separe um do outro. Mesmo: se você pegar um deles e levar para a Áustria, enquanto o outro fica quietinho no Brasil, a conexão continua idêntica: mexeu no daqui, o de lá “sente”. Pode levar o troço até Plutão que dá na mesma. A comunicação continua instantânea.

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Está dada a pista. Se quiser parar de ler agora para pensar como isso leva à solução do nosso caso, pode parar. Eu espero…

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Voltei. E a resposta é a seguinte: os fótons que formavam a luz dos dois quartos eram irmãos. A imagem do gato no quarto da direita “cutucou” uma parte dos fótons que estavam ali. Nisso, seus fótons irmãos, no outro quarto, responderam à perturbação de forma idêntica, formando a imagem de um gato. De novo: quem refletiu no gato foi a luz do quarto da direita. Só que a Gabi tinha dado um jeito de entrelaçar essa luz com a do outro quarto (no infográfico dá para entender como ela fez isso no laboratório). Graças a essa condição quase sobrenatural, os fótons do quarto da esquerda passaram a formar a imagem de um gato. Um gato que não estava lá. E Gabi tirou uma foto dele.

Para visualizar a versão real do experimento, é só olhar aqui em cima. Quem faz o papel da luz de cada um dos quartos são dois feixes de raio laser (representados no infográfico lá embaixo em amarelo e vermelho), devidamente entrelaçados. Um laser passa pelo molde de cartolina recortado na forma de gato, e vai para o lixo. O outro passa longe do gato, e segue rumo à câmera. Pronto: a imagem que surge no visor é a do gato, que estava gravada no molde de cartolina. Uma imagem com a qual os fótons do laser vermelho nunca interagiram. Parece insano. É insano. Mas deu certo.

Zeilinger dá a dimensão do feito: “Antes, você precisava coletar os fótons que vieram do objeto para fazer uma imagem dele”, o físico disse para a revista científica Nature. “Agora, pela primeira vez, você não precisa mais”. A Nature, para quem não sabe, não é exatamente uma “revista”, como esta aqui, mas um periódico para o qual os cientistas mandam artigos técnicos relatando seus experimentos.

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Dos milhares que chegam todos os dias às mãos dos editores, que também são cientistas, nem meia-dúzia são considerados relevantes o bastante para sair ali – até porque a Nature é a publicação científica mais respeitada do mundo, não dá mole para mané. E o experimento do gato não só entrou ali, como foi um dos mais comentados de 2014. Sem falar que, na apresentação do artigo, os editores chamaram a atenção para o fato de que Gabriela tinha conseguido “algo que parecia impossível”. Não é todo dia que a Nature diz algo assim. Tão impossível que a própria Gabriela não tinha certeza se conseguiria fazer com que o gato fantasma aparecesse de verdade. “Eu falei para a designer que fez o molde: `Olha: tem que ser um gatinho bem simples, porque esse negócio vai parecer um borrão¿”, ela me contou, enchendo a boca.

O receio era porque a experiência toda precisava de uma baita sintonia fina para dar certo: escolher o laser certo, calibrar tudo de modo que ele realmente produzisse fótons entrelaçados (o que acontece quando o raio passa por um cristal, que quebra cada um dos seus fótons em dois). Isso mais a parafernália de espelhos e filtros que o povo da ótica quântica tem de usar para domar seus fótons. Não se trata de um trabalho de dias, mas de meses. E, como ela estava lidando com um experimento inédito, qualquer problema que surgia no laboratório parecia insolúvel. “Ah, mas aí eu baixo o Sherlock Holmes”, diz Gabi, que, naturalmente, é fã do detetive (“Adoro! A série nova é perfeita! Já li tudo, vi a série velha, a nova, o…”).

Voltando para a ciência: “Estou lá no laboratório e vejo que alguma coisa no experimento tá estranha, diferente. Não deveria estar acontecendo. Aí eu imagino tudo como se fosse a cena de um crime”. Então, do mesmo jeito que um menino grita o nome de algum goleiro quando pula para defender uma bola, a Gabi fala: “Sherlock Holmes!”. Com o espírito do personagem devidamente baixado, ela vai buscar uma solução. “Os meninos morrem de rir. Me acham com-ple-ta-men-te doida.” Quando um dos “meninos” (os colegas e estudantes que ajudam nos experimentos) sugere alguma solução que parece prematura, ela ensina: “Calma… A gente tem que ser Sherlock. Vamos pensar, pensar…”.

Pelo jeito, a tática funciona mesmo, porque em seis meses (pouco, para os padrões da física experimental) lá estava o gato. “Estava obcecada. Uma aluna tinha me chamado para escalar montanha com ela. Queria que eu relaxasse. E eu disse: “Não vou. Estou sentindo que tá chegando…”.

Estava mesmo. Dez da noite a Gabi liga para a amiga: “Aaaaahhhh! Tô vendo o gatinho!”, ela revive o momento para mim, feliz. E lembra que o resultado foi bem melhor que o tal do borrão que ela mesma esperava. “Deu para ver até o rabinho, hahaha.” Rabinho, orelhinha… Exatamente como a gente reproduz aqui à esquerda. Não parece, mas a resolução da imagem é excelente para uma técnica que acaba de nascer – e que flerta com as fronteiras do conhecimento humano, porque a própria ciência simplesmente não explica como o entrelaçamento funciona. Só sabe que a coisa existe. “Tem uma troca de informação entre os fótons ali. Mas por onde essa informação passa? Onde ela vai estar se eu quiser localizá-la?”, Gabi se pergunta.

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Ela talvez passe a vida sem saber, porque precisamos de toda uma nova ciência, que vá muito além da física quântica de hoje, para termos uma resposta. Mas a ciência é assim mesmo. Isaac Newton, ao formular a teoria da gravitação, disse, modestamente, que tinha pouco dele ali. Que, na verdade, estava “sentado no ombro de gigantes” – os gênios que tinham vindo antes dele, abrindo trilha a facão na mata da ciência. E Gabi, do alto do seu 1,55 m, já mostrou que é uma desbravadora de braço forte.

Uma exploradora que, por sinal, aproveitou seu experimento para homenagear um gigante do calibre de Newton: Erwin Schrödinger. Em 1935, o austríaco bolou uma experiência imaginária para deixar claro o quão bizarras eram as leis da física quântica, muitas das quais ele mesmo tinha descoberto. Schrödinger mostrou que, sob uma condição bem específica, um gato dentro de uma caixa estaria em dois lugares ao mesmo tempo: morto, deitado na caixa, e vivo, de pé**. Bom, ao escolher a imagem que queria para protagonizar seu experimento, Gabi acabou dando vida ao gato de Schrödinger. Colocou um gato “em dois lugares ao mesmo tempo”, afinal de contas.

Ironicamente, o que era para ser uma referência a Schrödinger acabou dando um caráter de fofura a um experimento que, de outra forma, pareceria sisudo. Foto de gato, afinal, sempre chama a atenção: seja no Instagram, seja na Nature. “Não saquei que ia causar tanto auê. A gente achava que a repercussão grande mesmo seria só com o nosso próximo experimento.”

Sobre esse próximo, em que ela está trabalhando agora, a mineira dá uma de mineira: fica quietinha. Não abre a boca. Mas, se a coisa está sendo feita no laboratório da nossa gata de Schrödinger aqui, uma coisa é certeza: quando sair, cê não vai acreditar.

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(clica aqui no quadro pra ver direito; é o infográfico da experiência)

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Bom, esta aqui é uma versão bem simplificada. Ela descreve o básico do que aconteceu no laboratório, só que é mais para ler no metrô mesmo.  A versão complexa segue aqui:

 

O EXPERIMENTO – VERSÃO COMPLETA

A base da coisa toda é um experimento criado há mais de 100 anos, em 1909, e que em 2002 foi eleito como “o mais bonito de  todos os tempos” pelos leitores da revista Physics World. Funciona igual na imagem aqui embaixo: você tem um lançador de elétrons; na frente dele, uma chapa de metal com uma fenda e, mais adiante, um sensor que vai detectar as partículas que batem ali. Os elétrons não podem atravessar a chapa de metal, claro. Então eles só têm um caminho para seguir: por dentro da fenda. É a única possibilidade de trajetória rumo ao sensor. E o que acontece é o óbvio. Isto aqui:

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Mas com uma mudança sutil no cenário tudo muda de figura. Em vez de uma fenda, agora, vamos colocar duas. O óbvio aí seria aparecer duas faixas com elétrons no sensor lá atrás. É o que a física clássica diz. Mas não a física quântica. E quem governa o mundo das partículas subatômicas é a quântica. O que aparece no sensor quando a chapa tem duas fendas não são duas faixas, mas várias.

E num formato singular. Os elétrons agora aparecem desse jeito que você vê aqui embaixo, mais concentrados em alguns pontos do que em outros. Não é pouca coisa. Os físicos chamam esse tipo de disposição de “padrão de interferência de onda”.

O problema é que o elétron é uma partícula, não uma onda. Mas, se apareceu um “padrão de interferência de onda”, significa que não, que os elétrons “viraram” ondas de alguma forma. E ondas interferem umas com as outras. Jogue duas pedras num lago, ou dois sabões de coco no tanque, na falta de um lago, e você vai ver ondas, uma se batendo com a outra, ou seja, uma interferindo na outra. É o que acontece aqui. O elétron não se transforma numa pedra jogada no lago, ele se transforma nas próprias ondas que aparecem quando você joga as pedras. Não faz sentido. Mas é exatamente o que acontece. Olha a onda:

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Aconteceu o seguinte aqui em cima. Pelas leis da física quântica, quando existe mais de uma possibilidade de trajetória para uma partícula, ela vai usar as duas ao mesmo tempo. E para usar as duas ao mesmo tempo o elétron “se transforma em onda” (os físicos preferem dizer “assumem caráter ondulatório”, o que significa a mesma coisa).

O mais louco é que, se você lançasse um único elétron por vez na chapa, ele sozinho passaria pelas duas fendas e iria interferir consigo mesmo. Esse é o ponto: todo e cada elétron passa pelas duas fendas, e sai delas em forma de onda – como se fosse um terceiro irmão dos Supergêmeos, do desenho dos Superamigos; só que, em vez de se transformar em água, vira onda. Simples, não? Não, não é simples. Mas, de novo, é a realidade. O mundo subatômico nasceu assim, cresceu assim e vai ser sempre assim.

Ah, mas essa transformação em onda só acontece sob uma condição: se “não tiver ninguém olhando”. Assim: se você achar que essa história de passar pelas duas fendas ao mesmo tempo só pode ser mentira, basta colocar um detector em cada fenda para saber se o elétron vai mesmo “se transformar em dois” e passar pelas duas fendas ao mesmo tempo. Fácil. Só tem um problema: a simples presença do detector vai quebrar o caráter ondulatório. Só de “saber”  que tem alguém “olhando”, ou seja, que existe um detector ali, o elétron volta a virar partícula. E a imagem que se forma no sensor não tem padrão de interferência de onda nenhum. Ficam só duas faixas, numa versão em dobro da figura 1. Boring. Mas se você não aborrece o elétron com a presença de um detector, tudo certo: vai ter onda. E a presença do padrão de interferência de onda no sensor ali atrás prova por A + B + C que, sim, o elétron passou pelas duas fendas ao mesmo tempo, e interferiu consigo mesmo enquanto existiu na forma de onda.

Este parágrafo aqui em cima é fundamental para a gente entender o experimento da Gabi, porque o dela é uma grande recriação do experiência da fenda dupla. No lugar dos elétrons, você tem outro tipo de partícula: fótons (concentrados na forma de laser); em vez de duas fendas, você tem dois cristais. E cada fóton vai passar pelos dois ao mesmo tempo.  No lugar do sensor, aquele que fica logo depois da chapa de metal no experimento das fendas, você tem uma câmera digital (igual uma câmera comum, que nada mais é do que um sensor de fótons). Tudo isso mais a imagem do gato ali no meio, a mesma que você viu na matéria da SUPER.

Aí rola o seguinte: o canhão de laser solta um pulso de luz na direção de um espelho. Bom, esse espelho é especial. Às vezes ele reflete o laser, às vezes, deixa passar. E não dá pra saber quando vai acontecer o quê.

Nisso, o caminho que cada pulso de luz vira uma incógnita, igual o caminho de cada elétron no experimento das fenda duplas. Incógnita mesmo: o cristal 1 e o cristal 2 aqui embaixo produzem um laser vermelho e um infravermelho sempre que o laser verde passa por um deles. O laser infravermelho, diga-se, aparece em amarelo aqui, já que o infravermelho é uma “cor” (uma frequência de onda eletromagnética) invisível. Bom, quem chega ao detector é sempre, sempre, um raio vermelho. Só que o observador, o cientista, não tem como saber se o raio vermelho foi produzido no cristal 1 ou no 2. Aqui dá para entender melhor:

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Agora, pensa comigo: o que acontece quando o observador não tem como saber se uma partícula vai passar por um caminho ou pelo outro? Ela passa pelos dois caminhos simultaneamente. No experimento das fendas, as partícula são elétrons. Aqui, são fótons. Mas dá na mesma. E o que acontece quando uma partícula passa pelos dois caminhos? Ela vira uma onda! O cristal 1 e o cristal 2 fazem o papel das fendas, certo?  Então as ondas, nesse caso, “emanam”  dos cristais. Parece exotérico, mas não é:

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É aí que vem o pulo do gato. Quem forma a imagem do gato lá na câmera é a interferência de onda entre cada fóton que passa ao mesmo tempo pelos cristais 1 e 2. E a imagem que se forma lá no senso tem todo aquele estilo de uma interferência de onda: alguns fótons aparecem ficam mais concentrados nuns pontos do sensor do que em outros, igual os elétrons do experimento das fendas. O gato de cartolina acaba funcionando, grosso modo, como uma terceira fenda, e empresta seu formato ao jeito como os fótons vão aparecer organizados no sensor. Já a interferência entre os cristais 1 e 2 vai fazer com que apareçam várias “faixas”, igual no experimento da fenda dupla, cada uma com uma concentração diferente de fótons. A diferença é que, neste caso, as faixas têm forma de gato. Seguem o padrão da figura recortada na “terceira fenda”, que é a cartolina ali no meio.

Some isso ao fato de que os fótons do laser vermelho, como está claro na versão simplificada do infográfico, lá em cima, nunca passam pelo gato. De alguma forma a informação da imagem do gato fluiu dos fótons infravermelhos para os vermelhos  nesse emaranhado de ondas. E isso só acontece porque os fótons que saem do cristal 1 estão entrelaçados. O que um sente ou outro sente também. Os fótons infravermelhos passam pelo gato e vão para o lixo. Os vermelhos “sentem” de alguma forma essa passagem e levam a informação para a câmera.

Mas de que forma eles “sentem” a passagem dos outros fótons pelo gato? De novo: a ciência não faz ideia. Precisamos de um novo Planck, outro Heisenberg, mais um Schrödinger, talvez um Isaac Newton… Cada um desvendando um pedaço desse mistério ao longo dos próximos séculos. Aí, quem sabe, algum Einstein do próximo milênio junte tudo e venha com a resposta. Enquanto esse dia não chega, nos resta contemplar a insanidade da natureza quântica. E o experimento que você viu aqui uma das mais bonitas dessas contemplações.

———–

** NOTA DE RODAPÉ: O “Gato de Schrödinger”, pra quem não tem essa referência, é o protagonista de um experimento imaginário, criado em 1935: a física quântica diz que uma partícula pode existir em vários lugares ao mesmo tempo, ao menos quando não tem ninguém “olhando” para ela. Na hora em que a partícula é observada (ou seja, na hora em que um sensor detecta a dita cuja), ela assume uma única posição. É o que dita a física quântica. Bom, então você vai e coloca uma partícula, um gato e um frasco de gás tóxico numa caixa. A posição da partícula pode acionar um martelo, e determinar se o frasco vai ser quebrado ou não. Enquanto você não abre a caixa, então, a partícula estará em vários lugares ao mesmo tempo. Ou seja: vai acionar e não acionar o martelo. E o gato estará vivo e morto simultaneamente. Só quando você abre a caixa uma das duas realidades se impõe.

 

 

 

 

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