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Alexandre Versignassi

Por Alexandre Versignassi Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Blog do diretor de redação da SUPER e autor do livro "Crash - Uma Breve História da Economia", finalista do Prêmio Jabuti.

O (falso) plano da China para destruir o dólar

A moeda chinesa está cavando seu lugar na economia global, mas não tem como ferir a moeda americana.

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Atualizado em 3 jan 2018, 16h26 - Publicado em 3 jan 2018, 16h26

Tem uma notícia fake circulando com força nas timelines de quem acompanha economia: a de que a China está fazendo acordos para comprar petróleo em troca de ouro – de modo a destronar o dólar como moeda de referência nesse mercado. A China pagaria com yuans, diz a notícia falsa, mas a moeda chinesa passaria a ter uma conversão automática em ouro, garantida pelo governo – como acontecia com o dólar até 1971, e com outras moedas antes de 1944.

Essa conversa, que costuma aparecer nas timelines na forma de um vídeo em espanhol, tem uma fonte só: um artigo que saiu no Nikkei Asia Review – ele próprio sem fonte nenhuma. A conclusão do tal vídeo é que esse movimento vai fazer com que o dólar deixe de existir como moeda. O dólar perderia seu lastro em petróleo, e decairia numa espiral inflacionária igual a que matou tantas moedas por aqui.

O mercado de petróleo é todo baseado em dólar. Fato. Se vc quiser comprar um barril na Arábia Saudita, não adianta levar reais, nem euros. Você precisa levar dólares. É um acordo que a família real saudita fez com os EUA em 1974: em troca de armas e de defesa militar, prometeram aceitar só dólares e, mais importante, reinvestir esses dólares em títulos de dívida do governo dos EUA. Na prática, quase todo o dinheiro que as empresas americanas usam para comprar petróleo saudita volta para os EUA. Todos os países do Oriente Médio passaram a fazer o mesmo. Em 2000, porém, o Iraque decidiu vender petróleo só em euros. Em boa parte por conta disso virou o bode expiatório do 11 de setembro, o que dá uma ideia da importância do sistema para a economia americana.

Mesmo assim, a China realmente está fechando cada vez mais acordos de compra de petróleo em yuans. Ela tem bala para isso, em todos os sentidos. Já fez isso com o Irã e com a Rússia. Claro que os EUA não gostam. Isso diminui a demanda por dólares, o que machuca o valor da moeda, e, pior, quebra o fluxo do retorno desses dólares para o solo americano.

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(Nerthuz | iStock)
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Por outro lado, o yuan não tem a liquidez do dólar. Vá de ônibus para o Paraguai com uma mala cheia de dólares, e vc volta dirigindo uma Mercedes. Vá com uma mala de yuans, e vc provavelmente vai voltar com ela, já que não vai achar comprador tão fácil para as notas.

A troca instantânea por ouro viria para conferir essa liquidez universal. Mas não tem como. A China possui US$ 800 bilhões em ouro. Isso pagaria seis ou sete anos do que eles importam de petróleo (foram US$ 116 bilhões só em 2016, com o óleo barato). Os EUA têm seu acordo com a Arábia Saudita há 44 anos. Ou seja: o ouro de Pequim não daria conta. E o governo chinês sabe fazer contas. Sabe disso perfeitamente. Tal como sabe que a Arábia Saudita não daria uma bundada nos EUA. Mesmo para a China não interessa uma derrocada do dólar. Os caras possuem US$ 3 trilhões em suas reservas internacionais. Não têm o menor interesse em ver esse valor sumir em meio a uma eventual espiral inflacionária da moeda americana.

O que lastreia o dólar, no fim das contas, nem é o petróleo. É o PIB dos EUA. São produtos e serviços que você pode adquirir dentro do território americano em troca de dólares americanos. Esses produtos e serviços representam quase 25% do PIB mundial (são US$ 19 trilhões, contra um PIB global de US$ 80 tri).

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Diante disso, é parte da natureza que o dólar seja uma moeda com status de mercadoria, algo que você consegue comercializar em todos os países (diferentemente das moedas ordinárias – salte de paraquedas no interior da Mongólia com 5 milhões de reais na mochila, e morra de fome). O euro também vale como mercadoria, e faz parte das reservas internacionais da maior parte dos países. Pelo mesmo motivo: o do PIB das nações que usam o euro é o segundo maior do planeta: US$ 14 trilhões, ou 17% do PIB global.

O que está acontecendo agora é só o óbvio: o yuan surgindo como mais uma moeda com status de mercadoria. O PIB Chinês, de US$ 12 trilhões, já está roçando no da zona do euro – e tem tudo para ultrapassá-lo em poucos anos.

Então, sim: o yuan vai tomar algum mercado do dólar (e do euro). Mas daí para concluir que a moeda americana vai deixar de existir é das duas uma: ou desinformação ou canalhice. Como no fim do vídeo o cara da fake news começa a pregar que o remédio contra o “fim do dólar” para o poupador comum é comprar bitcoin, fico com a segunda hipótese.

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