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Bruno Garattoni

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Vencedor de 15 prêmios de Jornalismo. Editor da Super.

Casos graves de Covid-19 podem estar ligados à reativação de vírus pré-histórico

Estudo da Fiocruz revela que pacientes com Covid grave possuem maiores níveis de HERV-K, vírus presente nos humanos há milhares de anos; descoberta pode explicar por que a doença é mais agressiva em algumas pessoas, mas não provoca sintomas em outras

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Atualizado em 6 set 2024, 09h32 - Publicado em 25 Maio 2021, 12h12

Estudo da Fiocruz revela que pacientes com Covid grave possuem maiores níveis de HERV-K, vírus presente nos humanos há milhares de anos; descoberta pode explicar por que a doença é mais agressiva em algumas pessoas, mas não provoca sintomas em outras

Por que algumas pessoas pegam coronavírus e ficam bem, sem sintomas ou com manifestações leves, enquanto outras desenvolvem formas violentas, e letais, da Covid-19? Esse é o grande mistério envolvendo o coronavírus – e até hoje, mais de um ano após o início da pandemia, não há resposta. Alguns cientistas acreditam que a gravidade da doença possa estar relacionada a diferenças no MHC, um complexo de genes relacionados ao sistema imunológico, mas ainda não há resultados conclusivos. Agora, um estudo da Fundação Oswaldo Cruz apresenta outra possível resposta: a Covid severa pode ter ligação com o HERV-K (retrovírus endógeno humano K), um vírus que colonizou a humanidade há milhares de anos e incorporou pedaços do seu código genético ao nosso. 

No estudo, os pesquisadores da Fiocruz acompanharam 25 pessoas com Covid grave, que foram internadas em UTI e precisaram receber ventilação mecânica. Elas tinham idade média de 57 anos e apresentavam alta carga viral de Sars-CoV-2, principalmente na traquéia. Além do coronavírus, os exames apontaram também a presença de HERV-K no viroma traqueal. E, eis a principal descoberta, esse vírus estava presente em níveis muito acima do normal (se comparado a indivíduos com casos leves de Covid-19, que haviam sido previamente testadas pela Fiocruz, ou pessoas sem Covid).     

Gráfico.
Níveis de HERV-K em porcentagem do viroma total. A primeira coluna, NS, se refere à coleta nasofaríngea (cotonete enfiado bem fundo no nariz, como no exame PCR) de pessoas com Covid leve. As três colunas seguintes apontam os níveis do vírus na traquéia de pessoas que tiveram Covid grave mas sobreviveram (cor verde), Covid grave seguida de morte (cor vermelha) e de pessoas sem Covid. (Fiocruz/Reprodução)

Ou seja: a Covid grave está relacionada a níveis aumentados de HERV-K. Mas isso não significa que esse vírus, que é inofensivo e normalmente passa a vida inteira sem se manifestar, esteja atacando o organismo. Isso porque tanto os pacientes que acabaram morrendo de Covid (58%) quanto aqueles que tiveram alta (42%) apresentavam níveis similarmente altos de HERV-K. Níveis elevados desse vírus já foram detectados em indivíduos com outras doenças, como câncer de pulmão, esclerose múltipla, artrite e síndromes neurológicas. Por isso, é possível que a presença aumentada de HERV-K seja uma consequência, não causa, da Covid grave.   

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Para testar essa hipótese, os cientistas infectaram dois tipos de célula humana, em laboratório, com o Sars-CoV-2: monócitos (pertencentes ao sistema imunológico) e Calu-3 (linhagem de células pulmonares). Após a infecção, os monócitos passavam a expressar mais genes do vírus ancestral – mas, com as células Calu-3, isso não aconteceu. 

O resultado parece sugerir que a conexão entre o coronavírus e o HERV-K tem a ver com o sistema imunológico – cuja hiperativação está relacionada a casos graves de Covid-19. Os cientistas constataram, inclusive, que ambas as coisas acontecem ao mesmo tempo: níveis aumentados de HERV-K vieram junto com níveis aumentados de monócitos e interleucinas, o que indica maior atividade do sistema imune. Uma possibilidade é que o despertar do HERV-K, com a expressão de genes desse vírus, excite o sistema imunológico e favoreça a reação exagerada típica da Covid grave. 

Mas, novamente, ainda não dá para cravar o que acontece primeiro: o HERV-K pode estar reaparecendo como consequência da hiperinflamação, e não ser a causa dela. De toda forma, o estudo chama a atenção – pois relaciona, pela primeira vez, esse vírus ancestral à progressão da Covid – e abre uma nova linha de investigação sobre a doença. Em que cada novo indício, como é típico do Sars-CoV-2,  traz consigo uma série de novas dúvidas. 

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