Vírus da varíola dos macacos pode sobreviver na água e na comida, diz documento do governo dos EUA. É verdade – mas não necessariamente um risco
MPXV é "muito estável no ambiente", afirma relatório do Department of Homeland Security, que cita estudos sobre a persistência do vírus na água e em alimentos congelados; contato com pessoas e objetos infectados continua sendo o principal vetor da doença.
MPXV é “muito estável no ambiente”, afirma relatório do Department of Homeland Security, que cita estudos sobre a persistência do vírus na água e em alimentos congelados; contato com pessoas e objetos infectados continua sendo o principal vetor da doença.
O surto global de varíola dos macacos continua crescendo, com 26 mil casos detectados em 87 países – um aumento de 62% nos últimos dez dias. A doença segue concentrada entre homens que fazem sexo com homens (HSH). Há um número crescente, embora ainda pequeno, de infectados em outros grupos demográficos – na Espanha, por exemplo, o governo confirmou 64 casos em mulheres, 1,3% do total no país (4.577). Também há casos em crianças, inclusive no Brasil.
Os Estados Unidos, que começaram a vacinar indivíduos do grupo HSH, já estão ficando sem doses do imunizante – e só devem receber mais a partir de outubro.
Tradicionalmente, a transmissão da doença acontece pelo contato com a pele do doente ou objetos que ele utilizou (especialmente lençóis e toalhas). A transmissão respiratória é considerada possível, embora haja incerteza sobre a frequência dela. No surto atual, acredita-se que esteja ocorrendo contágio sexual – o vírus MPXV, que causa a doença, foi detectado na saliva e no sêmen de pessoas infectadas.
Um documento do Department of Homeland Security, agência do governo americano que cuida da segurança -inclusive biológica- do país, sugere outra via possível: água e comida. O relatório afirma que “o MPXV, como todos os OPVs [patógenos do gênero orthopoxvirus, que inclui a varíola comum e 11 outros tipos, como a varíola bovina e a dos macacos], é muito estável no ambiente”. “O MPXV pode ser estável por dias a semanas na água, no solo, e em comida refrigerada”, diz o documento, publicado pela divisão de ciência e tecnologia do DHS.
De fato, o MPXV pode ser detectado na água de esgoto – e o Centers for Disease Control americano tem usado essa técnica, inclusive, para estimar a propagação do vírus pelos EUA. Mas isso não significa que a água seja um vetor infeccioso relevante, por duas razões. Ela é tratada antes do consumo, o que elimina a maioria dos vírus e bactérias. E os testes usados pelo CDC e por outras instituições detectam fragmentos virais – cuja presença não significa que a água contenha vírus íntegro, capaz de infectar alguém.
O mesmo vale para a comida. Assim como outros vírus de DNA, o da varíola dos macacos é relativamente resistente (bem mais do que os vírus feitos de RNA, como o da Covid). O documento do Department of Homeland Security cita um estudo, realizado em 2007 por cientistas alemães, no qual o vírus MPXV sobreviveu por 14 dias em alimentos refrigerados.
Porém, o cozimento dos alimentos – ou a desinfecção de verduras cruas pela imersão em água sanitária diluída a 0,1% (aproximadamente 1 colher de sopa do produto por litro de água), é suficiente para destruir o vírus.
Em suma: na prática, a água e a comida não representam grande risco. As relações sexuais com pessoas infectadas, o contato com pele ou objetos contaminados são os principais vetores do MPXV. E esses fatores podem ser evitados. Ao mesmo tempo, o longo ciclo da varíola dos macacos, em que a pessoa fica contagiosa por até 4 semanas (durante todo o tempo em que ela apresenta lesões), dificulta o controle da propagação da doença.
Isso tem gerado receio entre os usuários de ônibus e metrô, por exemplo – ambientes de alta aglomeração, onde o contato físico muitas vezes é inevitável. O CDC recomenda que “as pessoas com varíola dos macacos fiquem isoladas em casa ou em outro lugar pela duração da doença”, mas admite que “pode não ser possível em todas as situações”.
Nesses casos, o órgão recomenda que as lesões sejam “cobertas com roupas, luvas e/ou bandagens”, e que o infectado utilize uma máscara cobrindo totalmente a boca e o nariz, sem aberturas (o que exclui as máscaras cirúrgicas).