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Estudos científicos e reflexões filosóficas para ajudar você a entender um pouco melhor os outros e a si mesmo. Por Ana Prado

O que a série Girls diz sobre a dificuldade de organizar a vida

Por Ana Carolina Prado
Atualizado em 3 set 2024, 10h26 - Publicado em 31 jan 2014, 18h10

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A estreia da terceira temporada da série Girls, da HBO, casou muito bem com uma das minhas resoluções para este ano (promessa de Ano-Novo pode ser brega, mas é útil, gente). Desta vez minha lista ficou bem pequena, mas inclui mudanças que terão um impacto considerável no meu dia a dia. Uma delas envolve construir uma rotina mais produtiva, dificuldade que tenho observado em muita gente.

O que Girls tem a ver com isso? Hannah, a personagem principal, encarna muito bem (e extrapola muitas vezes) várias características irritantes dos Millennials (vulgo nós, o pessoal que nasceu entre 1980 e 2000, está conectado à internet 24/7, vive de oversharing nas redes sociais e adora tecnologia). Ela é egocêntrica, um tanto egoísta, se acha especial, é meio preguiçosa e acha que a sua vida (e a dos que a rodeiam) é um grande esboço de um livro que ela, sendo a voz de sua geração, vai transformar em uma obra-prima. No segundo episódio da terceira temporada (calma, não tem spoiler aqui, por enquanto), parte para uma viagem de carro com o namorado Adam e a amiga esquisita Shoshanna achando que vai ser algum tipo de jornada inspiradora sobre a qual vai escrever depois, mas logo se cansa e desanima reclamando que aquilo está sendo banal demais e “igual a outras viagens já vistas em diversas mídias”. No entanto, ela se recusa a participar da exploração que Adam, ~~aventureiro~~, decide fazer ao bosque próximo à estrada e literalmente prefere ficar deitada sobre o chão recoberto de folhas ouvindo um programa cultural de rádio no seu iPhone.

E é isso o que mais me chama atenção nela, essa atitude “estou insatisfeita, mas prefiro ficar aqui deitada”. Quem nunca fez isso em algum momento? Bom, eu já. E eu me justificava da mesma forma que ela: pelo menos estou me alimentando de cultura, ouvindo um podcast, lendo um bom livro ou algo do tipo. Não é necessariamente preguiça nem falta de vontade. Quem viu a temporada anterior acompanhou o martírio que Hannah viveu tentando lidar com a ansiedade aterradora que a tomou quando alcançou um de seus maiores sonhos: ser convidada a escrever um livro. Ela própria foi sua pior inimiga e não conseguia se concentrar para escrever uma única linha. A ansiedade deu lugar a um transtorno obsessivo-compulsivo e ela entrou em colapso.

No primeiro episódio desta temporada nova (agora sim tem um pequeno spoiler), ela já conseguiu virar o jogo e seu editor, que havia ameaçado processá-la por não cumprir o contrato, aparece se derretendo em elogios pelo seu trabalho. E ela conclui, satisfeita: “Minha única limitação é minha própria mente. E eu tenho as chaves para a prisão que é a minha mente”.

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Fim do spoiler.

O fato é que estamos todos muito propensos a virarmos, em maior ou menor grau, prisioneiros da nossa própria mente. Se nos deixarmos ficar ruminando demais certos pensamentos, podemos facilmente ser consumidos pela insegurança ou até pela inveja (o Facebook e o Instagram só tem gente feliz e bem-sucedida, né?), amargura ou desespero. E aí, se a gente não pirar como a Hannah, pode entrar num estado de apatia mais discreto, mas com um efeito avassalador a longo prazo: o de passar boa parte da vida só existindo em um estado morno e sem concretizar nenhum grande objetivo. Isso me faz lembrar de um discurso que o falecido escritor americano David Foster Wallace, um de meus preferidos, proferiu para uma turma de formandos nos Estados Unidos há alguns anos. Parte dele dizia:

 

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Felizmente, a maioria de nós provavelmente não vai pirar e resolver perfurar os tímpanos com um cotonete e picotar o próprio cabelo como a Hannah – até porque ela tem um transtorno psiquiátrico, o que torna tudo mais complicado. Mas vê-la nesta série sempre me faz pensar sobre o risco de virarmos reféns das limitações que nós mesmos criamos (ou intensificamos) e, assim, de ficarmos apáticos demais para estabelecer objetivos e ir atrás deles. Daí, talvez, venha boa parte da nossa insatisfação com a vida.

E a causa nem precisa ser tão dramática: podemos ficar à deriva por simplesmente nos rendermos ao excesso de estímulos e informações que a vida conectada nesse esquema 24/7 proporciona. Ficamos à mercê de tudo o que está em nossa volta – menos o que realmente importa: nossos objetivos e preferências verdadeiras. Muitas vezes, o problema não é não ter ideias – é ter ideias demais e não saber por onde começar. Ou ter medo de não fazer algo bom o bastante com elas.

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Parece-me que uma das grandes dificuldades não só dos Millennials, mas das pessoas em geral, e em especial aquelas com trabalhos ligados à criatividade, é conseguir organizar e cumprir uma rotina realmente produtiva – não no sentido coxinha/corporativo do termo, mas num sentido de realização pessoal. Antes de achar que a solução para a sua vida está em largar tudo e recomeçar uma vida nova do zero, talvez valha a pena parar para avaliar como você está fazendo as coisas hoje e se algumas mudanças menos drásticas não poderiam resolver seus problemas.

Este post foi só uma reflexão – e quero pedir a opinião de vocês sobre o assunto (quem quiser só conversar sobre a série é super bem vindo também). Mas o da semana que vem vai trazer dicas de profissionais conhecidos mundialmente por saberem muito sobre produtividade – e que têm funcionado para mim.

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