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Histórias esquecidas sobre os assuntos mais quentes do dia a dia. Por Felipe van Deursen, autor do livro "3 Mil Anos de Guerra"

O deputado americano que cuspiu no colega – e foi recriminado por isso

O Congresso dos Estados Unidos estava em polvorosa naqueles idos de janeiro de 1798. A Câmara dos Deputados votava o processo de impeachment do senador William Blount, um rico proprietário de terras envolvido em uma conspiração que pretendia valorizar territórios ao remover indígenas com a ajuda dos ingleses, que estavam de olho na bocada (e […]

Por Felipe van Deursen
Atualizado em 4 set 2024, 11h28 - Publicado em 25 abr 2016, 16h25
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Charge da época chamou briga de deputados de “esporte da realeza”.

O Congresso dos Estados Unidos estava em polvorosa naqueles idos de janeiro de 1798. A Câmara dos Deputados votava o processo de impeachment do senador William Blount, um rico proprietário de terras envolvido em uma conspiração que pretendia valorizar territórios ao remover indígenas com a ajuda dos ingleses, que estavam de olho na bocada (e de quem os americanos haviam declarado independência havia meros 22 anos). Ou seja, um esqueminha pesado num nível “roubar merenda de escola”.

A especulação dos territórios também envolvia a geopolítica conturbada do novo país, que era uma fração do que viria a ser, já que Flórida, Louisiana e outros futuros estados pertenciam ainda às potências europeias Espanha, França ou Reino Unido. E essas colônias podiam mudar de lado de acordo com a direção dos ventos belicosos do outro lado do Atlântico. Como a França havia derrotado a Espanha em uma guerra recente nos Pireneus, os americanos temiam que os franceses tomassem o controle de terras espanholas na América do Norte e fechassem o acesso deles ao rio Mississippi. Por isso, o presidente John Adams defendia uma postura mais dura diante da França e a preparação para uma eventual guerra. Parte do Congresso discordava dessa posição. Um deles era o deputado Matthew Lyon, um republicano-democrata (antecessor do Partido Democrata) de Vermont. Lyon acreditava que se preparar para uma guerra apenas anteciparia essa guerra. O que parecia precaução era, a seu ver, uma afronta – o que muitas vezes se mostrou verdadeiro.

No recesso da votação sobre o futuro do senador Blount, Lyon começou a discursar informalmente aos colegas, apontando dedos para a “influência maligna” de alguns políticos. Acusou os federalistas (partido opositor ao dele) de Connecticut de corruptos e hipócritas que agem contrariamente aos interesses de nove décimos do povo. Acusou-os de perseguir os próprios desejos, de buscar cargos apenas para sanar sua sede de poder e de tentar erradicar a oposição por meio de um injusto monopólio de imprensa. Sarcasticamente, ainda disse que os federalistas faziam lavagem cerebral em seus eleitores.

Lyon falava alto, como quem queria ser ouvido além da roda de interessados. Funcionou. Roger Griswold, justamente um federalista de Connecticut, aproximou-se, irado, de Lyon e perguntou se ele marcharia para Connecticut bradando sua espada de madeira. Foi uma referência à participação de Lyon na Guerra de Independência. Acusado de covardia, ele teria de empunhar em público uma espada de madeira para simbolizar sua vergonha – pelo menos, essa foi a história espalhada pelos seus inimigos políticos. Como Lyon de fato havia sido suspenso do Exército, aquilo foi um tapa na cara de sua honra. Algo que ele, provavelmente, já não aguentava mais ouvir.

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Matthew Lyon era deputado de Vermont, o estado da atual sensação democrata Bernie Sanders


Mesmo assim, ele ignorou (ou não ouviu). Griswold insistiu, pôs a mão no braço do colega deputado e refez a pergunta, na frente de todos. Irritado, constrangido e se sentindo humilhado, Lyon deu uma cusparada no rosto de Griswold. O federalista limpou a saliva da cara e, sem dizer uma palavra, saiu nobremente do salão. Lyon foi recriminado pela Câmara e pediu desculpa pelo “ato indecente”.

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Duas semanas depois, em 15 de fevereiro, o aristocrata Griswold encontrou-se novamente com o imigrante irlandês Lyon. Ignorando o pedido de desculpas e decidido a se vingar, avançou sobre ele com um bastão de madeira. Bateu em sua cabeça e nos ombros. Lyon se defendeu como pôde com uma dessas grandes pinças de lareira. Outros deputados precisaram intervir e incorporar a turma do “deixa disso” e encerrar a pitoresca briga. O site oficial da Câmara americana descreve o episódio como um símbolo da emergente polarização do país.

Afinal de contas, um cuspe dificilmente é um cuspe.

***

Após a briga, Griswold recusou o convite de John Adams para ser secretário de guerra. Lyon foi preso por desrespeitar uma lei da época que reprimia a publicação de críticas ao governo (ele atacava justamente a postura pró-guerra de Adams em relação à França). Mesmo na prisão, ele foi reeleito.

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