As regras do matematiquês
Assim como na linguagem escrita, os números também têm suas regras de pontuação, igualmente essenciais para a compreensão.
Luiz Barco
A Matemática é uma ferramenta indispensável na informática, mas parece que os programadores não dão muita bola para ela. Em vários softwares, como Word, é preciso procurar com afinco para descobrir como se grafam sinais matemáticos, como a potência de um número. É muito mais fácil, no entanto, encontrar letras do alfabeto cirílico. Você sabe, aliás, como se expressa um expoente nesse programa?
Para representar “dois xis à quinta”, por exemplo, faça o seguinte: primeiro escreva 2×5. A seguir, selecione com o mouse o 5: 2×5. Abra, então, o menu Formatar e clique em Fonte. No quadro efeitos, escolha a opção sobrescrito e dê OK. Voilà: 2×5. Para alguém que não precisa desse recurso com freqüência, o procedimento é bom.
Foi desse tipo o erro que saiu na minha coluna do mês passado (SUPER, número 7, ano 13, página 85). Alguns expoentes saíram do mesmo tamanho que as bases, o que confunde a leitura, embora não leve a um erro nos cálculos. Não é que eu queira culpar os computadores pelas falhas humanas, mas a verdade é que às vezes eles são cúmplices de algumas falhas. No caso, o Macintosh não consegue reconhecer os expoentes escritos no Word, o programa que uso para fazer minha coluna, transformando-os em algarismos em tamanho normal.
Mas os programadores de computador não são os únicos a desprezar a simbologia da Matemática. Acho importante lembrar que o uso adequado dos símbolos – não somente na Matemática, mas em todas as ciências – está longe de ser um rigor desnecessário. É, na verdade, uma garantia de se dizer exatamente o que se pretende e de ser bem entendido em qualquer parte do planeta.
Insistir que o sinal de igualdade fique alinhado com o traço de fração parece ranzinzice de professor, mas não é. Como traduzir, por exemplo, em matematiquês “xis é igual a 42 dividido por 3 dividido por 2”? Será:
Como dizia o professor Oswaldo Sangiorgi, o parêntese tem na linguagem matemática o papel destinado à vírgula na escrita. Uma coisa é dizermos x = (42/3)/2 = 7 – ou 42 dividido por 3, dividido por 2, e outra é x = 42/(3/2) = 28 – 42 dividido pelo resultado da divisão de 3 por 2.
Outro uso ambíguo da simbologia seria:
….43+17= 25. Será raiz quadrada de 43, mais 17? Ou será raiz quadrada da soma entre 43 e 17, isto é, …43+17 = 9?
No início dos anos 70, conheci o grande matemático holandês Hans Freudenthal em um Congresso de Educação Matemática, realizado em Baía Blanca, na Argentina. Sua escrita era de excepcional clareza e rigor. Em 1978, na Universidade de Berkeley, na Califórnia, ouvi uma das mais proveitosas palestras da minha vida sobre os cuidados que esse fantástico professor da Universidade de Utrecht devotava ao ensino da Matemática elementar às crianças holandesas. Seria bom que alguma editora reeditasse em língua portuguesa os vários livros de Freudenthal. Eu recomendaria Perspectivas da Matemática, que nos apresenta uma bela viagem pela matéria. É uma lição de linguagem. E ponto final.
Professor da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo