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Atrito implacável

Terremotos continuam a causar desastres enormes, apesar de os cientistas saberem cada vez melhor onde eles vão atacar. O difícil é decidir quando tirar os habitantes de lá.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h49 - Publicado em 30 set 1999, 22h00

Flávio Dieguez e Denis Russo Burgierman

Na madrugada do dia 21 de setembro, a ilha de Taiwan começou a chacoalhar, como se estivesse à deriva nas ondas do Mar da China. A capital, Taipé, foi devastada, caíram prédios inteiros. Perto de 3 000 taiwaneses morreram. A tragédia parece ter pego todos de surpresa. Mas, seis meses antes, os pesquisadores do Departamento de Geologia de Taiwan tinham avisado que o perigo era iminente. A ilha fica bem sobre a beirada de uma placa tectônica, a eurasiana, que está em atrito com outra, a das Filipinas. Os cientistas já sabiam que, um dia, pelo desgaste mútuo, a massa eurasiana iria escorregar para cima da outra. Foi isso que aconteceu. “A pressão estava aumentando desde 1935, data do último grande tremor”, disse à SUPER Chris Browitt, que está rastreando o tremor de Taiwan para o Serviço Geológico Britânico. “Sabíamos que o sismo viria.” O problema era descobrir quando.

fdieguez@abril.com.br • drusso@abril.com.br

Algo mais

O terremoto de Taiwan atingiu 7,6 na escala Richter. Os outros dois grandes terremotos deste ano, na Turquia e na Grécia, chegaram a 7,4 e 5,9, respectivamente. Para comparar, os dois maiores tremores já registrados no planeta, no Alasca em 1964 e no Chile em 1960, alcançaram 8,5 pontos na mesma escala.

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Área de risco

Taiwan fica bem na fronteira entre duas massas subterrâneas.

O terremoto de 21 de setembro começou com o atrito entre duas placas tectônicas exatamente embaixo da ilha de Taiwan.

Raspada mortal

O atrito entre duas placas rochosas fez Taiwan chacoalhar.
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No momento em que a placa eurasiana deslizou sobre a das Filipinas, a ilha de Taiwan, que estava em cima, ruiu.

O efeito da tensão entre as placas é como o de empurrar uma mesa muito pesada.

No início você faz força e ela não se move. Mas, quando sai do lugar, move-se aos trancos, derrubando pratos e talheres.

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A mesa é a placa eurasiana e o chão da sala é a das Filipinas.

Crônica de um abalo anunciado

Taiwan realmente estava à deriva na madrugada de 21 de setembro. Mas não foram as correntes do oceano que fizeram a ilha tremular. Foram outras, provocadas por rochas derretidas a mais de 100 quilômetros de profundidade, submetidas a uma pressão tão grande que balançam como se fossem de água. Em cima delas ficam as placas tectônicas, blocos que bóiam carregando os continentes e oceanos. É a trombada entre essas placas que causa tais tragédias aqui na superfície.

Prever o modo exato como elas irão se mover é difícil. Por isso, ainda não dá para marcar a hora de um terremoto nem preparar os habitantes da área para que deixem suas casas e esperem pelo tremor em terra firme. Adivinhar o lugar exato de um sismo também é muito complicado, mas um cientista americano conseguiu a façanha de predizer o local do terremoto devastador que agitou a Turquia em agosto.

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Só quando a região da cidade turca de Izmit foi destruída, deixando 15 000 mortos, pesquisadores do mundo inteiro perceberam que o desastre tinha sido anunciado dois anos antes, num estudo do geólogo Ross Stein, do Instituto de Pesquisa Geológica dos Estados Unidos, um órgão federal. Foi a antecipação mais exata já feita de um tremor (veja infográfico). Infelizmente Stein não tinha como dizer a hora do infortúnio.

O trabalho de Stein sugere que o abalo turco pode estar ligado a outro, que em 9 de setembro matou pelo menos 83 moradores de Atenas, na Grécia. “É possível que exista uma conexão”, declarou ele à SUPER. “Mas não sabemos como explicá-la porque os dados são insuficientes”. À medida que houver mais informação, saberemos como os tremores se encadeiam e onde a bomba-relógio vai explodir. O geólogo Browitt concorda e acrescenta: “Em algumas décadas, também conseguiremos acertar a hora em que eles vão ocorrer”. Só então o mundo deixará de estar à deriva nas ondas sísmicas.

Um desastre puxa o outro

Na Turquia, cada tremor enfraquece outra área ao longo de uma fenda. Anos depois, a região afetada chacoalha.

Em 1997, o geólogo americano Ross Stein descobriu que havia rochas fragilizadas sob a cidade de Izmit, local do terremoto deste ano. Stein deduziu que os buracos observados no subsolo haviam sido criados pelo grande abalo ocorrido em 1992 mais de 800 quilômetros a leste dali. Previu, então, que Izmit seria a próxima a tremer. Na verdade, ele havia compreendido a lógica de todos os terremotos na Turquia desde 1939.

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O geólogo percebeu que eles sempre aconteciam em áreas afetadas por abalos anteriores. Acompanhe no infográfico ao lado esse pingue-pongue a partir de 1957.

Veja onde está a falha

A zona de tremores passa pela Europa e pela Ásia.

A placa da Europa e a da Anatólia se encontram nesta linha vermelha

Roça-roça

Quando as placas tectônicas deslizam, a costa da Turquia fica agitada.

As placas da Anatólia e da Europa se comportam como dois caminhões que, ao colidirem de frente, desviam-se para um lado e para o outro. Foi isso que rasgou Izmit ao meio em agosto e matou 15 000 turcos.

Pingue-pongue sísmico

Acompanhe o sinistro vaivém de terremotos de leste a oeste desde 1957.

1. 1957 – Terremoto perto da capital Ancara vai causar, nove anos depois, um abalo bem no leste da Turquia.

2. 1966 – O tremor, quase na fronteira com a ex-União Soviética, devolve a bola para o oeste.

3. 1967 – Por isso, a nova catástrofe ocorre outra vez perto de Ancara, quatro anos depois

4. 1971 – O abalo anterior cria uma onda que vai bater quase 1 000 quilômetros a leste.

5. 1992 – Como resultado do tremor de 71, o seguinte volta, novamente, para o oeste.

6. 1999 – Depois de tantas idas e vindas, o tranco subterrâneo atinge Izmit em agosto passado.

Perigo à vista

Muito perto da linha dos tremores, a cidade histórica de Istambul, com 7,6 milhões de habitantes, é um dos alvos na mira do tiroteio que inferniza o subsolo da Turquia.

1. 1957 – magnitude: 6,8

2. 1966 – magnitude: 6,6

3. 1967 – magnitude: 7,0

4. 1971 – magnitude: 6,8

5. 1992 – magnitude: 6,5

6. 1999 – magnitude: 7,4

Ao longo desta falha, as placas deslizam 16 milímetros por ano

Abalos de magnitude 7,0 na escala Richter ocorrem quinze vezes por ano em diversas regiões da Terra.

Por sorte, a maioria é despovoada.

O foco do terremoto deste ano estava a 17 quilômetros de profundidade

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