Iago Bolívar
O colapso da moeda única europeia poderia deixar gregos sob ditadura, espanhóis enfrentando barreiras mais duras para viajar do que as hoje impostas a latino-americanos, e a Alemanha liderando um pequeno bloco de países mais ricos, enquanto boa parte da Europa patinharia no caos. Seria, acima de tudo, o fim da União Europeia tal como a conhecemos, com seus membros separados e hostis a quaisquer projetos comuns.
Esse cenário ainda é improvável, mas passou a ser possível. E a explicação tem traços de um conto moral. A adesão ao euro deu uma moeda mais valorizada que o dólar a países periféricos – os chamados Piigs (acrônimo inglês de Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha). Ou seja, esses países ficaram mais caros, e produtos importados, mais baratos. Qual o lado bom? Os empréstimos para esses países teriam taxas baixas. E então os Piigs começaram sua fantasia de país rico – até a crise de 2008, quando se viu que o milagre de alguns tinha muito de conto de fadas (ou do vigário).
É que “riqueza” significa capacidade de produção. O euro é valorizado porque você compra com ele produtos cobiçados, como carros da Mercedes e aviões da Airbus. Esse não seria o caso dos Piigs, caso eles adotassem moeda própria.
Em situação intermediária ficariam países como França, Áustria e Bélgica, com grandes dívidas, mas economias ainda competitivas. Com a volta de suas moedas nacionais, essas economias ficariam empobrecidas, mas poderiam passar a exportar mais desvalorizando o câmbio.
Já os alemães cresceram e economizaram, advertindo seus irmãos perdulários. Ao mesmo tempo, empréstimos alemães garantiram que países como a Grécia comprassem seus produtos. No caso de um colapso do euro, alemães poderiam reinstituir o marco, agregando em torno de si países próximos, como Dinamarca e Finlândia, numa união monetária do norte, isolando-se e sofrendo os calotes em seus empréstimos.
Misturando as histórias, a moral desse conto poderia ser: grandes poderes (de compra) deveriam trazer grandes responsabilidades.
O caos financeiro aproximaria os brasileiros da Europa. A começar pela mesa
WUNDERBAR
A Alemanha se associaria a países como Dinamarca, Holanda e Luxemburgo para reinstituir o marco – a moeda mais forte do mundo, superando o dólar e a libra. Isso deixaria seus produtos caros para outros países. Uma saída seria focar-se no mercado de luxo, tal como já faz com seus carros.
EUROPA ECONÔMICA
Viajar ao Mediterrâneo ficaria uma pechincha para brasileiros. A crise da Grécia já pôs ilhas inteiras para locação. Com moedas fracas, a Espanha e o sul da Itália virariam balneários populares – a ponto de empurrar os endinheirados para destinos mais exclusivos fora da Europa.
DEMI-CHIC
Vinhos e queijos franceses chegariam ao Brasil mais baratos do que hoje, por conta do franco desvalorizado. E mais. Como seus salários ficariam relativamente baixos, muitos chefs e estilistas sairiam da França para exportar seus refinados conhecimentos em países emergentes.
DITADURA GREGA
Com desemprego recorde, hiperinflação e aposentadorias atrasadas, a Grécia poderia cair no caos social, com os grupos radicais do país tentando tomar o poder. No berço da democracia, não pode ser descartada uma intervenção militar – como as várias ao longo de sua história.
NA TRILHA DE CABRAL
Com o fim da livre circulação de cidadãos entre os países-membros da UE, portugueses teriam dificuldade para conseguir empregos em países menos afetados pela crise. A escolha natural seria migrar em massa ao Brasil, onde encontrariam vagas com e sem qualificação.