Marcos Coronato
Até o início da década, o vulcão Soufrière nunca havia perturbado a ensolarada tranqüilidade da Ilha de Montserrat, no Caribe. Aí, passou a espirrar fumaça e a juntar lava nos subterrâneos até explodir em agosto do ano passado, arrasando o pequeno éden caribenho.
A destruição pelo vento vulcânico
Em julho de 1995, o vulcanólogo Rick Hoblitt, do Levantamento Geológico dos Estados Unidos, fazia uma visita de rotina ao vulcão Soufriere, na Ilha de Montserrat, no Caribe, que desde 1991 dava sinais de agitação. “Mas em 1995 percebi que ele ia estourar”, contou Hoblitt à SUPER. “É que o solo começou a tremer de forma ritmada, indicando que tinha muita lava tentando abrir caminho entre as rochas lá embaixo.”
A massa ardente acumulou força até explodir. Primeiro, no final de 1996 e depois, com mais violência, em agosto passado. Curiosamente, a ameaça maior não partiu da lava, que, segundo a geofísica Marta Mantovani, da Universidade de São Paulo, é o menor dos perigos numa erupção. “Como ela segue rotas definidas, não é difícil evitá-la”, disse ela à SUPER.
E assim foi com o Soufrière. Em seus ataques, o perigo rápido e mortífero tomou a forma de uma ventania terrível, jorrando da cratera entre 60 e 200 quilômetros por hora. Aí, não houve como evitar o risco, pois as cinzas, poeira e gases, a mais de 500 graus Celsius, espalham-se em direções imprevisíveis, com impulso bastante para derrubar paredes de 1 metro de espessura. Pior: ao grudar e solidificar sobre a pele, transformam cidadãos em múmias instantâneas. Foi esse tufão vulcânico que expulsou os 15 000 habitantes desse paraíso tropical que é Montserrat. Em agosto, tiveram que largar tudo e fugir.
Cogumelo atômico
A coluna densa de fumaça e rochas trituradas, com 9 quilômetros de altura, lembra uma detonação nuclear
Um rio de lava com 500 metros de largura
O Soufrière pertence a uma categoria de vulcões que não derrama grandes volumes de lava. Ele é do tipo que ejeta colunas pesadas de cinzas, poeira, vapor e gases de enxofre. Em novembro de 1996, deu a primeira demonstração de seu estilo, com um espetáculo de detonações que durou 46 minutos sem interrupção. Em junho de 1997, passou também a produzir bombas, que são fragmentos de rocha aquecidos a 800 graus Celsius e arremessados a 6 quilômetros de altura. Velocidade: 500 quilômetros por hora.
Mas o Soufrière também criou seus rios de pedra derretida. O maior deles chegou a ter 500 metros de largura. Em alguns lugares, a torrente cavou buracos de 25 metros de profundidade e, em outros, acumulou-se e endureceu na forma de blocos de até 15 metros de altura. De maneira geral, porém, a lava comportou-se bem: correu direto para o mar. Não foi preciso direcioná-la com trincheiras e barricadas.
Segundo os especialistas, a lava do Soufrière contém pouco silício e deveria correr bem liquefeita. Mas em Montserrat as rochas não estavam totalmente fundidas: uma parte da torrente havia sido apenas amolecida pelo calor. Como resultado, a lava ganhou um aspecto espesso, rolando lentamente encostas abaixo e solidificando-se relativamente rápido. Em resumo, o que as rochas das profundezas fizeram foi uma cirurgia plástica na ilha, recriando toda a geografia de Monserrat.
A geografia mudou. A capital morreu
Centenas de especialistas, vindos do mundo todo, acompanharam cuidadosamente a agitação do Soufrière desde 1991. Isso ajudou a reduzir o tamanho do desastre. Mesmo assim, parte da população foi surpreendida, e pelo menos nove cidadãos morreram e dezenove ficaram feridos, nos últimos meses. A capital da Ilha de Montserrat, Plymouth, começou a ser abandonada em abril de 1996, mas milhares de habitantes se recusaram a partir até serem forçadas pelas autoridades, em agosto de 1997. Foi bem a tempo, pois nesse mês Plymouth seria completamente arrasada e até a sede do governo teve que ser transferida para Salém, pequena vila distante do perigo.
A lição é clara: a ameaça dos vulcões não vem deles mesmos, mas de sua proximidade com áreas povoadas. Das 1 500 crateras ativas no mundo, quase todas ficam em áreas assim. Algumas, perto de formigueiros como Tóquio e a Cidade do México. No total, 500 milhões habitam focos de atividade vulcânica. É compreensível, pois a lava tende a aplainar os terrenos vizinhos e a carregá-los de substâncias fertilizantes.
Também é natural que a população resista a abandonar seus lares. Afinal, um vulcão pode emitir todos os sinais de catástrofe e simplesmente voltar a dormir. Mas, na dúvida, a saída é fugir. Mesmo que seja de um paraíso historicamente tranqüilo, como Monserrat.
Para saber mais
Volcanoes of the World, T. Simkin e L. Siebert, Geoscience Press
Compreendendo a Terra, G.C. Brown, C.J. Hawkesworth, R.C.L. Wilson, Editora Cambridge
Petrificação imediata
Gases, cinzas e poeira colam à pele e viram pedra.
O vento vulcânico chega a atingir uns 100 quilômetros por hora.
Envolve o cidadão a uma temperatura de 800 graus Celsius.
As partículas endurecem. A morte sobrevém em 2 minutos.
Anatomia de um monstro vivo
Com 915 metros em seu ponto mais alto, o Soufrière tem várias crateras.
A caldeira é um local em que o magma dá um tempo antes de explodir.
No clímax, o volume de material ejetado em um dia alcançou o equivalente a 768 milhões de litros.
O duto principal, com 50 metros de diâmetro, traz a lava até a superfície.
A câmara magmática, a 6 quilômetros de profundidade, alimenta o vulcão.
Planeta em ebulição
Sete crateras poderão dar trabalho em 1998.
1. Kilauea, Havaí. Em agitação permanente, ameaça estourar.
2. Etna, Itália. Não adormece por completo desde os tempos de Cristo.
3. Sheveluch, Rússia. Recentemente dividiu-se em duas crateras.
4. Karymsky, Rússia. Sempre coberto de cinzas.
5. Adatara, Japão. Causou quatro intoxicações em 1997.
6. Semeru, Indonésia. Mais de 500 vítimas desde 1967.
7. Ruapehu, Nova Zelândia. Exala vapores mortais.