O fim do oxigênio
Sabemos que a poluição atmosférica humana é um problema sério. Mas nada se compara ao caos que seria se uma bactéria aprendesse a produzir gases tóxicos e se espalhasse por aí
Hemerson Brandão
O gás sarin paralisa o sistema nervoso. O VX é um asfixiante poderoso. O mostarda provoca lesões na pele. Esses 3 gases são substâncias altamente nocivas e perigosas. Quando utilizados como arma química, têm o poder de matar muita gente e em pouco tempo. Eles só existem hoje porque foram fabricados pelo homem. Mas e se a natureza aprendesse a produzir, meio que sem querer, substâncias letais e contaminasse o ar que respiramos? Ficção científica? Fantasia desvairada? Bom, algo parecido com isso já aconteceu uma vez, no início da história da Terra.
Atualmente, não conseguimos sobreviver por mais de 5 minutos sem respirar oxigênio. Hoje, ele está presente em 20% da atmosfera de nosso planeta e boa parte dos seres vivos depende dele para viver. No entanto, o cenário era bem diferente há 3,5 bilhões de anos. Nesse período, o oxigênio era raro na atmosfera e o planeta era povoado apenas por seres vivos simples: as bactérias. E elas viviam bem assim, obrigado.
Dentre elas, uma, um tipo de alga microscópica, tinha acabado de aprender um truque: ao juntar luz solar e dióxido de carbono do ar, elas conseguiam gerar o próprio alimento. O que sobrava dessa receita era um gás tóxico, o oxigênio, que elas expeliam na natureza. Hoje, chamamos esse truque de “fotossíntese”. Mas há bilhões de anos, poderíamos chamar a técnica de “arma química”.
Em estudo publicado na revista britânica Nature, pesquisadores liderados por Kurt Konhauser e Stefan Lalonde, da Universidade de Alberta, no Canadá, apresentaram pistas de diferentes partes do mundo, inclusive no Brasil, de como esse massacre ocorreu. Por muito tempo, o oxigênio liberado pelas algas combinava-se com substâncias presentes no mar e nas rochas. Mas tamanha foi a liberação de oxigênio que esses repositórios ficaram saturados em pouco tempo, e o gás acabou por contaminar rapidamente a atmosfera.
Boa parte dos seres vivos da época estava totalmente despreparada para respirar esse novo gás no ar. O resultado foi um só: extinção em massa de espécies que antes eram dominantes. Provavelmente, um dos maiores eventos de extinção que nosso mundo enfrentou. Alguns até chamam essa mudança planetária radical de a “catástrofe do oxigênio”.
Os que conseguiram sobreviver à guerra química tiveram que se adaptar. Se hoje respiramos oxigênio, é porque nossos antepassados unicelulares acharam um jeitinho de tirar proveito da situação. A vida evoluiu, tornou-se complexa e se espalhou por todo o planeta. Entre mortos e feridos, tivemos uma explosão de vida na Terra graças ao oxigênio, que propiciou aos sobreviventes uma fonte mais eficaz de energia.
Mas uma nova contaminação da atmosfera com gases letais poderia provocar uma nova onda de extinções globais? A evolução natural dos seres vivos ainda continua. Mudanças climáticas – como a que enfrentamos agora – são os motores para que os seres vivos comecem a se adaptar aos novos ambientes. Novas espécies de bactérias podem estar nascendo nesse exato momento, experimentando outras formas de fabricar o alimento delas de cada dia. Não é inconcebível que desenvolvam uma solução catastrófica para quem já está por aqui.
Segura essa! – Diga-me o teu ar e te direi se vives
ATMOSFERA DENUNCIA PRESENÇA DE VIDA A composição atmosférica é uma excelente referência da presença de vida num dado planeta. Se um ET observar a composição do ar por aqui, saberá de longe que há vida capaz de fazer fotossíntese, somente notando a presença de oxigênio. Já em planetas como Marte e Vênus, que têm a atmosfera baseada em dióxido de carbono e em equilíbrio químico, a tendência é apostar que não há nada vivo por lá. Se bem que há uma pitada de metano sinistra no planeta vermelho…