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Qualidade versus quantidade

História, características e regras do jogo para duas pessoas, que nem sempre começam com forças iguais.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h54 - Publicado em 31 ago 1992, 22h00

Luiz Dal Monte Neto

Quando se imagina um jogo para duas pessoas, normalmente se pressupõe a igualdade das forças, isto é, peças em um número igual, com idênticas capacidades para ambas. Porém a igualdade pode ser tentada através de um recurso menos óbvio: dar a um jogador peças mais poderosas, mas poucas, enquanto o outro joga com maior número de unidades, mas limitadas. Há toda uma classe de jogos que opõem a qualidade à quantidade. Alguns são bem equilibrados, outros menos. Para além do simples prazer de praticá-los, eles proporcionam o desafio de descobrir para qual lado pende a balança.

Dentre os jogos dessa categoria, um dos mais tradicionais é o Raposa e gansos, mencionado em antigas sagas escandinavas. A mais antiga referência está contida na Saga de Grettis, escrita na Islândia no final do século XII. Outra, mais recente, está nas anotações dos gastos doméstiicos de Eduardo IV, rei da Inglaterra por duas vezes – de 1461 a 1470 e de 1471 a 1483. Nela se menciona a compra de um conjunto de duas raposas e 26 cachorros, esculpidos em prata e folheados a ouro, o que daria dois jogos completos, em que os gansos foram britanicamente substituídos por cães de caça.

Ao longo do tempo, desde os vikings até a rainha Vitoria, que, segundo consta, gostava de jogá-lo com seu primo, o príncipe Alberto, durante o namoro, o jogo sofreu várias modificações. Em sua forma primitiva, consistia no tabuleiro reproduzido na figura 1, uma peça representando a raposa, e treze, os gansos. A posição inicial é a que se vê na mesma figura, embora fosse tolerado qualquer ponto para a raposa começar a partida (aliás, é ela quem faz o primeiro lance). Não será difícil para o leitor reproduzir os tabuleiros aqui expostos. Vários materiais podem ser utilizados, com resultados muito bonitos. As peças podem ser emprestadas de algum outro jogo, ou improvisadas com botões. Para um primeiro contato, embora seja inegavelmente incômodo, o leitor pode jogar sobre a figura mesma, usando pequenos grãos.

Originalmente, todas as peças (tanto os gansos como as raposas) moviam-se da mesma forma: de uma interseção para outra adjacente, no sentido horizontal, vertical ou diagonal, desde que duas peças não ocupassem simultaneamente um mesmo ponto. Os gansos não podiam capturar a raposa, mas esta eliminava do tabuleiro qualquer ganso sobre o qual pudesse saltar. Para tanto era preciso que o ponto imediatamente seguinte estivesse vago (idêntico ao que ocorre no jogo de damas). Após capturar uma peça, a raposa podia continuar a jogar, se tivesse condições de fazer nova captura, e assim por diante (o que se chama tecnicamente de “tomada em série”).

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O objetivo do jogo é diferente para os dois lados. Os gansos vencem, se conseguirem cercar a raposa de modo que não lhe reste nenhuma jogada para fazer. Esta vence, se capturar tantos gansos que já não seja possível ser aprisionada por eles. Esta versão primitiva ainda é praticada nas regiões rurais da Inglaterra e na Islândia , em pleno século XX, mas não mais de modo exclusivo, porque já a partir de 1600 diversas variantes regionais começaram a aparecer. Cada uma delas, provavelmente, tentava corrigir o desequilíbrio original, tornando a partida mais disputada. Assim, para melhorar as chances da raposa.

Primeiramente se aboliu o movimento diagonal dos gansos. Depois, julgando que isso ainda não era suficiente, retiraram deles o direito de se mover para trás.

Aparentemente o remédio foi muito forte, e não demorou muito para que surgisse uma versão com quinze gansos, invés dos treze originais, para compensar a mobilidade da raposa. Logo esse numero subiria para dezessete, estilo inglês ou francês. Outros, invés disso, preferiram moderar a voracidade da raposa, proibindo-a também de se mover pelas diagonais. Esta ultima medida acabava por tornar desnecessárias as linhas diagonais, que terminaram por ser suprimidas. Mais tarde, as linhas horizontais e verticais teriam a mesma sorte. É que, segundo a lenda, um nobre francês, encarcerado na Bastilha, criou-se Solitaire (conhecido no Brasil como Resta um) a partir de um tabuleiro do Raposa e gansos. Mas isto já é outra história. Várias outras adaptações se sucederam, porém, depois de todas elas, é o caso de se perguntar: qual conjunto de regras que gera o mínimo de desequilíbrio? Uma questão aberta que pode se tornar um divertido quebra-cabeça na mão dos leitores super intrigados, dispostos a criar sua própria receita para jogar Raposa e gansos.

Luiz Dal Monte Neto é arquiteto e designer de jogos e brinquedos

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