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“Vacina mental” combate notícias falsas sobre mudanças climáticas

Expostos a informações corretas com antecedência, voluntários se tornaram menos suscetíveis a acreditar em notícias falsas

Por Bruno Vaiano
Atualizado em 23 out 2020, 11h05 - Publicado em 23 jan 2017, 18h16

Uma vacina é como levar suas células imunológicas para um curso de autodefesa. Com ela, seu sistema imune é exposto a uma versão mais fraca de um vírus ou de uma bactéria real. Assim, anticorpos “principiantes” tem a oportunidade de conhecer o inimigo de perto e aprender seus truques antes de encarar uma infecção pra valer.

Agora, um grupo de psicólogos liderados por Sander van der Linder, da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, fez a mesma coisa com o cérebro. Eles acostumaram um grupo de voluntários a identificar teorias da conspiração e notícias falsas explicando antes fatos científicos sobre o assuntos abordados por elas. E as cobaias saíram de lá lidando melhor, na prática, com correntes de grupo de família no Whatsapp e com outros boatos sem fonte.  

A vacina mental vem em boa hora. Segundo a Universidade de Stanford, 40% dos jovens americanos não são capazes de reconhecer uma notícia falsa plantada na timeline do Facebook, e 80% não conseguem diferenciar conteúdo patrocinado de conteúdo jornalístico. O conteúdo usado pelos pesquisadores mencionava supostas alterações genéticas e mutações sofridas por plantas dos arredores da antiga usina nuclear de Fukushima, no Japão, palco de um vazamento causado por tsunami em 2011.

“Nós queríamos ver se poderíamos descobrir uma vacina expondo pessoas a uma pequena quantidade de desinformação corriqueira. Um aviso que ajuda a preservar a informação real”, afirmou van der Linder ao EurekAlert! “A ideia é construir um repertório cognitivo que torne as pessoas menos suscetíveis e ajude a preservar os fatos.” Em outras palavras, fornecer experiência o suficiente para que uma pessoa ingênua passe a ficar com a pulga atrás da orelha com mais frequência.

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A técnica pode se tornar uma arma contra a perigosa influência de posições políticas sobre conclusões científicas. No laboratório de van der Linden, o tema testado não poderia ser outro: aquecimento global. Hoje, 97% dos especialistas no assunto afirmam que a queima excessiva de combustíveis fósseis pela atividade humana no último século aumentou a concentração de gases do efeito estufa na atmosfera terrestre, o que elevou a temperatura média do planeta e abriu caminho para mudanças ambientais irreversíveis. Segundo o discurso de campanha de Donald Trump, porém, o aquecimento global não passa de uma tentativa chinesa de limitar a capacidade produtiva da indústria norte-americana. À exemplo do novo presidente, uma parcela considerável da mídia e da opinião pública do país também não vê sentido nos esforços de conscientização de figuras como o Papa e instituições como a NASA, a agência espacial americana, e a Organização das Nações Unidas (ONU), responsável pelo acordo climático de Paris.

Para começar a experiência, a equipe de Cambridge foi atrás de uma notícia falsa muito popular e compartilhada nos Estados Unidos. Uma amostra de representatividade nacional revelou a campeã do engodo: ela se originou desta petição de 1998, assinada por 31 mil cientistas americanos que negam o aquecimento global. Embora uma quantidade razoável de pesquisadores realmente tenham apoiado o documento na época, só 1300 deles tinham especialização em assuntos climáticos.

Já em 2001, há mais de 15 anos, a revista New Scientist selecionou uma lista aleatória de 30 signatários. Só 26 realmente existiam, e destes, apenas 11 afirmavam ainda concordar com o documento oito não tinham a formação acadêmica que haviam declarado ter para falar do assunto.

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A vacina contra a notícia obsoleta foi feita em duas doses. A primeira era pouco específica: pessoas que haviam lido a notícia sobre a petição liam a seguinte afirmação: “alguns grupos com motivações políticas usam táticas ardilosas para convencer o público de que há desacordo entre cientistas [sobre o aquecimento global]”. A dica, sozinha, aumentou em 6,5% o número de pessoas que acreditam que há consenso científico sobre o assunto.

A segunda dose de informação correta foi bem mais completa: revelou incoerências da petição, como a identificação precária da formação acadêmica dos signatários, e o dado de que 97% dos cientistas concordam com o aquecimento global, cortesia da NASA. Com ela, além dos 6,5% originais, 13% mais pessoas expostas à notícia não botaram fé na petição.

No grupo de controle, que não recebeu nenhuma “vacinação”, houve uma queda de 9% no número de pessoas que acreditam no aquecimento global após exposição à petição. As pílulas de informação correta foram igualmente eficientes em proteger democratas e republicanos, o que desconstruiu a ideia de que a orientação política de alguém altera sua suscetibilidade a notícias de uma ou outra orientação ideológica. Agora que o efeito imediato da vacina foi comprovado, o próximo passo dos cientistas será testar a eficiência das gotinhas de informação em prazos mais longos.

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A conclusão não deveria surpreender: a de que a informação é uma arma que te torna mais crítico e cético. Mas em tempos de cisão política tão grande, a lição é um pouco maior: a de que trabalhar ativamente para contestar notícias falsas faz efeito, mesmo que isso dê um pouquinho de stress. “O mais chocante é que entre grupos mais predispostos a rejeitar a ciência climática, as cobaias não apelavam para teorias da conspiração. Sempre haverá gente resistente, mas nos acreditamos que há espaço para que a maior parte das pessoas mude de pensamento”, afirmou van der Linden ao Psychology Today.

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