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A história do Hip Hop: Tubaína, nunca mais

O novo status do hip hop

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h45 - Publicado em 30 set 2003, 22h00

Eles já foram os primos pobres atrás das pick-ups. Hoje tocam até para o Chiquinho Scarpa. Promovemos um encontro histórico de cinco dos principais nomes do scratch nacional para contar a história do DJ brasileiro de hip hop

Não foi fácil juntar os caras no mesmo dia e no mesmo lugar. A data foi marcada e desmarcada uma, duas, três vezes, porque hoje em dia esses são os DJs mais ocupados da cidade. Mas numa fria segunda-feira paulistana finalmente eles estavam ali, ao redor da mesa.

O encontro aconteceu no Bar Brahma, na esquina das avenidas Ipiranga e São João, em São Paulo, e o objetivo era contar a história do DJ de hip hop no Brasil. Sentados estavam três representantes da velha guarda, dos tempos dos bailes funk e das equipes de som e das primeiras festas de hip hop – Grandmaster Ney, DJ Hum e KL JAY – e dois dos discípulos mais aplicados – os DJs King e Nutz.

O papo começou em ritmo nostálgico, mas logo virou um bate-papo animado. Dos bailes black do final dos anos 70, passando pela hoje histórica estação de metrô São Bento, em São Paulo, chegando aos dias de hoje, com o campeonato de DJs organizado por KL JAY, muita coisa mudou. Hoje, a balada hip hop é uma das mais animadas e rentáveis de São Paulo.

As festas migraram dos bairros afastados para os bairros chiques. King, que pilota os toca-discos para Xis, dá risada quando lembra da festa em que Chiquinho Scarpa estava na pista: “Pensei: ·Olha onde eu vim parar·”.

Veio parar longe. DJ Hum, ex-parceiro de Thaíde, lembra que no começo os DJs tocavam de costas para o público. Viam a pista literalmente pelo retrovisor. Ney é do tempo em que existiam vendedores ambulantes de disco. KL JAY, dos Racionais, conheceu a música pelo radinho de pilha. Hoje, os três são parte do panteão do hip hop nacional – e, junto com dois novos talentos, contaram a VOLUME01 a seguinte história.

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ELES TAMBÉM COMEÇARAM EM BAILINHOS

NEY – Eu nasci com disco no sangue. Os irmãos da minha mãe organizavam bailes. Meu tio, o falecido Zé Carlos Vitrola, foi o primeiro DJ a tocar só com a vitrola, separado do resto do equipamento. Daí veio o nome dele. Era uma época em que os DJs tocavam sentados. Não tinha mixer, fone… O pessoal tocava os discos no tato. Isso foi no final dos anos 60.

KL JAY – Minha mãe escutava rádio AM e ouvia muito Roberto Carlos, John Lennon, trilha de novela… Mas o pessoal começou a falar de FM, de umas rádios que tocavam um tal de funk. Meu pai tinha um radinho que pegava FM e quando ele ia trabalhar eu botava na FM e ficava ouvindo os sons, Gap Band, One Way…

HUM – Comecei assim, tocando em bailinhos pra arrecadar grana pra formatura da oitava série. Todo mundo começou assim. Os bailinhos foram a grande escola.

KING – “Eu trabalhava num banco, mas já acompanhava o pessoal que montava som para festas, mas só fui entrar mesmo quando vi os Racionais ao vivo. Fiquei só olhando o KL JAY e depois comecei a seguir o cara.”

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NUTZ – “Também comecei fazendo som em festas da escola, na sexta e sétima séries. Quando estreei na noite ainda era menor de idade.”

TRAFICANDO INFORMAÇÃO

HUM – As equipes de som, como a Chic Show, a Black Mad e a Zymbabwe, eram quem deixava a gente um pouco informado sobre o que acontecia lá fora.

NEY – A gente ia pro Rio comprar discos importados, que chegavam direto no porto. O Rio era o melhor mercado de disco de vinil do Brasil, o dobro de São Paulo. Na volta, a gente vinha apagando os rótulos.

KL JAY – A fogueira das vaidades! Era o medo de informar, pra você ver!

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NEY – Tinha aquela história de subir na mesa e ficar rodando a cabeça pra conseguir ler o selo e ver o que o DJ estava tocando.

HUM – Desde essa época o pessoal do Rio já era muito organizado.

NEY – E a cultura dos bailes cariocas já era administrada pelos DJs: as equipes tinham o equipamento de som, e chamavam os DJs para levar as músicas. Lá eles trocavam informação, discos. “Me empresta teu disco que eu vou tocar no meu baile.” Em São Paulo, as equipes proibiam você de falar que músicas você tocava, se você fosse funcionário. E quando você saía da equipe, você tava morto, porque os discos, os equipamentos, os contatos… eram todos da equipe.

AQUELE FUNK FALADO

HUM – Em São Paulo, esse lance da informação começou a mudar na época da (estação de metrô) São Bento (onde surgiu o movimento hip hop no Brasil, no começo dos anos 80), quando a gente começou a ouvir aquele funk falado, que depois a gente descobriu que era o rap.

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NEY – Era uma época em que ainda existiam os vendedores ambulantes de disco, eu mesmo vendi disco. A gente vendia para umas equipes e outras ficavam sem. E os discos iam ficando raros.

HUM – Os punks, que na época estavam saindo da São Bento, passaram muita informação pra gente, mostrou muita coisa, The Clash… A gente era vanguarda, era uma coisa diferente dos bailes.

FAZENDO VUK-VUK

KL JAY – O esquema da dança de soul e funk era uma espécie de protesto visual, uma auto-afirmação. Mas o hip hop era mais agressivo. O DJ pegava o disco e falava usando as mãos: “Polícia filha-da-puta!”, “Racismo o caralho!”. Mas rolava umas piadas do pessoal do samba, que era mais arrumadinho e falava: “Ih, lá vem aqueles caras que gostam de limpar o chão com o corpo, de fazer vuk-vuk nos discos”.

HUM – A gente não sabia como os DJs faziam (os scratches). “Como é que eles fazem isso?” Aí, o Eazy Lee, o DJ do Kool Moe Dee (um dos pioneiros do hip hop americano), veio para o Brasil.

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NEY – Foi o que quebrou a gente. A gente nunca tinha visto um DJ fazer performance até o cara fazer os scratches com os discos do Tim Maia.

KL JAY – Com discos de música brasileira! Eu pirei! “Você mentiu-ti-ti-tiu!” Nossa, mano! Que mágica!

OS CAMPEONATOS

NEY – Eu, o Kléber e o Humberto competimos nos três primeiros DMC (campeonato de DJs realizado em São Paulo entre 88 e 97). O primeiro tinha só amigo. Eu me lembro do KL JAY ir lá na rádio que eu trabalhava e dizer que tinha um vinil do “It Takes Two”, do Robbie Bass: “Eu tenho um lance louco pra fazer com esse som, mas eu não tenho o outro”. Aí eu fui lá na coleção do Chic Show e roubei o álbum emprestado. Só pedi uma coisa: “Não coloca uma marca nesse disco, pelo amor de Deus!” Ele fez a performance no campeonato, eu devolvi o disco e até hoje ninguém sabia disso.

KL JAY – É legal porque justamente nessa época o CD apareceu, e muita gente abraçou o CD. Venderam as picapes e os toca-discos! Eu sabia que havia muita gente boa. Conversei com o Xis e ele topou me ajudar a organizar o Hip Hop DJ.

HUM – Aí, voltou a valorizar o DJ e o vinil. Hoje tem loja que só vende vinil.

KL JAY – O mais importante é que revela muitos caras: o Cia, o próprio Nutz, o King, o Fábio Soares… E é um negócio underground. Não vai pra TV, não é divulgado como DJ de drum·n·bass.

SER DJ

HUM – Quem não conhece a cultura hip hop descobriu o DJ pela eletrônica. Mas os DJs de eletrônica curtem hip hop. Ninguém fala do Marky tocando na Sound Factory, na Penha, em 98. Ou do Patife abrindo a pista de eletrônica na Toco. Nos anos 80, o legal era ter uma banda de rock. Já nos 90, era axé e pagode. Agora, século 21, todo mundo quer ser DJ. Só que (os DJs de música) eletrônica têm mídia e patrocínios. No hip hop não tem nada disso.

KL JAY – A gente troca idéia, cumprimenta, pergunta que som o outro tá ouvindo e tá tocando. Não tem essa entre nós, mas com os outros caras… A gente tem a mente mais aberta.

NUTZ – Pra você ter uma idéia, eu tocava numa festa, mas me tiraram para o King assumir. Não deixei de freqüentar a festa por causa disso.

KING – Outro dia eu toquei numa festa e quem tava do meu lado era o Chiquinho Scarpa (risos). Sem noção. Ele olhou pra mim, me viu, assim, vestido todo colorido, e isso agrediu o cara. E eu comecei a rir: “Olha onde eu estou, olha quem está ouvindo meu som”.

KL JAY – O DJ toca para 500, 1000, 5 mil pessoas ao mesmo tempo. E conversa com as pessoas, fala usando as mãos, os discos. A gente sabe ir e voltar. O DJ é como um disco, redondo, gira e vê todos os lados, em 360º, como a Terra.

 

 

Grandmaster Ney

Nome – Sidney Ubiratan Pereira

Idade – 40

Toca com quem – Sozinho, na noite

Produção pessoal favorita – Remix de “Foi Pro Seu Bem”, música do Tim Maia regravada pela Paula Lima

DJ Hum

Nome – Humberto Martins de Arruda

Idade – 36

Toca com quem – Sozinho, na noite. Foi durante anos parceiro de Thaíde

Produção pessoal favorita – “Senhor Tempo Bom”, Thaíde e DJ Hum

DJ Nutz

Nome – Rodrigo Velloso Teixeira

Idade – 26

Toca com quem – Sozinho, na noite. Já acompanhou o Planet Hemp

Produção pessoal favorita – “Eu Tiro é Onda”, do Marcelo D2

KL Jay

Nome – Kléber Geraldo Lélis Simões

Idade – 34

Toca com quem – Racionais

Produção pessoal favorita – “A Fuga”, do Xis

DJ King

Nome – Carlos Eduardo Sebastião

Idade – 27

Toca com quem – Xis

Produção pessoal favorita – “Bruxo King”, da coletânea Xis Apresenta Hip Hop SP

 

 

HIP HOP DJ – FINAL

Programada para o dia 26 de outubro, no Sesc Pompéia, em São Paulo

(www.sescsp.com.br/sesc/unidades/pompeia.htm)

 

Dois momentos do DJ de hip hop

Das piadas dossambistas às festascom socialites

KL JAY

“O pessoal do samba falava: ·Ih, lá vem aqueles caras que gostam de limpar o chão com o corpo, de fazer vuk-vuk nos discos”

KING

“Eu olhei pro lado e vi o Chiquinho Scarpa. Pensei: ·Olha onde eu estou. Olha quem está ouvindo meu som”

 

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