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A música nos anos 10

Nunca tivemos tantas formas de acesso a música como agora. A Internet e o mercado deixaram os artistas mais criativos e próximos do público. E acredite: até a indústria está se recuperando

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 19h05 - Publicado em 21 jul 2011, 22h00

Felipe Van Deursen

Há uma década ouvimos que a indústria fonográfica caminhava para a morte, contaminada pela pirataria. Executivos diziam que era impossível sobreviver em um mundo no qual 48% dos internautas baixam música de graça. Não estavam tão errados: em cinco anos o faturamento da indústria brasileira recuou 50%. Mas não estavam certos. Em 2009, as gravadoras nacionais cresceram 160% no meio digital. Não foi fato isolado. No mundo todo, os lucros da música online sobem todo ano. E um estudo mostrou que até bandas independentes americanas, que seriam resistentes ao velho modelo, querem que ele exista: três de quatro grupos indie sonham com contrato com uma gravadora.

Como explicar? Hoje a internet tem que ser vista como aliada. Mas fazer dinheiro com ela ainda é um desafio. Afinal, são tempos estranhos em que o clipe de Rebecca Black é o mais visto do YouTube e, mesmo assim, ela não fica rica com isso. A conclusão é que quem quiser fazer sucesso precisa estar junto a seu público. Quer ser famoso? Primeiro passo: saiba como as pessoas ouvem música hoje.

COMO FAZER SUCES

Uma pesquisa do instituto Nielsen, divulgada em janeiro, entrevistou 26 mil pessoas para saber como se ouve música na internet hoje. A resposta: elas não ouvem. Elas veem música. Segundo o estudo, acessar música em sites de vídeo, como o YouTube, é mais comum que fazer download (veja mais na página ao lado). E isso não quer dizer necessariamente ver clipes ou shows. Talvez você tenha deparado com a cena: para ouvir uma música alguém digita o nome dela no site e deixa tocando, enquanto o vídeo só exibe a capa ou uma animação. Pois é assim que 57% dos internautas ouvem música hoje. E isso é importante porque mostra que o grande inimigo da indústria nos últimos anos, o download pirata, não tem mais a força de antes.

Outro modelo que atrai cada vez mais ouvintes é o streaming de áudio. Ao usá-lo, você não precisa baixar uma música, mas pode ouvi-la em uma espécie de rádio digital que toca o que você quiser. O serviço já existe no Brasil em sites como Grooveshark. Mas o formato tende a crescer de verdade com a entrada das maiores empresas de tecnologia do mundo no negócio. A Amazon anunciou o Cloud Drive, e o Google, o Music Beta. Depois a Apple apresentou o iCloud. Quando isso acontecer, uma mudança estará em curso: ninguém vai precisar baixar uma música para ser dono dela. Muitas empresas apostam que vamos assinar um serviço para ouvir o que quisermos. “É um dos caminhos para a indústria. O streaming pode se remunerar tanto por publicidade quanto por assinatura”, diz Ronaldo Lemos, professor visitante da Universidade de Princeton.

O impacto de movimentos como esse no futuro para indústria, artistas e público foi discutido em uma conferência organizada em maio na Faculdade de Música de Berklee, em Boston, nos Estados Unidos. O Rethink Music reuniu executivos, artistas e pesquisadores do assunto. E terminou com um certo ar de otimismo, especialmente entre os mais jovens, segundo fontes ouvidas pela SUPER. “Nunca houve tanta música sendo produzida e ouvida”, diz Lemos, que esteve no encontro. O problema não é tanto levar a música ao público no formato desejado, mas ganhar dinheiro com isso. E o consenso é que não existe mais uma única receita para chegar lá. “O que funciona para o heavy metal muitas vezes não funciona para o sertanejo”, exemplifica Lemos.

COMO GANHAR DINHEIRO

A situação para os anos 2010 parece ser menos temerosa. Os lucros das gravadoras seguem caindo, mas alguns formatos crescem ano a ano. Por exemplo, no Brasil até a venda de CDs subiu entre 2008 e 2009. E as receitas de música online já representam 12% do total. Isso no país vice-líder mundial em pirataria, segundo a Federação Internacional da Indústria Fonográfica. A instituição apontou que 44% dos internautas brasileiros baixam conteúdo ilegal. De fato, download legal no Brasil é uma prática pouco comum – muito por culpa da burocracia, que dificulta que gravadoras entrem em acordo para que lojas virtuais, como iTunes Store, e rádios online, como Spotify, ofereçam seus serviços no país.

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Não conseguir comprar música online é má notícia para os brasileiros, pois é assim que Europa e EUA estão fazendo. Em 2012, pela primeira vez a comercialização de música online ultrapassará a offline no mercado americano. No Reino Unido, nunca se vendeu tanta música como em 2010. Por trás desse fenômeno está a venda de faixas separadamente, conquista do consumidor que gosta de uma ou outra canção daquele cantor de um sucesso só. O download de faixa se junta ao download de álbum, CD, toque de celular, DVD, blu-ray. Novas e velhas plataformas passaram a conviver juntas; não há um formato que abrace tudo, como na era do CD. O cassete, dado como morto, vendeu nos EUA mais em 2011 do que no ano passado todo. O LP também voltou. O carismático zumbi da indústria vendeu 4 milhões de cópias em 2010 no país. É o maior número desde 1991, quando internet era só uma rede de uso científico e militar e Bryan Adams era ídolo. Entre as bandas que mais venderam LPs ano passado estão nomes antigos, como Beatles, e mais novos, como National. Isso mostra que há público disposto a pagar por discos. Basta as lojas venderem.

E os artistas? Como a indústria perdeu poder, muitos aproveitaram o novo cenário para gerenciar a própria carreira. Bandas como Nine Inch Nails fazem isso. No Brasil, quem se enquadra no perfil é o Móveis Coloniais de Acaju. Os processos são tão caseiros que a identidade visual da banda é produzida pelo vocalista André Gonzáles, que é designer. “Os contatos são diretos com público e parceiros”, diz Fabrício Ofuji, produtor do grupo. E isso aumentaria a liberdade criativa do artista. “Não há um poder central que diz o que entra. Qualquer boa ideia tem chance”, diz Damian Kulash, vocalista do Ok Go, banda famosa pelos clipes virais na internet.

Então como explicar que tantos músicos ainda sonhem com gravadoras? “O artista continua precisando de alguém para gerir sua carreira”, conta Leonardo Salazar, autor do livro Música Ltda. – O Negócio da Música para Empreendedores. Afinal, quando não há uma grande estrutura por trás para promover sua carreira, a responsabilidade do artista é maior. A cantora Amanda Palmer sintetizou a situação durante o Rethink Music: “Era mais fácil quando você entrava em uma limusine e te diziam o que fazer”. Ou seja, se não há mais tantos profissionais para trabalhar em todos os processos envolvidos, o “faça você mesmo” vira modelo de gestão.

QUEM FAZ SUCES

Usar novas tecnologias para se promover já é obrigação, não importa se sua banda é o U2 ou Os Lambas. Esse grupo é um dos grandes representantes do kuduro, estilo de Angola que, junto com outros mundo afora, faz parte de uma indústria alternativa que cresce nas periferias de vários países. “Ele parte do princípio de que a música é feita para circular. Parcerias com camelôs, lan-houses, celular com bluetooth”, explica Lemos. No Brasil, o maior representante dessa música que se espalha longe dos meios de divulgação tradicionais é o calipso paraense. A Banda Calypso tornou-se uma das campeãs de venda no país sem o apoio de uma grande gravadora. Hoje tem contrato com a Som Livre. “Mas a forma independente continua”, diz o diretor de marketing da banda, Sérgio Barbosa. “Os custos de gravação são da editora do [guitarrista e líder da banda] Chimbinha.”

Estar perto do público é cada vez mais importante, seja nos mercados populares ou nas redes sociais, que são ferramentas de algumas das grandes bandas de rock hoje. Nos últimos 12 meses, o Radiohead usou basicamente o Twitter para divulgar seu novo álbum. O Arcade Fire lançou um clipe interativo com Google Maps e Street View. O Foo Fighters tocou o novo disco inteiro na internet, ao vivo, antes do lançamento oficial (e o Kaiser Chiefs então? Descubra na pág. 89).

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Mas o que se espera dos próximos anos é que a internet continue sendo mais vitrine do que fonte de renda. Ei, você que quer ficar rico fazendo música: para um artista faturar R$ 1 000, sua música precisa tocar cerca de 820 mil vezes ao mês na rádio online Last.fm. Isso acontece porque uma única faixa precisa dividir valores entre gravadora, distribuidor, plataforma online etc. Lady Gaga, por exemplo, lucrou US$ 167 quando Poker Face chegou a 1 milhão de execuções no Spotify. Dá para comprar quatro batons da marca que leva o nome dela – se pechinchar. Nem Rebecca Black, que bateu o recorde de 100 milhões de visualizações no YouTube em um mês (ou duas vezes mais rápido que Justin Bieber), ganhou muito dinheiro na rede. Jornais disseram que a menina, dona do vídeo eleito o mais odiado da história do site, teria ficado milionária em uma semana apenas com visualizações e downloads de toques de celular. Não é bem assim. De acordo com a Billboard, ela vendeu 37 mil cópias digitais no período. Somando a renda da publicidade em seu canal no YouTube, a cantora teria ganhado por volta de US$ 40 mil, segundo o site Slate. Já paga pouco mais de um ano de aulas na Universidade da Califórnia, seu estado natal. Mas não faz dela uma milionária. Seja popular na internet, faça shows, assine contratos publicitários para então ter chances de enriquecer. Por exemplo, A Banda Mais Bonita da Cidade, que em maio infestou o Brasil com 2 milhões de visualizações em menos de uma semana, não ganhou dinheiro, mas agendou shows pelo país. Se Rebecca Black mantiver a fama, pode ficar rica caso seu hit Friday vire jingle daquele antigo comercial de cerveja que cantava “Hoje é sexta-feira…”


1, 2, 3 fora!

A lei que quer banir internautas


Em vigor desde 2009, a lei de internet e direitos autorais da França promete banir da web por um ano a pessoa que fizer download ilegal três vezes. Além de abrir brecha para a invasão de privacidade, a medida é vista por muitos como inviável porque é cada vez mais fácil ter acesso a música grátis via streaming. E mais: o número de piratas digitais no país aumentou desde a implementação da lei, segundo a Universidade de Rennes.
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A questão da pirataria está no bolso

Pesquisa sobre o comércio ilegal de música concluiu que o problema é econômico. Ajustado ao poder de compra local, o mesmo CD do Coldplay custa R$ 27 nos EUA e R$ 128 no Brasil (enquanto o pirata sai por R$ 4). “O Brasil é um dos países que mais combatem a pirataria no mundo. Enquanto o problema econômico continuar, não adianta investir em repressão”, diz Ronaldo Lemos.

Eu amo música

• Nunca antes na história do Reino Unido venderam-se tantas canções:

• 281,7 milhões de faixas comercializadas em 2010

• Alta de 27% em 4 anos

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• 4 milhões de LPs vendidos nos EUA em 2010. É o maior número desde 1991.

• Lucro da venda da música digital passará o de CDs nos Estados Unidos pela primeira vez em 2012

• Internet dá dinheiro?

• US$ 167 pagamento a Lady Gaga quando Poker Face tocou 1 milhão de vezes no site Spotify

• 823 571 número de vezes que uma música precisa tocar em um mês na Last.FM para que se ganhe R$ 1 000

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• 57% das pessoas com acesso à internet veem música em sites de vídeo, como YouTube*

• 3 em cada 4 bandas indie americanas gostariam de assinar contrato com uma grande gravadora

• 48% dos internautas baixam música de graça legal ou ilegalmente*

• 28% da população online mundial ouve música na internet todos os dias*

• 21-34 anos – Faixa etária que mais consome, ouve, vê e baixa música na internet. O público ainda é jovem.*

• 3 milhões de pessoas viram o clipe do Arcade Fire interativo com Google Maps na semana do lançamento – uma versão diferente para cada um.

• Na década passada: venda de CDs no Brasil caiu mais da metade / Calypso vendeu 10 milhões de cópias. Quase tudo no mercado informal.

• Friday, de Rebecca Black, levou 1 mês para ser vista 100 milhões de vezes no YouTube. Duas vezes mais rápido do que o recorde anterior: Baby, de Justin Bieber.

• Em 2011: Música digital já representa 1/4 do mercado mundial. Artistas estão cada vez mais de olho na Internet.

* Fonte: Instituto Nielsen, janeiro de 2011

Para saber mais


Tecnobrega – o Pará reinventando o negócio da música

Vários autores, Aeroplano Editora, 2008

https://www.musicaltda.com.br

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