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Aristóteles e a verdade que existe no aqui e no agora

Ele foi na direção oposta à de Platão, e trouxe a filosofia para o plano concreto. E aí fez algo ainda mais ousado: criou uma coisa chamada "lógica"

Por Alexandre de Santi (edição: Bruno Garattoni)
Atualizado em 27 out 2020, 15h23 - Publicado em 11 dez 2015, 12h15

Livro: Metafísica
Autor: Aristóteles
Ano: 350 a.C.
Por que ler? Mostra que a solução para o mundo – e para o homem – está nele mesmo.

No Vaticano, existe um afresco, pintado por Rafael de Sanzio, que mostra Platão com o indicador apontado para o alto, e Aristóteles, com o braço reto e a palma da mão voltada para baixo.

Eles estão lado a lado, no centro da pintura, e seus gestos simbolizam a principal diferença entre os fundadores da filosofia ocidental. Para Platão, a solução para os problemas estava em outro plano, no mundo das ideias, longe da realidade imperfeita onde vivemos.

Aristóteles, que se tornou o principal crítico do mestre, achava o contrário. Só existe um mundo. Este mesmo onde você está pisando agora, imperfeito, mutante, louco, ilógico, mas seu e meu, nosso.

Aristóteles chamou a filosofia de volta para a Terra. O curioso é que fez isso em um livro conhecido hoje como Metafísica, que significa “além da física”. Na verdade, ele não intitulou sua obra assim: composta por 14 livros, ela recebeu esse título de Andrônico de Rodes, o primeiro editor do gênio grego, no século 1.

Aristóteles falava em “filosofia primeira”. Sua intenção era construir uma ciência para compreender a realidade e a essência do homem nos seus aspectos mais fundamentais.

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Ele queria saber o que é eterno, imutável, que não depende de um ponto de vista ou de condições específicas para ser pensado. Pouco ambicioso, não? Mas ele conseguiu.

Em uma única obra, o melhor aluno de Platão fundou a lógica, detalhou o que realmente importa para definir o homem e mostrou que há uma estrutura básica de conhecimento que sustenta todas as ciências especializadas. E fez tudo isso nos ensinando a pensar, como o melhor dos professores.

Aristóteles é didático ao extremo. Metafísica compila anotações feitas por seus alunos e por ele próprio. Mas a linguagem não é coloquial: para lê-la, é bom ter um dicionário de filosofia ou uma edição comentada para entender os meandros da obra.

O livro é uma ode ao raciocínio. Aristóteles estava tão preocupado em detalhar como chegou às conclusões ou em apontar contradições de quem o precedeu que o leitor pode se encher o saco antes de entender as implicações profundas da metafísica. Mas vale a pena.

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Primeiro, ele faz uma investigação da realidade usando as ferramentas que a gente tem, isto é, as palavras e frases. Depois, classifica tudo em categorias. Resultado: nasce a lógica como disciplina (na época, ele usou o termo “analítica”), essencial para pensar sem cometer distorções.

Por exemplo: pense num triângulo redondo. Você pode até pronunciar essa frase, mas não consegue conceber um triângulo que seja redondo porque as formas são diferentes. Um não pode ser o outro, sem deixar de ser ele mesmo.

Não se trata de uma convenção, mas de compreender que o contraditório não pode ser pensado, e o que não se pode pensar não pode existir. Esse é o primeiro princípio lógico aristotélico: o da não-contradição. Você não pode dizer que “um triângulo é uma figura de três retas” e depois dizer “um triângulo não é uma figura de três retas”. Ou ele é ou não é.

Aristóteles aceita que quase nunca alcançamos a certeza matemática, há exceções para toda regra, as verdades são quase sempre aproximações, e nosso rigor é relativo. Mas não conseguiremos jamais nos livrar do raciocínio lógico. Ele é uma ferramenta essencial para nós, como um motor é para um carro ou as asas para um avião.

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“Ser humano é causa de ser humano, universalmente, mas não há nenhum ser humano universal”

Marcando oposição ao mestre, Aristóteles acreditava que todo conhecimento deveria partir do que é mais próximo a nós, isto é, da física, até formar o conceito das coisas, a metafísica. Na concepção de Aristóteles, as coisas não são apenas imperfeitas, mas também eternamente mutantes – e aí está a sua perfeição.

O aluno de Platão desenvolveu conceitos fundamentais para mostrar como não era preciso conceber outro mundo, como fazia o professor, para entender as coisas. Criou o conceito de “potencial” para expressar essa ideia. Por exemplo: uma criança é um homem em potencial; a semente, uma árvore em potencial. Parece óbvio agora, mas ele cunhou o termo e abriu a possibilidade de pensar em coisas que não existem agora, em “ato”, outro conceito aristotélico.

O pensador estava preocupado em definir a essência das coisas. Ele retirava características de elementos como homens e objetos e se perguntava se o que sobrava podia ser chamado de homem ou cadeira, por exemplo.

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Uma pessoa que teve uma perna amputada continuava humana? Sim. Podemos chamar de cadeira um objeto para sentar que possui apenas três pés? Sim. Ou seja, características como essas são “acidentais” no seu vocabulário.

Mas e se for impossível se sentar na cadeira? Nesse caso, é provável que a peça deixe de ser reconhecida como uma cadeira porque perdeu aquela característica que a define como uma cadeira. Ou seja, para o mestre, a essência está contida dentro de cada coisa do Universo, ao contrário do que dizia Platão, que acreditava que os objetos tomavam as qualidades definidoras de empréstimo lá do plano ideal.

No mundo aristotélico, todas as coisas possuem algo de universal, mas não perdem a individualidade. Sem contradição.

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