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A volta do Blackbird: o avião mais veloz já construído

Ele era feito de titânio contrabandeado. Vazava gasolina, de propósito, ao decolar. Voou pela primeira vez em 1964 – e agora, mais de 50 anos depois, pode ganhar um sucessor.

Texto Bruno Garattoni e Maurício Silva | Ilustração Hugo Hissashi | Design Carlos Eduardo Hara

1964 foi um ano turbulento. O Brasil sofreu um golpe militar, a China testou sua primeira bomba atômica, os EUA mergulharam de cabeça no Vietnã – e a União Soviética, depois de uma década afrouxando as políticas de Stálin, voltou à linha dura com a posse de Leonid Brejnev. Mas naquele 22 de dezembro, ao se preparar para decolar da base aérea Plant 42, na Califórnia, o piloto Robert Gilliland provavelmente não pensou em nada disso. Ele estava prestes a voar, pela primeira vez, o avião mais rápido já construído.

Uma aeronave projetada para alcançar Mach 3,5 (3,5 vezes a velocidade do som – o que dá 3.600 km/h na altitude em que ele voa, 80 mil pés), e que tinha uma característica bizarra e ligeiramente preocupante: quando estava no chão, e durante os primeiros estágios de voo, ela vazava combustível, de propósito. É que sua fuselagem, feita de titânio, iria esquentar e se dilatar ao atingir velocidades supersônicas. Então toda a estrutura, incluindo os tanques de combustível, tinha de ser montada com folgas entre as peças; do contrário, o avião se desintegraria durante o voo.

As linhas estranhas e a pintura preta (na verdade, um azul bem escuro), cor escolhida porque ajudava a dissipar o calor dos motores e não chamava atenção em voos noturnos, davam a ele um aspecto belo e ao mesmo tempo sinistro. Tanto que, embora seu nome fosse SR-71 (“SR” significa “reconhecimento estratégico”, em inglês), o avião logo ganhou um apelido icônico: Blackbird.

O pássaro negro foi o resultado de um projeto secreto envolvendo a CIA, a Força Aérea e a fabricante de aviões Lockheed, que se juntaram para criar uma aeronave de espionagem capaz de sobrevoar o território da URSS, e de outros países inimigos dos EUA, e tirar fotos sem nenhum risco de ser abatida. O Blackbird voava tão alto – a 85 mil pés, ou 26 km de altitude, mais que o dobro dos aviões comerciais – e tão rápido que não existia nenhum míssil capaz de alcançá-lo. A Lockheed construiu 32 aeronaves, que juntas fizeram mais de 3.500 missões de espionagem; nenhuma delas foi abatida.

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O SR-71 encerrou sua carreira em 1998. Até hoje, 55 anos depois daquele primeiro voo, continua sendo o avião mais veloz de todos os tempos. Mas, no que depender de seus inventores, ele poderá ganhar um sucessor ainda mais impressionante: o SR-72, que está em desenvolvimento e promete ser o primeiro avião hipersônico, capaz de alcançar inacreditáveis Mach 6 (o que dá aproximadamente 6.400 km/h a 80 mil pés de altitude). Seria o suficiente para ir de Nova York a Londres em 52 minutos – ou, crucialmente, alcançar Moscou em pouco mais de uma hora.

Os primeiros rumores surgiram em 2007, quando a imprensa americana obteve informações de que a Lockheed Martin (nome que a empresa utiliza desde 1995, quando se fundiu com a rival Martin Marietta) estaria desenvolvendo um avião hipersônico a pedido da Força Aérea dos EUA. Em 2013, a empresa confirmou o projeto, e chegou a revelar dois desenhos do novo Blackbird. Em julho de 2017, a revista Aviation Week revelou que um protótipo teria sido visto pousando na base aérea Plant 42 – a mesma onde o SR-71 foi desenvolvido, cinco décadas atrás, e vizinha da Skunk Works, a divisão de tecnologias militares avançadas da Lockheed. Seu mascote é um gambá (do inglês skunk), pois ela começou a operar, em 1943, num galpão improvisado, que fedia muito. 

A Skunk Works teve papel decisivo na Segunda Guerra Mundial (quando desenvolveu o jato de ataque XP-80 em apenas quatro meses) e na Guerra Fria, para a qual contribuiu com o U-2, principal avião de espionagem dos EUA. Nos anos 1980, ela criou o F-117: o primeiro avião stealth, invisível ao radar. A Skunk Works é uma lenda na aviação (tanto que a Boeing a imitou ao batizar sua divisão secreta, a Phantom Works), conhecida por fazer coisas impossíveis. Inclusive construir um avião para espionar a URSS – usando titânio contrabandeado dela mesma.

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(Hugo Hissashi/Superinteressante)
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Os americanos estavam atrás na corrida espacial, mas possuíam uma grande vantagem naquele avião espião (pois ele conseguia tirar fotos do território inimigo, coisa que o Sputnik não fazia). Nos anos seguintes, usaram e abusaram do U-2 para xeretar a União Soviética. Até que, em maio de 1960, os russos derrubaram o primeiro deles. O piloto, Gary Powers, se ejetou de paraquedas e foi capturado, o que causou uma grave crise diplomática. Em outubro de 1962, aconteceu de novo: um U-2 foi abatido ao sobrevoar Cuba, então cheia de mísseis soviéticos. Ficou claro, ali, que seria necessário desenvolver um avião mais moderno. Nessa altura do campeonato, os americanos já tinham satélites de espionagem, mas sabiam que eles eram vulneráveis a ataques inimigos (como, aliás, são até hoje). “Nós temíamos pela segurança dos nossos satélites durante uma guerra. Isso deixou claro que continuava sendo necessário ter um avião de reconhecimento”, escreveu o engenheiro Clarence Johnson, diretor de desenvolvimento do Blackbird, num relatório confidencial sobre o projeto (só liberado pela CIA em 2011).

A primeira aeronave recebeu o codinome RS-12, e deveria carregar um míssil nuclear. A ideia era que ela penetrasse na União Soviética, voando a Mach 3,2, até chegar a 80 km de seu alvo – para só então disparar. Mas, em 1962, quando o primeiro esboço ficou pronto, os militares americanos mudaram de ideia: concluíram que seria muito mais eficaz lançar mísseis nucleares a partir de seu próprio território do que tentar levá-los, de avião, até a URSS. Assim, o RS-12 não foi financiado pelo governo. Johnson não desistiu da ideia, e seu time continuou a trabalhar em uma aeronave semelhante, mas sob a sigla de R-12 e com outro foco: espionagem. A Força Aérea se interessou e encomendou seis unidades desse avião, que foram construídas com um orçamento apertado, equivalente a pouco mais de US$ 1,5 bilhão em valores atuais (para comparar: o desenvolvimento do caça F-35, o mais moderno da atualidade, consumiu US$ 55 bilhões; e esse valor não inclui o custo de produção dos aviões).

Em 24 de julho de 1964, o então presidente dos Estados Unidos, Lyndon Johnson, mencionou o projeto publicamente pela primeira vez em uma coletiva de imprensa, usando a sigla pela qual ele seria eternamente conhecido: “O sistema de reconhecimento da aeronave SR-71 é o mais avançado do mundo. Ela vai voar a mais de três vezes a velocidade do som. Usará os equipamentos de observação mais avançados do mundo”. A sigla correta era RS-71, mas as letras foram invertidas pela pessoa que datilografou o discurso. Depois que o presidente leu o nome errado, não havia como voltar atrás. Com 32,7 metros de comprimento, 16,9 metros de envergadura e 5 metros de altura, o SR-71 era uma realidade.

Um dos principais desafios enfrentados para o desenvolvimento do Blackbird foi como lidar com as altas temperaturas, acima de 400 graus Celsius, causadas pelo atrito do ar contra o avião voando na velocidade máxima. A solução foi construir a aeronave com titânio, um metal ao mesmo tempo leve e resistente ao calor, ainda que difícil de ser moldado. No começo, deu tudo errado. “As primeiras peças de titânio eram extremente frágeis. Se você derrubasse uma da sua mesa, ela se despedaçava ao cair no chão”, escreveu Clarence Johnson, diretor do projeto.

E havia um problema ainda maior: os americanos até tinham fornecedores de titânio, mas eles não conseguiam produzir com a quantidade necessária. O maior produtor desse material era, justamente, a União Soviética. Para contornar essa questão, foi necessário pedir ajuda da CIA. Numa operação ultrassecreta, cujos detalhes até hoje não são conhecidos, a agência de inteligência americana criou uma rede de empresas de fachada, em vários países, e por meio delas comprou o titânio dos soviéticos – que não se deram conta do que estava acontecendo.

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O primeiro voo do Blackbird, aquele de 22 de dezembro de 1964, foi apenas um teste para ver se estava tudo ok. Nele, o avião só foi acelerado a Mach 1,5. As missões de verdade só começaram em 1968, partindo principalmente de dois pontos. O primeiro ficava na base da Força Aérea Americana de Kadena, na ilha de Okinawa, no Japão (e rendeu ao Blackbird o apelido de Habu, nome de uma serpente venenosa presente na região). A segunda pertencia à Força Aérea Real britânica, em Middenhall, na Inglaterra.

Mas a sede operacional do SR-71 era a base de Beale, na Califórnia, lar do 9º Esquadrão de Reconhecimento Aéreo. Ali ficavam as tripulações e suas famílias, os aviões e os responsáveis pela manutenção. Apesar de o Blackbird ser uma aeronave incrível, poucos pilotos se candidatavam a pilotá-lo. É que o treinamento era bem difícil, mesmo para os padrões da aviação militar. Depois de passar por uma rigorosa análise de segurança, que incluía uma avaliação da sua vida pessoal, os novos pilotos faziam um curso de duas semanas sobre mecânica e manutenção do Blackbird, para entender como cada sistema funcionava.

Depois, pilotavam um simulador que reproduzia as piores condições de voo possíveis, em 12 missões com grau crescente de dificuldade – inclusive uma vestindo o traje pressurizado, que lembrava bastante uma roupa de astronauta e era obrigatório a bordo do Blackbird (a cabine do SR-71 era parcialmente pressurizada, mas o traje servia como proteção adicional). Você precisava gabaritar as 120 horas de testes no simulador antes de entrar de fato no avião – quem falhasse era cortado do programa. Depois disso, eram mais 100 horas de voos de teste até ser liberado para as missões propriamente ditas.

A tripulação do Blackbird era formada por duas pessoas, que ficavam em cockpits separados. O piloto comandava toda a operação da aeronave. No outro assento ficava o oficial de sistemas de reconhecimento, responsável pela parte mais importante das missões: tirar fotos do solo inimigo. Isso podia acontecer em qualquer lugar do planeta. Segundo o coronel Richard H. Graham, que pilotou um Blackbird de 1974 a 1981, o avião nunca chegou a invadir o espaço aéreo da URSS ou da China. A aeronave passou perto das fronteiras desses países, e apontou as câmeras para dentro deles. Já com nações mais fracas, a história foi diferente. “Diga o nome de qualquer país do Terceiro Mundo, e as tripulações do SR-71 provavelmente voaram sobre ele”, escreveu no livro Flying the SR-71 Blackbird (“pilotando o Blackbird”, inédito no Brasil).

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O SR-71 decolava com pouco combustível (pois os tanques vazavam). Assim que alcançava 25 mil pés, ou 7.600 metros de altitude, ele era abastecido no ar por dois aviões-tanque KC-135Q, uma operação delicada e que exigia bastante precisão dos pilotos. Essas aeronaves também podiam ser usadas ao longo das missões, para reabastecer o SR-71. E isso acontecia bastante: na velocidade máxima, o avião tinha autonomia de apenas 1h30.

As turbinas do Blackbird eram duas Pratt & Whitney J58, capazes de gerar 32.500 libras de empuxo cada uma. Era uma barbaridade para a época, mas hoje nem é tanto assim – é a mesma força dos motores LEAP, usados no Airbus A321neo e no malfadado Boeing 737 MAX. Ao contrário dessas aeronaves, que usam querosene de aviação, o Blackbird só podia voar com um combustível especial. Era o JP-7, criado pela Shell e capaz de suportar altas temperaturas sem explodir: só pegava fogo a 282 graus. Essa dificuldade de combustão, no entanto, exigia a injeção de outro combustível nas turbinas, o trietilborano, para dar a partida no avião – o que gerava um fogo verde na decolagem. As turbinas, aliás, eram difíceis de ligar. “Isso exigia mais de 600 cavalos de potência. Nós pegamos dois motores Buick [usados nos carros de corrida da Nascar, a stock car americana] e ligamos numa transmissão, que era conectada às turbinas”, conta William H. Brown, da Pratt & Whitney, em seu relato sobre a criação do avião.

Talvez você tenha reparado que as turbinas do Blackbird têm cones pontudos, que não são comuns de ver nos outros aviões. Eles se chamam inlets, e funcionam como difusores: direcionam e desaceleram o ar, evitando que a onda de choque supersônica (criada quando um objeto se move mais depressa que o som) entre nas turbinas. O ângulo e a posição dos inlets eram controlados por um computador, que às vezes falhava. Quando isso acontecia, uma das turbinas perdia potência, tendo de ser reiniciada. Mas esse processo de reboot atrapalhava o fluxo de ar nas turbinas, gerando uma instabilidade aerodinâmica que fazia o SR-71 puxar fortemente para um dos lados. A Lockheed Martin percebeu isso, e instalou um sistema que detectava o problema e compensava automaticamente, em 0,15 segundo, a inclinação do avião. “Funcionou tão bem que os pilotos nem percebiam qual dos motores apagou, se o esquerdo ou o direito”, escreve Clarence Johnson. Mas a correção também podia falhar (leia texto abaixo).   

Voando em altíssima velocidade e vestindo trajes pressurizados, como em qualquer caça, a tripulação só conseguia beber líquidos por meio de um pequeno orifício na parte frontal do capacete. Se alimentava por um tubo, comendo uma papinha disponível em vários sabores. A diferença é que o SR-71 tinha sua própria “chapa”. Para melhorar um pouco o sabor da gororoba, alguns pilotos aqueciam o alimento encostando-o por um minuto na janela do cockpit, que era feita de quartzo e chegava a uma temperatura externa de 315 graus quando o avião estava a Mach 3.

O Blackbird nunca foi abatido, mas se acidentou bastante: nada menos do que 12 das 32 aeronaves construídas caíram. O sucessor do SR-72 será controlado à distância, como um drone. Mas, para que isso aconteça, será necessário desenvolver sistemas de controle de voo muito mais ágeis. As ondas eletromagnéticas, que serão usadas para enviar comandos para o avião, viajam na velocidade da luz e atravessam o mundo de forma quase instantânea. Mas a coisa não é tão simples. Quando um piloto de drone dá um comando (virar o avião para a esquerda, por exemplo), essa ordem precisa ser interpretada por um computador, criptografada, amplificada, transmitida, recebida, decodificada e executada. Nos drones atuais, como aqueles que os EUA utilizam no Oriente Médio, isso  leva até 1 segundo. É a chamada latência, ou seja, o tempo entre o comando e a resposta. Como os drones Predator e Reaper voam relativamente devagar (200 km/h e 500 km/h, respectivamente), isso não chega a ser um problema. Mas a Mach 6, poderia atrapalhar bastante a pilotagem do novo Blackbird: todos os comandos passariam a ter 4 km de margem de erro.

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(Hugo Hissashi/Superinteressante)
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Outro desafio que a Skunk Works terá de superar está nos propulsores. Não existe, com a tecnologia atual, uma turbina que seja capaz de ir do repouso até o voo hipersônico (acima de Mach 5). A solução proposta é combinar dois tipos de motor: um par de turbinas e um par de scramjets, um tipo de propulsor que não possui partes móveis e é capaz de operar em altíssimas velocidades [veja no infográfico]. A Lockheed Martin tem trabalhado nessa tecnologia, junto com a empresa Aerojet Rocketdyne, desde 2006.

A construção da fuselagem também é uma questão em aberto. Voando acima de Mach 5, o atrito com o ar se torna tão grande que até o titânio começa a derreter. Uma saída é usar uma liga composta especial, com uma mistura de metal, carbono e cerâmica, como a dos ônibus espaciais, que suportava até 1.650 graus na reentrada da atmosfera. Outra opção seria adotar um sistema de refrigeração, como o anunciado pela empresa Reaction Engines. A empresa diz ter desenvolvido uma tecnologia que usa microtubos de líquido refrigerante – e é capaz de eliminar 1.000 graus de calor de uma superfície em apenas 0,005 segundo.

Mas o maior obstáculo ao nascimento do novo Blackbird não é de engenharia. Enquanto a Skunk Works tenta desenvolver seu avião hipersônico, a Rússia já encontrou um caminho mais simples. Em dezembro do ano passado, colocou em operação um míssil, o Avangard, que supostamente é capaz de alcançar velocidades entre Mach 20 e Mach 27 e manobrar como se fosse um avião, driblando baterias antiaéreas e escudos antimísseis. Os americanos estão correndo para finalizar sua arma do tipo, que deve ficar pronta nos próximos anos – e será mais barata do que o SR-72. O novo avião representaria um grande avanço tecnológico, e certamente teria utilidade militar. Mas, para dominar os céus do futuro, o Blackbird não terá de superar apenas os desafios técnicos e as defesas dos inimigos. Precisará, também, sobreviver a algo ainda mais letal: a dura disputa por verba dentro do Pentágono.

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(Hugo Hissashi/Superinteressante)
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Explosão supersônica

Um Blackbird se desintegrou no ar, a mais de 3.000 km/h. E o piloto sobreviveu.

Em 25 de janeiro de 1966, às 11h20, o piloto de testes Bill Weaver e o navegador Jim Zwayer decolaram da base Edwards, na Califórnia, em um SR-71. Logo após a decolagem, o Blackbird foi abastecido no ar por um cargueiro KC-135. O piloto acelerou a Mach 3,2 e subiu a 78 mil pés. Alguns minutos depois, o motor direito falhou – o que, no Blackbird, podia causar instabilidade aerodinâmica. Foi o que aconteceu: o avião começou a inclinar para a direita e para cima. “Eu puxei o controle totalmente para a esquerda e para a frente. Nenhuma resposta”, escreveu Weaver anos depois. “Eu pretendia dominar o avião até chegar a uma velocidade e altitude menores. As chances de sobreviver a uma ejeção ali, a Mach 3,18 e 78.800 pés, não me pareciam boas.” Mas a aeronave estava desgovernada, gerando forças G violentas, e Weaver desmaiou. Então o Blackbird se despedaçou. “Quando recuperei a consciência, percebi que tinha me separado do avião. Não entendi como podia ter acontecido.” Os assentos de Weaver e Zwayer foram ejetados, os paraquedas abriram e os dois chegaram ao solo. Mas Zwayer estava morto – quebrara o pescoço na explosão.

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(Hugo Hissashi/Superinteressante)

Foguete com asas

Existiu um avião ainda mais veloz. Mas ele não era bem um avião.

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Mach 6,7. Essa foi a velocidade alcançada pelo X-15, uma aeronave experimental desenvolvida pela Nasa com a empresa North American Aviation (hoje parte da Boeing). O feito foi alcançado em outubro de 1967, quando o avião fez um voo experimental a 102 mil pés de altitude (31 km). Mas não é possível comparar o X-15 a um avião de verdade, como o Blackbird. Para começo de conversa, ele não era capaz de decolar sozinho. Tinha de ser carregado por um bombardeiro B-52, que o soltava ao alcançar 45 mil pés. Além disso, o X-15 não tinha turbina, ramjet, hélice ou outro tipo de motor. Era impulsionado por um foguete, que queimava oxigênio e amônia – e fornecia míseros 80 a 90 segundos de propulsão.

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Altitude e som

Quanto mais alto você sobe, mais lenta a velocidade do som. Entenda por quê.

Você deve se lembrar das aulas de física no colégio: ao nível do mar, as ondas sonoras se deslocam a 343 metros por segundo, ou 1.234,8 km/h. Essa é a velocidade do som e o “número de Mach” (o termo homenageia o físico austríaco Ernst Mach, que no século 19 estudou a velocidade das ondas, sonoras inclusive). Mas em altitudes maiores, o número muda. Conforme você sobe, o ar vai ficando mais frio – e isso, na prática, faz com que o som se propague um pouco menos depressa. Motivo: quando um material está frio, suas moléculas vibram mais devagar. E o som nada mais é do que a vibração do ar. A 80 mil pés, altitude na qual voava o Blackbird, a velocidade do som é de “apenas” 1.056 km/h. Por isso, quando o avião se deslocava a Mach 3,5, estava a aproximadamente 3.600 km/h (e não a 4.321 km/h, que é a velocidade Mach 3,5 ao nível do mar).

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