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Como a guerra fria entre Atenas e Esparta esquentou – e destruiu a Grécia

Quando o avanço de Atenas perturbou Esparta e suas aliadas da península do Peloponeso, teve início uma longa guerra civil que levou à derrocada da Grécia.

Texto: Agência Fronteira | Edição de Arte: Juliana Vidigal | Design: Andy Faria | Ilustrações: Caco Neves


As conquistas culturais de Atenas vieram em uma época na qual a mais importante cidade grega dominava as demais. Não foi exatamente um período de paz, mas a relativa estabilidade deu segurança – e recursos – para o investimento intelectual. Parte desse equilíbrio veio a partir de 478 a.C., quando Atenas liderou uma associação entre diversas cidades, tendo como sede a ilha de Delos. Esparta e suas vizinhas do Peloponeso não ingressaram na coalizão ateniense. Preferiram reforçar uma aliança regional anterior ao embate contra o Império Persa.

Uma das razões para o afastamento espartano era a avaliação de que os persas não eram mais um grande risco. Outro motivo era a nascente rivalidade com Atenas, que no embalo do triunfo contra os invasores passou a violar a autonomia de outras cidades para avançar com seus planos expansionistas. Atenas investia em frotas marítimas não apenas para garantir sua defesa, mas também para controlar as rentáveis rotas do Mar Egeu, de olho em territórios ainda mais distantes. Esparta pressentia que o projeto de Atenas poderia, no futuro, ameaçar sua soberania.

O primeiro sinal do retorno da hostilidade entre as duas gigantes do mundo grego surgiu quando Atenas reconstruiu suas muralhas, atitude vista com desconfiança pelos espartanos, cuja cidade não era cercada. As relações azedaram de vez em 465 a.C., quando um terremoto devastou Esparta e deu impulso a uma onda de revoltas organizadas por escravos e cidades vizinhas. Atenas enviou 4 mil homens para ajudar Esparta a frear a rebelião, mas o governo espartano ficou receoso com uma possível traição e dispensou todos os soldados, atitude que ofendeu os atenienses. Era o início de uma guerra fria marcada pela animosidade.

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A Liga de Delos tinha uma organização bem definida. Atenas e outras grandes cidades tinham o dever de fornecer contingentes militares próprios, enquanto as pólis menores abasteciam o caixa central da confederação com contribuições. Mais de 300 cidades chegaram a integrar o bloco. A ameaça persa estava cada vez mais distante do coração da Grécia, mas as tensões internas estavam escancaradas.

Cidades das ligas de Delos e do Peloponeso já iniciavam confrontos armados. E Atenas passou a cobrar tributos cada vez mais pesados das associadas. A sede da aliança — e com ela o cofre com arrecadações — foi transferida de Delos para Atenas, que passou a usar os recursos em benefício próprio, erguendo edifícios como o Partenon e bancando grandes eventos festivos. Cidades descontentes eram dominadas pelas tropas de Atenas, agora um poderoso império dentro da Grécia.

Foi então que o desentendimento se transformou em guerra civil. O conflito teve início quando o avanço ateniense alcançou territórios dominados pela aliança do Peloponeso. Corinto, localizada na junção das penínsulas onde estavam Atenas e Esparta, foi uma das primeiras cidades a sentir as ameaças do Norte, vendo Atenas ocupar uma série de territórios nas cercanias e prejudicar o comércio da região. Em 459 a.C., após várias provocações, Corinto recebeu apoio de Esparta para iniciar o confronto.

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Atenas largou na frente: aniquilou a ilha de Egina e dominou algumas outras cidades. Em 454 a.C., no entanto, forças persas no Egito destruíram parte da frota marítima de Atenas. Além disso, os atenienses passaram a ser atacados com mais força por povos invadidos. Diante das dificuldades, a terra da democracia assinou em 446 a.C. um tratado de paz abrindo mão de suas conquistas terrestres. O texto garantia paz por 30 anos, mas as feridas não foram esquecidas.

Atenas continuou a incomodar Corinto, intrometendo-se na política de suas colônias. Em 433 a.C., de olho nas rotas comerciais do Mar Jônio, os atenienses fecharam uma aliança com a ilha de Córcira (hoje Corfu), antigo reduto de Corinto. No ano seguinte, dominaram a Potideia, colônia de Corinto que desejava abandonar a Liga de Delos. Esse comportamento foi mais uma vez denunciado a Esparta, líder da Liga do Peloponeso, que, após uma certa relutância, decidiu reiniciar a guerra contra Atenas. Em 431 a.C., Corinto atacou a Córcira. A partir de então, a guerra se espalhou pelos quatro cantos do mundo grego: uma cansativa queda de braço, sem batalhas diretas entre as duas principais forças militares. Esparta queria vencer a rival por terra. Atenas buscava a vitória pelo mar.

As baixas nos campos de batalha não seriam o único problema de Atenas. A situação ficou complicada dentro da cidade. Apesar de não ter sido invadida, graças a seus muros de proteção, Atenas era constantemente sitiada por tropas de Esparta que tinham avançado pela Península Ática. As plantações próximas da cidade eram devastadas pelos espartanos, cuja violência empurrou a população rural assustada para a área urbana.

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O inchaço populacional trouxe graves problemas. O maior deles foi uma epidemia que matou milhares de pessoas, inclusive Péricles, o comandante da cidade, no ano de 429 a.C. Esparta chegou a retirar seus homens da região para evitar contaminações.

Ataque na água

Em 415 a.C., a guerra tomaria rumos definitivos. Atenas lançou uma poderosa frota para atacar a cidade siciliana de Siracusa, na região da Magna Grécia, de onde vinha boa parte dos alimentos que abasteciam Esparta e suas aliadas. A expedição, no entanto, voltou derrotada. Sob comando de Lisandro, Esparta buscou ajuda dos persas (sim, seus antigos inimigos) para montar uma frota que pudesse fazer frente à máquina de guerra ateniense. Graças ao apoio, conseguiu em 405 a.C. fazer um ataque formidável, destruindo 168 navios inimigos ancorados sem proteção.

No ano seguinte, as tropas do Peloponeso derrotaram os atenienses em definitivo. As muralhas de Atenas foram destruídas, e as embarcações,confiscadas. A democracia ateniense deu lugar a um governo oligárquico liderado por 30 tiranos subordinados a Esparta. Em tese, Esparta deveria sair como grande vitoriosa, líder máxima da força militar que venceu Atenas após décadas de combates. O triunfo, porém, não trouxe tranquilidade para os espartanos e seus aliados.

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A guerra arrasou as finanças e a organização social de quase todas as cidades gregas. Manter as alianças estratégicas não era tarefa fácil e, diante das dificuldades, novas rivalidades começaram a surgir. Internamente, Esparta vivia um caos social devido ao grande número de escravos, que promoviam constantes revoltas. Ao mesmo tempo, não havia mais homens e recursos para combates. Esparta, a temida potência militar de outros tempos, estava enfraquecida. E os rivais logo perceberam isso.

Os macedônios

Em 371 a.C., a cidade-estado de Tebas, aliada do Peloponeso na luta contra Atenas, venceu os espartanos na Batalha de Leuctras e alcançou uma breve hegemonia. Nem Tebas nem qualquer outra pólis tinham, no entanto, poder suficiente para proteger todo o território grego. Diante do cenário, a Grécia virou presa fácil para um povo que assistiu de longe ao enfraquecimento das cidades-estado: os macedônios.

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Os gregos desprezavam os vizinhos da área mais continental da região, ao Norte (onde hoje fica um país chamado Macedônia e a Bulgária). Apesar da língua relativamente parecida, os habitantes da região balcânica eram considerados quase bárbaros, liderados por uma monarquia caótica e atrasada, distante da organização social alcançada pelas cidades gregas. Mas essa situação mudou com a chegada de Filipe 2º ao trono da Macedônia, em 359 a.C., quando o reino em poucos anos se fortaleceu com base em ataques militares e acordos estratégicos. Filipe 2º conhecia bem o mundo grego, principalmente os seus exércitos. Antes do reinado, viveu três anos como refém na casa de um general de Tebas, onde estudou táticas e inovações usadas nas batalhas. Quando colocou ordem na casa, decidiu expandir seus domínios sobre um vasto território arruinado por décadas de conflitos.

A grande cartada de Filipe foi criar uma nova formação de infantaria, organizando suas tropas em retângulos (as falanges) de dez fileiras de homens armados com lanças de até 6 metros (as sarissas), duas vezes mais longas que aquelas usadas pelos gregos. Com isso, as lanças da retaguarda eram projetadas entre os soldados da frente, ampliando o número de pontas oferecidas ao inimigo. Atrás da falange ficava a cavalaria protegida por armaduras, rodeada por catapultas e outros equipamentos mais pesados. Uma máquina de guerra cujos movimentos treinados à exaustão foram determinantes para a construção de um vasto império.

O plano original de Filipe 2º era tentar unir as cidades gregas e comandar um ataque contra o Império Persa, libertando colônias dominadas e abrindo espaço para escoar o excesso de população que inviabilizava a organização social das pólis. O projeto de união foi rechaçado por Tebas, Atenas e Esparta, o que incentivou a Macedônia a tomar o território grego a força. A batalha decisiva entre macedônios e gregos foi travada no ano de 338 a.C., em Queroneia. Somados, os exércitos de Beócia, Atenas, Megara, Corinto e Acaia eram mais numerosos que as forças macedônias, mas não impediram a vitória tranquila dos invasores. Nos meses seguintes, Filipe 2º rumou para o Sul, dominando o Peloponeso.

Tomou o cuidado de não humilhar as pólis derrotadas, o que garantiu apoio para atacar os persas a partir de 336 a.C. Mas o rei foi assassinado por um de seus guarda-costas. O sucessor, Alexandre Magno, recebeu do pai um império poderoso, que logo dominaria a Pérsia, o Egito, a Mesopotâmia e a Índia.

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