Interestelar
Por que está aqui: Faz representações de buracos negros e wormholes fiéis à física.
Interstellar | Direção: Christopher Nolan | Roteiro: Jonathan Nolan e Christopher Nolan
O cenário é um futuro próximo – e bem factível. As mudanças climáticas trouxeram secas que transformaram o planeta num ambiente inóspito, desértico, e onde a sobrevivência depende das parcas plantações que ainda vingam. De tempos em tempos, um tipo de hortaliça não resiste aos extremos do clima e desaparece para sempre. Com isso, profissões também entram em extinção. O mundo não precisa mais de pilotos hábeis como Cooper (Matthew McConaughey) – a Terra tem carência, desesperadora, é de fazendeiros que consigam colheitas bem-sucedidas. Mesmo assim, o piloto veterano ganha uma missão da Nasa: encontrar outro planeta habitável, já que este aqui está com os dias contados mesmo.
A mesma verossimilhança desse apocalipse ambiental, cada vez mais presente, Christopher Nolan imprimiu a uma parte do filme difícil de prescindir da fantasia: a viagem pelo espaço. Acompanhado por uma equipe de astronautas-cientistas, Cooper deve levar sua nave até as proximidades de Saturno, onde vai viajar através de um wormhole, ou buraco de minhoca, até uma galáxia distante, onde deve continuar sua caça ao gêmeo da Terra. Tudo muito além da imaginação para se esperar embasamento científico correto. Mas tem, sim. E num nível jamais visto no cinema.
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Para que o enredo fosse o mais próximo da ciência complexa que governa o Universo, Nolan contratou Kip Thorne, Prêmio Nobel de Física de 2017, como consultor. A equipe de efeitos especiais utilizou equações criadas por Thorne para representar um buraco de minhoca como uma esfera – e não como um buraco de fato, como os livros de divulgação científica geralmente mostram, reproduzindo um erro conceitual. Tudo isso só vale, claro, se buracos de minhoca realmente existirem por aí. Embora a Relatividade Geral considere o conceito válido, e ele seja bem aceito pela cosmologia moderna, ainda não há evidências de que esses túneis hipotéticos no espaço-tempo – que serviriam de atalho para atingir distâncias inimagináveis do Universo – sejam mais que uma teoria.
Outro acerto do filme foi mostrar como o tempo passa de maneira diferente para os astronautas quando estão próximos a um buraco negro. A gravidade descomunal nessa região estende o espaço-tempo – como uma bola de boliche faria num tecido esticado. E daí vem o conflito sentimental por trás de toda a física teórica de Interestelar. Quando Cooper parte para as proximidades de um buraco negro, o tempo para ele passa muito mais devagar que o de sua filha, Murphy, que ficou na Terra, e que vai de menina a adulta (Jessica Chastain) enquanto o pai continua com a mesma idade. A ciência séria, então, dá lugar à licença poética: mesmo nessa incompatibilidade temporal, os dois tentam dar um jeito de se reencontrar. Nem que para isso Cooper tenha de contrariar as leis da física, voltando para casa, e para sua filha amorosa, após ter atravessado o horizonte de eventos – a fronteira teórica de um buraco negro, a partir da qual nem a luz (muito menos um corpo celeste de carne e osso) é capaz de retornar. Mas nada que estrague a inteligência do filme.