Na década de 1930, boa parte dos estúdios de cinema dos EUA aceitou censuras impostas por Hitler para não perder as bilheterias alemãs. Entenda até onde pode chegar a intervenção de um regime totalitário na cultura.
Texto: Rafael Battaglia | Design: Carlos Eduardo Hara | Ilustrações: Marcel Lisboa | Edição Alexandre Versignassi
Hitler era viciado em Netflix – ou quase isso. Todas as noites, o führer escolhia um filme para assistir, antes de dormir, em seu cinema particular (já que na década de 1930 não existia nem televisão).
O ritual era sagrado, e mesmo reuniões importantes raramente eram estendidas a ponto de furar o filminho da noite. O ditador via de tudo: gostava dos filmes da dupla O Gordo e o Magro, detestou Tarzan e até ganhou, de Natal, uma coleção de desenhos da Disney. O remetente? Joseph Goebbels, ministro da Propaganda da Alemanha nazista.
O amor de Hitler pela sétima arte era mais que um hobby. Ele sempre soube do poder de convencimento que os filmes exercem sobre a população. Em Minha Luta, autobiografia que escreveu durante o tempo que passou na prisão, Hitler defende que livros não são capazes de inspirar mudanças. A maneira mais eficaz de fazer isso seria por meio da imagem.
Isso se tornou uma arma valiosa para a disseminação das sandices nazistas. Desde o momento em que Hitler se tornou ditador na Alemanha, em 1933, centenas de filmes foram feitos para exaltar o governo e a “raça ariana” – aquela ficção nazista segundo a qual os germânicos pertenciam a uma cepa superior de humanos, os “arianos”.
Mas o público alemão não assistia apenas a filmes nacionais (e nacionalistas). O país continuou recebendo produções hollywoodianas. E boa parte dos estúdios de cinema, com medo de perder o mercado da Alemanha, aceitava mudanças sugeridas pelos nazistas. Mas não é tão simples. Para entender melhor essa “passada de pano” histórica, é preciso voltar alguns anos no passado.