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A guerra em curso evoluísse para um conflito entre Estados Unidos e China?

O presidente George W. Bush protesta, mas a China diz que só desiste do plano se os americanos desocuparem o Afeganistão, o Paquistão e o Iraque.

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Atualizado em 31 out 2016, 18h21 - Publicado em 30 nov 2001, 22h00

José Augusto Lemos

Ninguém esperava tamanha reviravolta. Expulsos do Afeganistão pela Aliança do Norte e pelas forças de elite americanas e inglesas, Bin Laden e o que resta do exército Taleban tomam o poder no Paquistão, com vasto apoio popular, conquistando uma meta estratégica longamente ambicionada pelo terrorismo: sentar sobre um arsenal nuclear. Antes que ele possa operar estragos planetários com as ogivas recém-conquistadas, no entanto, os Estados Unidos bombardeiam pesadamente o Paquistão. Com forças terrestres altamente treinadas, tomam e desativam todo o arsenal atômico do país. Ao cabo, o mundo respira aliviado. Exceto por um detalhe: há suspeitas de que Osama bin Laden continue vivo, preparando sua enorme vingança. Com isso em mente, os americanos incorporam por tempo indeterminado os territórios afegão e paquistanês.

Em seguida, invadem também o Iraque, depõem Saddam Hussein e decidem manter os três países sob ocupação até capturarem bin Laden, enquanto tentam implantar na região as sementes da democracia e da economia de mercado. Irritada com o desequilíbrio de forças provocado na região pela ocupação americana, a China anuncia que instalará uma base de mísseis nucleares em Cuba, a menos de 200 quilômetros dos Estados Unidos. O presidente George W. Bush protesta, mas a China diz que só desiste do plano se os americanos desocuparem o Afeganistão, o Paquistão e o Iraque. A resposta de Washington é que não pode fazê-lo sob pena de ver a região se transformar outra vez num esconderijo de terroristas e armas nucleares extra-oficiais. A China insiste na sua Doutrina Jiang – “A Ásia para os chineses” –, uma clara e irônica referência à Doutrina Monroe – “A América para os americanos” –, levada a cabo pelos Estados Unidos no século XIX. Os ânimos se exaltam. Os americanos instalam mísseis no Japão e na Coréia do Sul.

E oferecem apoio militar aos movimentos de independência de Taiwan – aceito – e do Tibete – recusado. A população terrestre mergulha no medo. A desesperança planetária provoca suicídios em massa em lugares tão díspares quanto o norte da Europa, marcado pela racionalidade, e os místicos rincões da Índia. Em Paris, grupos de adolescentes pulam da Torre Eiffel de mãos dadas, gesto logo imitado em Londres, Nova York – e, obviamente, São Paulo, onde a moçada não pode ver uma nova tendência ser lançada nos países centrais sem aderir instantaneamente. Depois de mais de 100 mortes, o acesso ao Edifício Itália, o prédio mais alto da cidade, tem de ser barrado – fazendo os jovens buscar a própria morte ali mesmo no centro da cidade, atacando coxinhas, croquetes e sanduíches de churrasco grego nos mais decrépitos botequins que encontram pela frente.

Enquanto isso, uma fração menos encanada da moçada – liderada por neogurus instalados na Califórnia e no Rio de Janeiro – resolve que um conflito nuclear entre Estados Unidos e China equivale ao fim do mundo e se lança ao sexo casual e grupal em praça (e praia) pública, como se não houvesse amanhã. Mas o estopim que faltava para detonar de vez a Terceira Guerra Mundial ocorre na cidade americana de Seattle. Mais niilistas que nunca e irritadíssimos com o corte no fornecimento de heroína e haxixe do Afeganistão, os jovens da cidade criam a Brigada Anarquista Kurt Cobain (BAKC). O movimento se espalha rapidamente pelos Estados Unidos e se revela mais maquiavélico que a extinta Al Qaeda, de Osama bin Laden. O fato de todos os aeroportos estarem fechados e não existirem mais vôos comerciais não é problema para eles, que moram, afinal, na cidade que abriga a fábrica da Boeing. A cúpula da milícia teen rouba dois aviões e, em poucos minutos, faz um estrago de arromba.

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A primeira aeronave acerta em cheio o restaurante giratório no topo da Space Needle, a torre futurista com 158 metros de altura que é o grande cartão postal da cidade. Quase simultaneamente, o outro avião explode a sede da Microsoft, a poucos quilômetros dali – pois, para eles, a verdadeira face do anticristo está estampada nas sardas e nos bilhões de Bill Gates. O governo americano atribui os novos atentados a agentes chineses e decide retaliar invadindo Hong Kong. A China se aproxima dos países do mundo árabe, também à beira de um ataque de nervos e de ogivas com a presença americana na Ásia Central. Afinal, ainda que momentaneamente, os americanos transformaram quase 200 milhões de muçulmanos em cidadãos porto-riquenhos. A Arábia Saudita e os demais países produtores de petróleo se alinham com Pequim e cortam o fornecimento de combustível para o Ocidente. A ONU até tenta convocar uma última reunião para evitar o conflito iminente. Mas seus esforços são em vão.

Ninguém sabe quem apertou primeiro o botão que disparou a chuva de bombas nucleares sobre o globo – porque não sobrou ninguém para contar a história. Estavam cobertos de razão os hedonistas da Califórnia e do Rio: não houve mesmo um amanhã.

ja.lemos@abril.com.br

O avião roubado pela milícia teen da fábrica da Boeing, em Seattle, acerta em cheio a Space Needle, a torre futurista que é o cartão postal da cidade, determinando o início da Terceira Guerra Mundial

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