Homo sapiens, uma grande aventura
Do surgimento do Homo sapiens ao advento da agricultura, passaram-se quase 200 mil anos. Foi o tempo que nossos ancestrais precisaram para fundar as primeiras civilizações
Texto Eduardo Szklarz
A aventura começou há 200 mil anos, na África, quando surgiu o Homo sapiens – a primeira espécie anatomicamente parecida com a gente. Durante 75% desse tempo, a maior façanha do homem primitivo foi simplesmente sobreviver. As ferramentas eram rudimentares e havia sempre um crocodilo gigante à espreita.
Por volta de 80000 a.C., a população humana não passava de 2 mil. Ou seja: a espécie toda caberia num teatro de hoje. Nossos ancestrais vagavam pelo continente africano em grupos isolados, se virando para enfrentar uma Era Glacial. Estiveram à beira da extinção. Foi quando caiu uma ficha fundamental: o jeito era “botar o pé na estrada” e procurar uma vida melhor em outros cantos do mundo.
A expansão começou 60 mil anos atrás, quando nossos antepassados começaram a experimentar uma revolução no modo de pensar. Como diz o geneticista e antropólogo americano Spencer Wells, nessa época o homem se transformou numa “máquina de inovação”. Inovar, neste caso, significava duas coisas: primeiro, ter uma ideia; depois, convencer o grupo a executá-la. Foi assim que os humanos passaram a fabricar ferramentas mais precisas, construir instrumentos de caça mais eficientes… Enfim, começaram a desenvolver tecnologias.
NOVOS HORIZONTES
Para muitos antropólogos, essa transformação só foi possível graças ao aprimoramento da linguagem. Também naquela época, nossos ancestrais elaboraram formas mais complexas de comunicação, ampliando sua capacidade de trocar informações e experiências. Hoje em dia, parece algo banal, mas representava um avanço e tanto àquela altura. A vida em sociedade começava a ganhar sofisticação. Era o início de um processo que ajudaria a moldar o comportamento moderno da espécie humana. Mas que, naquele momento, provavelmente levou-a a concluir que a vida poderia ser bem melhor – ou pelo menos diferente – fora da África.
Alguns grupos de Homo sapiens cruzaram o continente africano e chegaram ao Oriente Médio. Outros povoaram a Europa. Houve ainda os que avançaram Ásia adentro e colonizaram a Austrália, usando barcos pela primeira vez.
Aqueles que alcançaram a Sibéria descobriram por lá uma fonte tentadora de comida: mamutes. Passaram a caçar esses enormes animais usando microlitos (pedras lascadas e bem afiadas, fixadas na ponta de uma lança). Do mamute abatido não se tirava apenas a carne. Com o couro e os ossos, esses siberianos primitivos faziam roupas e abrigos graças a uma invenção tão simples quanto genial: a agulha de costura. Foram seus descendentes que provavelmente cruzaram o estreito de Bering, há cerca de 15 mil anos, e dali conquistaram as Américas (veja o mapa das páginas 8 e 9).
RACIOCÍNIO APURADO
Enquanto se espalhavam pelo mundo, nossos ancestrais expandiam não apenas seu horizonte geográfico, mas também o intelectual. Figuras gravadas na pedra deram lugar a pinturas. Ao mesmo tempo, sepultamentos e rituais funerários tornaram-se práticas cada vez mais comuns, indicando que o homem já caminhava em direção ao pensamento metafísico. Com tecnologias de caça aprimoradas e raciocínio cada vez mais apurado, ele foi ocupando o mundo inteiro, do Japão à Patagônia.
Quando terminou a última Era Glacial, há cerca de 12 mil anos, a Terra ficou bem mais hospitaleira e nossos antepassados mudaram de vida novamente. Deixaram a caça e a coleta de frutos para se dedicar à agricultura. Surgiram, assim, os primeiros povoados, em torno dos quais produziam- se alimentos e domesticavam-se animais. Agora, o homem não precisava mais ir de um lugar para o outro a fim de garantir sua sobrevivência. Podia se estabelecer definitivamente aqui ou ali, para sempre. Estava criado o ambiente propício ao surgimento das primeiras civilizações.