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Lost :o que eles têm na cabeça

Um dos criadores da série e o produtor do programa explicam Lost em entrevista. Ou, na verdade, confundem ainda mais.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h26 - Publicado em 31 jul 2006, 22h00

Etienne Jacintho

A idéia de Lost apareceu por acidente (sem trocadilho). O que os executivos da ABC queriam era uma série sobre uns sobreviventes de um desastre qualquer em uma ilha. Uma espécie de O Náufrago revisitado. Mas como fazer isso sem que a monotonia que toma conta do filme de Robert Zemeckis, protagonizado por Tom Hanks, fosse um empecilho para a audiência? Como ninguém tinha essa resposta, os executivos decidiram pedir socorro a um diretor que estava em alta na época. E J.J. Abrams quase não aceitou. Ocupado com a produção de Alias, o novo gênio da televisão ficou de pensar no assunto e solicitou um reforço, pois não conseguiria tempo para encarar o roteiro sozinho. Foi aqui que entrou em cena Damon Lindelof, que, com sua camiseta vintage de Star Wars, conquistou a confiança de J.J. Abrams.

Assim, com a dupla formada, a ABC conseguiu um roteiro. E nada de monotonia nessa série em que a ilha é um personagem. O piloto de Lost é primoroso, um verdadeiro longa cinematográfico. Abrams na imagem e Lindelof nas idéias foram os responsáveis pelo que é considerado um dos melhores – talvez o melhor – primeiro episódio de um seriado de TV. Seus 22 minutos de tensão no local da queda do avião da Oceanic Air, em que os personagens de Lost são revelados, podem ser comparados com os minutos que consagraram o filme O Resgate do Soldado Ryan, de Steven Spielberg. Em escala televisiva, claro!

Dado o start, Abrams praticamente largou a série e voltou a seus vários projetos, deixando o comando do barco (avião?) para Damon Lindelof. Em entrevista à imprensa internacional em Los Angeles, há alguns meses, ele e o produtor-executivo Carlton Cuse falaram sobre a criação dos mistérios que dão fama à série e deixam milhões de pessoas semanalmente pregados na poltrona da sala. (E outras milhões fazendo uma espécie de prolongação do seriado, indo nave-gar na internet assim que Lost acaba, para discutir as muitas teorias da conspiração.)

Na conversa, os dois deixaram claro que já sabem, sim, qual será o desfecho de Lost e que a única questão que talvez fique sem uma explicação completa é a polêmica seqüência numérica 4, 8, 15, 16, 23 e 42. Talvez. Alguém acredita?

Os números

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O criador da série Damon Lindelof e o produtor-executivo Carlton Cuse fazem mistério em relação ao significado dos 6 números que embalam Lost desde o início: 4, 8, 15, 16, 23 e 42. Aliás, quando esses números apareceram no seriado, muitos fãs começaram a apostá-los na loteria. O ator Jorge Garcia, que faz o Hurley, diz que nunca tentou a sorte com essa combinação, pois teria que dividir o prêmio com muita gente.

“O que sabemos é a história dos números e o porquê desses números especificamente. Agora, sobre o significado deles…”, despista Lindelof. O criador conta que a idéia dessa seqüência surgiu mesmo com o bilhete premiado do personagem Hurley. E que depois pensaram que poderia ser interessante botar os números em outros fatos da história, como na escotilha do abrigo que faz parte do Dharma Initiative. Ou atrás no tempo, ao fazerem os números serem ouvidos pela francesa Rousseau e por dois militares americanos 16 anos antes de o avião cair na ilha. Um dos militares, Leonard Simms, acaba no hospício e fala tanto a seqüência que Hurley a joga na loteria e vira milionário. O outro militar que ouviu os números se mata.

“Com tudo isso, fizemos uma boa história. Mas, quando alguém pergunta o que esses números querem realmente dizer, simplesmente não sabemos responder”, fala Lindelof. “É como perguntar o que essa sala significa, o que sapato significa…” Porém, o criador da série diz que os números não são aleatórios. “A verdade é que não escolhemos esses números arbitrariamente. Sentamos e conversamos sobre o motivo de serem eles, o 4, 8, 15, 16, 23 e 42.”

Já Cuse solta uma pista, mas nada reveladora. “Eles são uma alegoria religiosa.” Para o produtor, perguntar o que significam os números é como questionar o significado de algum mistério religioso. “É caso de interpretação.”

As inspirações de Lost

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“Obviamente nós não demos o nome a John Locke à toa”, afirma Damon Lindelof quando questionado sobre as diversas referências filosóficas em Lost . Lindelof diz que há várias maneiras de ver o show: a geral, em que o público presta atenção, por exemplo, no romance, como no episódio em que Kate é forçada a beijar Sawyer; e a dos mais atentos, que olham para a série sob um outro ângulo. Por que John Locke recebeu esse nome? “Tentamos colocar um pouco das nossas filosofias em vez de avançar em uma só linha”, conta Lindelof, que diz que Lost é um bufê. “Você vai até a mesa e diz: ‘Quero um pouco disso, vou pegar um pouco daquilo.’’’ Segundo o criador, isso acontece porque Cuse tem filosofia diferente da dele. E, assim, Lost se transformou nessa “grande cesta de filosofias”. O roteirista crê que essa variedade faz com que Lost seja acessível não somente às pessoas que têm gostos televisivos diferentes, mas também à audiência internacional – Lost está nas TVs dos 5 continentes. “São as pessoas trazendo suas próprias filosofias para o show que o torna legal.”

Carlton Cuse concorda e diz ser recompensador fazer um programa que lida com questões de fé, metafísica e filosofia em um formato de ação e aventura. “A fé e a filosofia estão chamando tanto a atenção dos fãs que o ator Adewale Akinnuoye-Agbaje, o Mr. Eko, tem aproveitado seu papel na série para falar sobre budismo no Havaí – onde Lost é filmado – e nos EUA.”

O Stanford Prison Experiment

Outra pista dada pela equipe do seriado foi o Stanford Prison Experiment, que serviu como base para discutir o comportamento dos personagens na ilha. Damon Lindelof explica que o experimento foi basicamente um teste psicológico em que estudantes foram divididos em dois grupos: prisioneiros e guardas. Eles foram colocados em uma prisão ficcional para ver o que pode acontecer nesse caso em que seres iguais são nomeados opressores e oprimidos. Em algumas horas, os estudantes que ganharam o título de guardas se mostraram agressivos e violentos com os prisioneiros, apesar de eles todos terem se tornado amigos e companheiros poucos dias antes. O experimento, que deveria durar duas semanas, foi suspenso depois de apenas 6 dias.

“Essa idéia de explorar a natureza humana, de colocar pessoas em um papel diferente do que elas atuam e obrigá-las a desenvolverem um personagem para que descubram quem realmente são sempre foi uma inspiração para o que fazemos”, afirma Lindelof, que desafia os repórteres presentes: “Pode acreditar que você descobriria quem realmente é se estivesse nesse acidente de avião. A idéia de que você é jornalista em nada importaria nesse caso.” Para ele, a habilidade de cada pessoa não tem a menor importância em uma situação dessas. “Você está em uma ilha e vai ouvir o Jack ou o Locke – ou simplesmente ficará curioso ou com medo.”

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Ninguém está seguro

Os roteiristas de Lost sacrificaram um personagem importante na primeira temporada e outro na segunda. Os irmãos Shannon e Bonne – Maggie Grace e Ian Sommerhalder, respectivamente – já não fazem mais parte do elenco. E, a cada episódio, o público mantém-se em tensão por não saber quem poderá ser o próximo. Para aumentar a adrenalina, a equipe do seriado não descarta a possibilidade de ter de matar em algum momento os maiores protagonistas e principais oponentes, Jack e Locke.

Segundo Carlton Cuse, essa escolha de manter sempre os personagens na corda bamba diferencia Lost de outras atrações da TV. “Se você assistir a CSI e alguém colocar uma arma na cabeça de William Peterson [o detetive Grissom], você sabe que ele não levará um tiro.” O produtor acredita que muito da intensidade de Lost vem desse risco de morte iminente. “Não queremos que o público pense que qualquer personagem está seguro.”

Damon Lindelof garante que não mata nenhum personagem por problemas de contrato com atores nem nada desse tipo. Ele não revela quem serão os próximos personagens a desaparecer da ilha porque isso causou uma série de especulações no final da primeira temporada e um certo desconforto entre os atores. Mas Lindelof acha que os atores entendem que, quando a equipe decide matar um personagem, isso é para o bem da história.

Suspense até o fim

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Damon Lindelof diz que já sabe qual será o desfecho do seriado. Aliás, o premiado roteirista não é o único. J.J. Abrams, o idealizador do projeto, e o produtor Carlton Cuse também estão a par de todas as respostas aos enigmas que a série propõe. Outros dois produtores de Lost, Bryan Burk e Jack Bender, sabem algumas respostas, mas nem todas. Isso em uma equipe que envolve quase 500 profissionais. Mas Cuse tem a percepção de que é impossível manter tudo em segredo e vem sustentando sempre que, se os fãs do seriado derem uma vasculhada bem atenta na internet, podem encontrar diversas dicas reais que vazaram do roteiro original. “Mas acredito que muita gente não quer saber o que vai acontecer”, comenta Carlton Cuse. “Muitas pessoas vêm até a gente e perguntam: ‘O que vai acontecer? Por favor, me conta’. E logo depois já se arrependem: ‘Não conte, não conte! Eu não quero saber!’”

Tempo de vida de Lost

Este é outro diferencial de Lost. Além de ser a primeira série gravada longe dos megaestúdios nas cercanias de Los Angeles, Lost começou já com um final definido. Para Cuse, isso não determina o tempo de duração do seriado, mas faz parte de um show como esse. “Há atrações como E.R. (série hospitalar) que podem durar para sempre”, explica. “Já programas baseados em uma história pedem um final.” E o produtor tem razão. Todos querem saber o que vai acontecer, se os sobreviventes conseguirão sair da ilha, qual é a natureza desse lugar misterioso. Apesar de saber o desfecho, Cuse diz não poder calcular por quanto tempo Lost poderá se manter. “J.K. Rowling (a autora da série de livros de Harry Potter), por exemplo, sabia que ela escreveria 7 livros e sua mitologia foi desenhada para caber nesse período”, comenta Cuse. “Nós, entretanto, não sabemos se nossa mitologia renderá 4 ou 9 anos.” Para ilustrar o que diz, Cuse usa como base Arquivo X. Para ele, o criador da série, Chris Carter, usou muito bem sua mitologia até a quinta temporada, mas a série insistiu em ficar no ar por 9 anos. “O que temos de batalhar todos os dias é a velocidade com a qual liberaremos nossa mitologia para o público”, diz Cuse. “Nós temos um final, mas não sabemos quando chegaremos lá.”

Mantendo o fôlego

Séries que envolvem mistério têm um tempo de vida menor do que as comédias, por exemplo. Isso porque é difícil segurar a história e manter o fôlego sem fazer revelações constantes e dar uma pista para os telespectadores continuarem com o interesse intacto. Arquivo X manteve isso por um tempo, mas, nas últimas temporadas, ninguém se interessava muito pelos agentes Mulder e Scully. Twin Peaks, a série do cineasta David Lynch, outra “inspiração de Lost”, se manteve por apenas 19 episódios. E Lost? Quantas temporadas mais o público aguentará se algumas respostas não vierem à tona?

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Segundo Damon Lindelof, essa é uma questão que preocupa a equipe – e aqui incluindo o idealizador da série J.J. Abrams, que tem mantido reuniões nesse sentido desde o piloto do seriado. “A melhor resposta é: uma temporada por vez”, analisa Lindelof. O criador diz que, muitas vezes, idealizam algo e, com o passar da série, o plano vai por água abaixo. “Aí temos de improvisar para contar nossa história.” Lindelof diz que ele, Carlton e os escritores se sentaram para conversar quando estavam perto do final da primeira temporada. E foi nessa reunião que perceberam que o final seria com Walt seqüestrado pelos Outros e que os sobreviventes conseguiriam abrir a escotilha, mas o público não veria o que havia dentro do alçapão…

Somente depois disso a equipe começou a discutir o que aconteceria na segunda temporada. Isso sabendo o que já havia sido revelado sobre os Outros, sobre a ilha e, mais importante, sobre os personagens centrais.

Segundo Lindelof, a equipe pensou: “O que fazer agora?” E a conclusão a que chegaram foi falar mais do casamento de Jack, do relacionamento entre Locke e seu pai, do passado de Kate. Ele também diz que já sabe como terminará a terceira temporada, o que os personagens revelarão e que tipos de relacionamentos vão surgir. Mas, obviamente, esses segredos nunca foram sequer cogitados fora de sua cabeça. Segundo ele, nem para a própria equipe. Lost tem contrato para chegar até o quarto ano. “É sempre bom ter algo para trabalhar lá na frente, mas você precisa ter a possibilidade de mudar o tom no meio da música, se ela começar a se tornar entediante”, afirma Lindelof.

A terceira temporada

Damon Lindelof deixou escapar alguns detalhes sobre a terceira temporada de Lost, prevista para começar em outubro nos EUA e só em 2007 no Brasil. O principal, para o criador da série, será a introdução de novos personagens. Surgirão também novas histórias entre os sobreviventes e novos flashbacks, algo para ele “essencial para o desenvolvimento do programa”. Lindelof compara sua equipe de roteiristas a uma equipe de arquitetos, que sempre tem de mudar o plano inicial à medida que a construção avança.

“Temos grandes idéias de como introduzir novos personagens no show. Mas isso não quer dizer que vai sair exatamente como estamos pensando. Essa é a graça”, conta Lindelof. Contanto, eles não querem que Lost se transforme em uma espécie de Gilligan’s Island – seriado que foi ao ar nos anos 60 –, em que era fácil entrar na ilha e quase impossível sair! “Quando introduzimos novos personagens, são pessoas que já estavam na ilha antes do acidente com o avião da Oceanic Air”, comenta. “O mais interessante é que sabemos muito sobre a ilha, mas ainda não revelamos todos os segredos para o público. O público ainda não sabe nada dela”, solta, em tom enigmático.

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