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Manual do senhor de escravos

Historiador revela as técnicas de gerência da senzala

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h21 - Publicado em 31 dez 2004, 22h00

Tamis Parron

Se já é difícil comandar esse sistema chamado escritório, em que o trabalho é recompensado com dinheiro, imagine administrar uma roça onde a única certeza do “funcionário” é levar umas chicotadas nas costas. Pois era exatamente essa a missão de um fazendeiro nos tempos do Brasil escravagista – desafio para deixar qualquer diretor de recursos humanos de hoje com os cabelos em pé.

Para resolver o problema, uma série de senhores de engenho e missionários se dedicavam a escrever manuais sobre como lidar com escravos. Algumas dessas “dicas” estão no recém-lançado livro Feitores do Corpo, Missionários da Mente (Companhia das Letras), do historiador Rafael de Bivar Marquese. É uma bela chance de entender a lógica hedionda de um sistema que se baseava em trabalhadores tratados como animais, mas que precisavam ser administrados e estimulados como eram – seres humanos. As questões “banais” do dia-a-dia de um escravocrata incluíam desenvolver as melhores técnicas para evitar fugas, açoitar mulheres sem despertar a ira dos homens ou descobrir que raios fazer com crianças que ainda não tinham idade para trabalhar.

Feitores revela os dilemas que cada grupo enfrentava na hora de aplicar suas idéias. Religiosos insistiam na educação cristã dos cativos. A metrópole colonizadora se preocupava com o abastecimento de novas “peças”. Senhores se esmeravam em explorar ao máximo seus subordinados. Desnecessário dizer: a única coisa que não entrava em pauta era acabar de uma vez por todas com a escravidão.

 

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REPRODUÇÃO

Problema: Manter a oferta de escravos quando abolicionistas pressionavam pelo fim do tráfico

Solução: Em 1803, o inglês Dr. Collins bolou um “bônus” para negras que engravidassem: pelo primeiro filho, a mãe seria dispensada dos trabalhos no campo. O segundo valia uma folga quinzenal. O terceiro, folga semanal. Pelo quarto, dois dias de descanso. Pelo quinto, três e pelo sexto filho, finalmente, ela se tornaria uma pessoa livre. A prole, é claro, ficava na senzala

CONTROLE DE FUGAS

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Problema: Evitar fugas de escravos

Solução: Castigar fujões era um bom remédio, mas não o único nem o que trazia melhores resultados. Mais eficiente era permitir que os cativos criassem porcos ou galinhas e cultivassem roças ao lado da senzala. O senso de propriedade despertava a fidelidade: quem se arriscaria a trocar o certo pelo duvidoso e perder os bens fugindo para o matagal bravio?

ALIMENTAÇÃO

Problema: Controlar os custos com a alimentação

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Solução: Ser mesquinho não era bom negócio – cativos famintos roubavam para comer. Melhor para os senhores era reservar semanalmente 1 quilo de farinha e 900 gramas de carne salgada por escravo. A distribuição não deveria ser feita aos domingos, o dia de visitas, quando escravos ofereciam aos convidados o que tinham para comer. O ideal era distribuir a ração nas segundas-feiras

CASTIGO

Problema: Punir mulheres sem revoltar os homens

Solução: Nunca açoitá-las em público. O melhor era bater nelas dentro de casa, longe da ira masculina. Os “machos”, porém, sofriam castigo exemplar: convocava-se a escravaria, o infrator era colocado numa carroça e chicoteado à exaustão. Em seguida, os senhores passavam pimenta, sal e limão nas feridas para aumentar a dor e evitar pústulas ou inflamações

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DESCAN DE DOMINGO

Problema: Manter os escravos ocupados nos domingos, os dias reservados ao Senhor

Solução: Um escravista verdadeiramente devoto a Deus não podia obrigar seu plantel à labuta nos domingos. Mas isso não significava lazer à vontade. Da alvorada até as 10h, os negros deviam lavar roupas e limpar a senzala. Depois, freqüentar a missa, para se tornarem cristãos e caridosos. Só após o jantar estavam liberados para festas e brincadeiras – com a cachaça correndo por conta da casa-grande

CRIANÇAS E ESCRAVAS

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Problema: O que fazer com as crianças?

Solução: Até os 5 anos, as crianças deviam ser nutridas com arroz, caldo de carne e mingau. Dos 5 aos 10 anos, os infantes recebiam leves tarefas de trabalho. O objetivo: fortalecer os músculos e moralizar o espírito. “Somente” aos 10 anos é que eram expostos a serviços mais pesados, que davam retorno ao bolso dos senhores

 

Para saber mais
Feitores do Corpo, Missionários da Mente – Rafael de Bivar Marquese, Companhia da Letras, 2004

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