O romance do nosso século
O que antes demandava do escritor várias linhas para descrever cenas que o leitor nunca teria visto antes em sua vida, passou a exigir apenas menção.
Luís Augusto Fischer
Depois do advento do cinema, nossa relação com as palavras mudou. O que antes demandava do escritor várias linhas para descrever cenas que o leitor nunca teria visto antes em sua vida, passou a exigir apenas menção.
Já foi mais complicado saber, portanto. E ainda mais quando se tratava de um escritor empenhado em descrever, mais do que paisagens, idéias, inflexões mentais e afetivas dos personagens, para compor um relato com foco no debate das idéias de uma época conturbada como poucas.
A Montanha Mágica (1924), de Thomas Mann (1875-1955), escritor alemão que nesse romance se ocupa de desenhar, com muita lentidão e paciência, a atmosfera dos debates intelectuais que atravessava a alma da Europa às vésperas da Primeira Guerra Mundial. No centro da cena, um jovem burguês, Hans Castorp, que passa longos meses num sanatório nas montanhas suíças e será obrigado a revirar suas entranhas para entender o que se passa naquele mundo em turbulência.
Ao seu redor, uma paixão não realizada, Clawdia Chauchat, e, principalmente, pensadores como Settembrini, admirador da liberdade, e Naphta, judeu convertido ao jesuitismo, pensador de feição comunista. Todo o século XX – guerra, totalitarismo, esperança de liberdade – está resumido nas discussões entre eles. O retrato de um século que ainda não acabou.