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Os incríveis poderes de Odin

O maior dos deuses vikings ajudou a criar o mundo, era capaz de mudar de aparência e tinha uma lança que nunca errava o alvo.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h23 - Publicado em 30 set 2006, 22h00

Luiz Guedes Jr.

Odin está para a mitologia nórdica assim como Zeus para o panteão grego – e, por que não, como Deus para o cristianismo moderno. Cultuado como entidade suprema por antigas tribos do norte da Germânia (atual Alemanha) e toda a população escandinava medieval (sobretudo onde hoje estão Noruega, Suécia e Dinamarca, incluindo também os povos que se estabeleceram na Islândia), possuía o dom da onisciência, tendo o conhecimento de tudo o que acontecia tanto no mundo dos vivos quanto dos mortos, além de dominar a arte das magias.

Segundo a crença pré-cristã dos escandinavos, no início havia somente o mundo do gelo (Niflheim) e o mundo do fogo (Musphelhein). Entre eles, uma abertura completamente vazia, chamada Ginungagap, onde nada havia e nada vivia. E foi justamente ali, no vácuo, que, num belo dia, se encontraram o fogo e o gelo. O fogo lambeu o gelo até este tomar a forma de um gigante, batizado de Ymir, e de uma enorme vaca, Audumbla, cujo leite alimentava Ymir. A vaca também lambeu o gelo e criou o primeiro deus, Buri, que foi pai de Bor, que por sua vez gerou Odin e seus dois irmãos, Vili e Vé.

Ymir era hermafrodita e procriou sozinho a raça dos gigantes. Mas foi morto por Odin e seus irmãos. Da carne do gigante, o trio formou a terra. De seu sangue, o mar. Dos ossos, as montanhas. Dos cabelos, as árvores, e de seu crânio, a abóbada celeste. Fizeram, ainda, de dois troncos de árvores, o primeiro par de humanos: Ak e Embla.

Fonte da sabedoria

Além de criar o mundo, Odin era venerado como deus da sabedoria. O que nem sempre foi assim. Reza a lenda que ele, ávido por conhecer todas as coisas da vida, feriu-se com a própria lança e suspendeu-se de cabeça para baixo na árvore Igdrasil, um freixo gigante que se eleva por cima dos nove mundos da mitologia nórdica, estendendo suas raízes por todos eles. Foi assim, oferecendo a si mesmo como sacrifício, que Odin recebeu a sabedoria das runas, símbolos mágicos do antigo alfabeto germânico, com os quais os homens podem prever o futuro (leia mais na próxima página). Depois, quis beber da “fonte da sabedoria”, mas houve um novo preço a pagar: seu tio Mimir, guardião da fonte, exigiu que Odin atirasse um de seus olhos no poço para ter direito a um gole. Feito isso, ele obteve tanto conhecimento que trouxe Mimir de volta à vida, após este ser morto na guerra entre os Aesir e os Vanir, duas famílias rivais dentro do panteão nórdico. Mas somente a cabeça de Mimir foi revivida. Embalsamada, ela continuou na fonte do conhecimento, sendo capaz de responder a qualquer pergunta que lhe fizessem.

Odin mantinha-se informado dos acontecimentos graças aos dois corvos que levava nos ombros, Hugin (pensamento) e Munin (memória), que viajavam por toda a parte e lhe sussurravam o que se passava no mundo. Tornou-se deus da poesia, após ter roubado o hidromel, bebida favorita dos deuses, feito de mel e do sangue do sábio Kvasir. Seu cavalo de pêlo cinza, Sleipnir, tem oito patas e anda pela terra, pelo ar e pelos infernos.

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Dependendo do dialeto, Odin pode aparecer com diferentes nomes, sendo o principal deles Wotan. Sua esposa, a deusa Friga, algumas vezes é confundida com Freia, deusa guerreira, a primeira das Valquírias – que significa, nas primitivas línguas germânicas, as que escolhem os mortos. Na mitologia, eram virgens armadas e formosas. Seu número habitual era três. Escolhiam os mortos em combate e levavam suas almas ao épico paraíso de Odin, chamado Valhala, cujo teto era de ouro e iluminado não por lâmpadas, mas espadas. Sob a crescente influência do cristianismo, o nome Valquíria degenerou. Um juiz na Inglaterra medieval mandou queimar uma pobre mulher acusada de ser uma Valquíria; ou seja, uma bruxa.

Embora possuísse a lança Gungnir, que jamais errava o alvo e em cujo cabo havia runas que ditavam a preservação da lei, a figura de Odin não era exatamente a de um guerreiro, mas inspirava combatentes a se lançarem freneticamente na batalha, sem nenhum sentimento ou temor. Nos últimos séculos pagãos, os vikings, povos nórdicos dados a luta e guerras, foram os derradeiros a combater invocando o nome de Odin. Os abatidos nesses confrontos, chamados de einherjars (mortos gloriosos), eram reunidos no salão da Valhala, a grande fortaleza do deus. Os rituais de enforcamento também faziam parte da veneração a Odin, sendo que o suicídio por essa prática era considerado um atalho para Valhala. Loucura? Não se fizermos um paralelo com a atual Jihad islâmica e seus homens-bomba…

Múltiplas formas

Odin tinha o dom de tomar múltiplas formas, assumindo aquela que desejasse. Quando circulava entre os homens, adquiria as feições de um senhor barbudo, caolho, com um chapéu de abas largas e envolvido numa vasta capa. Apoiado numa bengala, retribuía gentileza com riquezas, cortesia com sabedoria, e o mau-trato com vingança. Aliás, as baladas édicas (escrituras datadas do século 13, que imortalizaram as lendas sobre os personagens e as criaturas da mitologia nórdica, antes passadas entre gerações por tradição oral) comumente apresentam Odin com inúmeras falhas de caráter. Ainda hoje é corrente nos países escandinavos e no norte da Alemanha pessoas usarem expressões como “hei Odin zu Gast sein”, algo equivalente, em bom português, a “o diabo que o carregue”. Mas isso acontece, principalmente, devido ao empenho dos cristãos em depreciar a figura do deus pagão.

Odin era tido em alta consideração por membros da nobreza nórdica, embora as pessoas mais simples o temessem. Talvez a complexidade do deus supremo obscurecesse sua personalidade para o camponês sem cultura, que preferia venerar Thor, entidade mais simples e próxima da realidade agrária.

Assim como muitas outras religiões politeístas, a mitologia nórdica não apresentava o característico conflito maniqueísta tão tradicional na cultura do Oriente Médio. Assim, Loki, o deus da mentira, e seus filhos “monstruosos” não são necessariamente adversários dos deuses benevolentes. Segundo a lenda, no entanto, será Fenrir, o lobo gigantesco primogênito de Loki, quem engolirá Odin na visão antiga dos nórdicos sobre o futuro.

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Os povos da antiguidade da Escandinávia acreditavam num final dos tempos caótico, bem ao estilo do Juízo Final pregado pela Bíblia. Dele, haverá apenas alguns poucos sobreviventes, humanos e divinos, que povoarão o mundo para começar um novo ciclo. Contudo, estudiosos ainda se dividem na interpretação dessas últimas estrofes escritas nas baladas édicas. Para muitos, essa visão catastrófica não passa de uma adição atrasada ao mito e influenciada pela nova era cristã.

Símbolos mágicos

Para os escandinavos, o alfabeto das runas esconde segredos

Os versos épicos do poema nórdico “Edda” contam que o alfabeto das runas (ver acima), utilizado pelos antigos escandinavos, foi concedido a Odin com o dom da profecia. Buscando iluminação e conhecimento, ele feriu-se com a própria lança e dependurou-se na árvore Igdrasil, cujas raízes brotam nas profundezas dos nove mundos da mitologia. Ficou lá durante nove noites, sem que ninguém lhe desse de comer ou beber. Até que, dos altos galhos perdidos nos céus, caíram os símbolos rúnicos. A palavra runa significa “secreto” – ler as runas equivaleria a desvendar um segredo. Sua manipulação era restrita aos mestres do Rumenal, os sacerdotes vikings. Os símbolos eram gravados em amuletos, taças, espadas, soleiras e navios, evocando a proteção divina. Os antigos acreditavam que seus poderes mágicos trariam fartura na colheita e a cura de doenças. Até hoje historiadores discutem a origem das runas, mais antigas que o Novo Testamento. Mas numa coisa eles concordam: as runas influenciaram muito a civilização viking. No Reino Unido, foi usado por cinco séculos alfabeto rúnico de 33 letras. A inscrição mais antiga remanescente dessa época data de 700 d.C. e foi feita num pequeno cofre construído com ossos de baleia.

Para saber mais

LIVRO

The Children of Odin: The Book of Northern Myths, Padraic Colum, Aladdin, 2004

A extraordinária história de Odin e de outros deuses nórdicos. Em inglês.

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