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O Coringa de Wall Street

Bernard Madoff conquistou a confiança e US$ 65 bilhões de investidores. Mas tudo não passava de um golpe - o maior de todos os tempos

Por Álvaro Oppermann
Atualizado em 11 dez 2019, 14h40 - Publicado em 25 fev 2011, 22h00

No dia 11 de dezembro de 2008, o agente do FBI Theodore Ca­cioppi foi à cobertura de US$ 7 milhões do financista Bernard Madoff, 71, na avenida Lexington com rua 64, na área mais exclusiva de Manhattan.

“Senhor Madoff, viemos ouvir do senhor uma explicação inocente para o problema”. O “problema” era o esquema fraudulento enredado pelo presidente e fundador da corretora Bernard L. Madoff Investment Securities. Ela causou perdas estimadas de US$ 13,2 bilhões a 1.341 clientes, que investiram nela quase US$ 65 bilhões.

“Não existe explicação inocente”, respondeu Madoff. Descoberto, virou símbo­lo da atual crise global. Em junho, foi condenado a 150 anos de prisão.

“Ele é o homem mais odiado hoje em Nova York”, escreveu John Gapper, articulista do jornal britânico Financial Times. O cineasta Woody Allen, na revista New Yorker, publicou um conto em que personagens vão à desforra de Ma­doff. Seu caso, porém, é mais complexo. Segundo psicólogos forenses e especialistas da polícia americana, Madoff se enquadra no perfil de um psicopata.

Tio Bernie, como o chamavam, pegou o mundo financeiro de surpresa. Não se esperava que o maior golpe financeiro individual da história do capitalismo viesse do forasteiro cuja corretora, a partir da década de 1960, ajudou a transformar Wall Street de um clube exclusivo de investidores estabelecidos num ambiente aberto para qualquer out­sider endinheirado. Virou protetor dos interesses de pequenos investidores. “Eu ainda não acredito no que ele fez”, disse o advogado Joseph Kavanau, um amigo de longa data.

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Para muitos, Madoff era um sujeito afável, e, segundo seus funcionários, tratava todos como uma família. Ele se movia agilmente entre os grandes players de Wall Street e da City londrina e os políticos em Washington.

Para Madoff não interessavam as sofisticações de teoria econômica, e sim o tintilar das moedas. Isso, no entanto, não fazia dele um muquirana à moda do Tio Patinhas. Madoff adorava o luxo, e não deixava de esbanjá-lo.

Era dono de um iate na Riviera francesa, de cotas em dois jatinhos, de uma mansão em Palm Beach, na Flórida, e do apartamentão em Manhattan. Fumava charutos Davidoff, mandava fazer seus ternos sob medida na Saville Row, em Londres, e gastava ostensivamente com festanças nas quais era bajulado por seus clientes.

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Não faltavam motivos para tal bajulação: sua corretora lhes dava lucros consistentes de 8 a 12% anuais. “Nos jantares e nas partidas de golfe, o assunto era Madoff e como ele estava gerando dinheiro para todo mundo”, disse um ex-funcionário (que preferiu ficar anônimo) ao New York Times.

Hoje se sabe que esses lucros eram fantasia, frutos de um esquema de pirâmide – plano fraudulento no qual os primeiros investidores são remunerados com a infusão de dinheiro de recém-chegados ao esque­ma. Como o lucro era alto, atraía levas e levas de novos investidores, o que mantinha funcionando esse sistema.

Entre os clientes que confiaram em Madoff e perderam muito dinheiro no golpe estavam gigantes como o banco espanhol Santander (que tinha US$ 3,1 bilhões investidos), a Wunderkinder Foundation, caridade capitaneada pelo cineasta Steven Spielberg, e a Fundação para a Humanidade do Prêmio Nobel da Paz Elie Wiesel. “Gostaria que Madoff fosse para a solitária, e que por pelo menos 5 anos lá houvesse uma tela com imagens de suas vítimas dizendo ‘olhe o que você fez para essa pobre senhora, olhe o que você fez para essa criança’, dia e noite”, disse Wiesel, que é sobrevivente do Holocausto.

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Tio Bernie, o mau

Um dos bê-á-bás das finanças é que o esquema da pirâmide não funciona. Por que então teria Madoff acreditado que, com ele, daria certo?

Aqui se inicia o lado sombrio de Tio Bernie. “Num esquema de pirâmide, só uma pessoa está na ponta da coisa, e isso é fascinante para um narcisista como Madoff”, observou o psicólogo forense Steven Norton.

Já o especialista em perfis de criminosos do FBI Gregg O. McCrary notou outras características no escroque: mentira, manipulação, enorme capacidade de enganar e sentimento inflado de autoimportância. Acima de tudo, uma enorme capacidade de sedução (veja quadro nesta página). Coisas típicas em psicopatas. Pessoas como ele são camaleões. “Eles são mestres em impressionar os outros”, diz McCrary.

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O lado bizarro de Madoff se mani­fes­tava em detalhes. Compulsivo por ordem e limpeza, os monitores de computador no escritório deviam estar sem­pre diametralmente alinhados. As cortinas tinham de ficar abertas todas na mesma altura. “Ninguém podia deixar um bloco de papel fora do lugar nas mesas de trabalho, ou iria ouvir bronca do chefe”, contou Julia Fenwick, ex-funcionária de Madoff.

Certa vez, um funcionário comia uma pe­ra no escritório e deixou cair gotas no carpete. “O que você está fazendo!”, gritou Madoff. Depois, arrancou a tira de carpete sujo, jogou-a no lixo e foi buscar um carpete substituto. Papelão improvável para um presidente de corretora no centro nervoso financeiro do mundo. Eram sinais de alerta de algo de errado. Infelizmente, ninguém deu aten­ção a esses sinais.

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